São Paulo, Quarta-feira, 21 de Abril de 1999
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SISTEMA FINANCEIRO
CPI investiga se houve favorecimento pré-mudança cambial
Bilhete atribuído a Lopes ordena operação bancária

MARTA SALOMON
da Sucursal de Brasília


Um bilhete cuja autoria foi atribuída pelo Ministério Público ao ex-presidente do Banco Central Francisco Lopes contendo orientações sobre operações financeiras da empresa de consultoria Macrométrica, encontrado no apartamento de Lopes, é apontada como uma das peças mais importante das investigações por um detalhe: a data.
O bilhete foi escrito em 21 de dezembro do ano passado, quando Lopes já elaborava a nova política cambial sob encomenda do presidente Fernando Henrique Cardoso. A tarefa foi dada por FHC ao então diretor de Política Econômica do BC em outubro. O calendário secreto do governo previa a desvalorização do real em fevereiro.
O documento será submetido a exame grafotécnico pelos procuradores, para que seja comprovado se ele foi redigido por Lopes.
O ex-presidente do BC, que não depôs anteontem na CPI dos Bancos sob a alegação de que precisava permanecer no Rio, passou os últimos dois dias em Brasília.
Lopes chegou à cidade no início da tarde de anteontem e se hospedou no hotel Kubitschek Plaza. Não quis falar com a reportagem.
Nas instruções para operações da Macrométrica, aparece o nome de Ciça, apelido de Araci Pugliese, mulher de Lopes. Ela também é sócia da empresa, que presta consultoria e informações nas áreas econômica e de mercados financeiros.
O apelido aparece no bilhete junto com o de outros três personagens, Bruno, Fábio e sr. Ivo. O primeiro seria Bruno Pugliese, filho de Ciça. Os outros dois ainda não haviam sido identificados pelo Ministério Público nem pela CPI dos Bancos. O texto é assinado por Fábio, Ciça e Bruno, embora a letra seria de Lopes segundo o Ministério Público.
No bilhete, fica acertado que Fábio encerrará conta no Banco Itaú e em qualquer outro banco, não podendo abrir nova conta corrente durante 36 meses. E que Fábio iria transferir sua participação na Macrométrica Sistemas para Ciça.
A existência do documento e seu conteúdo foram relatados anteontem à noite aos senadores da CPI pelo procurador da República do Rio Arthur Gueiros.
O bilhete é apontado como uma eventual prova de que Lopes continuava operando a empresa de consultoria no momento em que era detentor de um dos mais importantes segredos do governo.
Esse fato seria tão ou mais difícil de Lopes explicar quanto a existência de um depósito de US$ 1,675 milhão no exterior, indicada em outro bilhete encontrado no apartamento do ex-presidente do BC.
A suspeita investigada é de que as informações com que Lopes lidava teriam sido usadas para benefício próprio, em operações do mercado futuro de câmbio, já que havia orientações detalhadas sobre como movimentar o dinheiro da empresa.
Serão cobradas explicações de Lopes no depoimento à CPI, adiado para a próxima segunda-feira.
A Macrométrica é administrada pelos irmãos Sérgio e Luiz Augusto Bragança, apontados pela revista ""Época" como personagens do vazamento de informações privilegiadas aos bancos Marka e FonteCindam, socorridos com dinheiro público durante a curta passagem de Lopes pela presidência do BC.
O diretor de sistemas da Macrométrica, Fábio Lyrio, disse ontem que a empresa de consultoria não se manifestará sobre as investigações a respeito do caso Marka.
"A Macrométrica não tem nada a ver com essa questão", afirmou Lyrio. No final da tarde, a empresa divulgou nota reafirmando "o compromisso de seriedade e respeito aos seus clientes com que tem se pautado durante os seus 14 anos de existência no mercado".
Sérgio Bragança não foi localizado. Lopes fundou a empresa com Bragança, mas desligou-se quando assumiu a diretoria de Política Econômica do BC, em 95.
Sua mulher, Ciça, com quem não é casado oficialmente, seguiu sócia na empresa.


Colaboraram da Sucursal de Brasília e a Sucursal do Rio


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