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ELIO GASPARI
O doutor Quintão
acha que FFH é um
ator de teatro
Já que o governo está preocupado com a sua própria coesão, bem que FFH e o ministro
José Serra, da Saúde, poderiam tentar descobrir o que
lhes aconteceu no dia 31 de
maio.
Pelos registros da propaganda, nesse dia FFH e Serra prestaram uma homenagem ao
juiz federal Guilherme Pinho
Machado. Foi ele quem deu a
sentença que proibiu o fumo a
bordo de aviões comerciais.
Festejaram-no com uma cerimônia no Palácio do Planalto,
simbolizando o compromisso
do governo com a saúde pública e com o desestímulo ao vício
do tabaco. Nada mais chique,
correto e moderno.
Talvez o presidente e o ministro não saibam, mas participaram de um teatro de quinta categoria. Nesse mesmo dia,
a União protocolou na 4ª Vara
Federal um recurso contra a
sentença do juiz Pinto Machado. Isso mesmo: enquanto o
presidente e o ministro homenageavam o juiz no mundo da
virtualidade, o advogado geral
da União, Geraldo Quintão,
apelava contra a sentença.
Coube à Viúva o ridículo papel
de pagar, num mesmo dia, pela coisa (a homenagem) e seu
contrário (o recurso). Nos dois
casos, coube à choldra o papel
de boba.
Não se pode argumentar que
isso tenha sido um acidente. A
União já recorreu duas vezes
(sem sucesso) contra a sentença do juiz Pinho Machado. Está na terceira tentativa. Em
benefício de quem? De FFH e
do ministro da Saúde, parece
que não. Dos fumantes? Talvez. Dos fabricantes de cigarros? Com certeza, mesmo sabendo-se que até hoje nenhum
deles atacou a proibição.
O juiz Pinho Machado não
tirou a sentença de sua cabeça
de não-fumante. Ele determinou que não se pode pitar nos
aviões porque assim manda
uma lei aprovada pelo Congresso. Ela não era cumprida
porque o Departamento de
Aviação Civil baixara uma
portaria regulamentando (e
abrandando) indevidamente
a proibição.
O recurso do doutor Quintão
era desnecessário. A lei não o
obrigava a fazê-lo. Fê-lo porque qui-lo, como diria Jânio
Quadros. Por que qui-lo, FFH
pode tentar descobrir.
Agora está o governo na ridícula situação de contestar na
Justiça um ato que festejou no
Planalto. O Ministério Público
Federal, com toda razão, argumenta que FFH "exerce privativamente" a direção da administração federal. Ou seja,
manda (em tese) tanto na Advocacia-Geral quanto no Ministério da Aeronáutica, ao
qual está vinculado o DAC. Na
prática, não manda no doutor
Quintão (que recorre contra
aquilo que ele festeja) nem no
DAC (cuja portaria até hoje
não foi revogada). Pior: o doutor Quintão soube da cerimônia do Planalto e não mandou
recolher o recurso. Só há uma
explicação possível: achou que
FFH e Serra estavam de brincadeira.
Passaram-se 50 dias e continua achando. A descoordenação administrativa já levou
inúmeros presidentes a passar
por constrangimentos, mas
coisa igual a essa nunca se viu.
Na cerimônia do Planalto,
na qual o juiz Pinho Machado
teve direito a fotografia ao lado de FFH e do auriverde pendão da esperança, o governo
supunha que comemorava o
Dia Mundial sem Tabaco. Estava comemorando o Dia Nacional do Gogó.
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