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DIPLOMACIA
No Uruguai, presidente aponta pressão para que dívida não possa ser paga
Mercados pressionam por calote do país, afirma FHC
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MONTEVIDÉU
O presidente Fernando Henrique Cardoso fez ontem a sua mais
forte crítica ao funcionamento
dos mercados financeiros e a mais
explícita menção às dificuldades
da economia brasileira, ao afirmar que "alguns setores financeiros insistem em que não paguemos, asfixiando-nos para que não
possamos pagar", em óbvia alusão à dívida externa.
"Quem ganha com isso?", perguntou em seguida, para ele próprio responder: "Eu não sei".
O presidente incluiu esse trecho, de improviso, no discurso
que pronunciava ante a Assembléia Geral do Uruguai (sessão
conjunta de Câmara e Senado),
na tarde de ontem.
Antes, FHC dissera que "o mercado talvez jamais se tenha comportado de forma tão contrária a
seus próprios interesses, ignorando os fundamentos econômicos,
gerando falsas expectativas".
Para o presidente, trata-se de
"surtos de insensatez", que, na
sua avaliação, "costumam ter fôlego curto".
O discurso é a explicitação da
análise que o Palácio do Planalto
faz a respeito da turbulência financeira que assola o país: um fenômeno provocado por agentes
externos, que pouco ou nada têm
a ver com as debilidades da economia brasileira.
Em outro trecho inserido de improviso na sua fala, Fernando
Henrique disse que "o ambiente
externo é de confusão, que tem
efeitos muitas vezes trágicos sobre a população, que não tem nada a ver com isso".
O presidente se referiu também
ao encontro de segunda-feira
com os quatro principais candidatos a seu lugar, para dizer que
"há momentos em que, acima dos
interesses partidários, têm que estar os interesses comuns".
Para FHC, "quanto mais afinadas estiverem as forças políticas
em relação ao atacado, mais produtiva será a negociação no varejo".
O presidente inseriu os encontros da segunda-feira no contexto
da crise externa. Disse que "não se
trata de um apelo à união nacional contra ameaças de fora ou por
conveniências políticas de uns ou
de outros". Mas se trata de que
aos líderes "não cabe simplesmente lamentar, mas trabalhar, e
construir caminhos que possam
servir de pontes entre o presente e
o futuro".
FHC disse que lhe deu "grande
prazer" conversar com as lideranças partidárias, "algumas das
quais me criticam há oito anos,
dez anos, 20 anos".
Antes, ao desembarcar na Base
Aérea de Montevidéu, às 14h25, o
presidente qualificara de "muito
agradável" o seu encontro particular com Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT.
Explicou que Lula pedira a reunião apenas entre os dois para falar sobre a dívida do Estado de
Minas Gerais.
O presidente fez questão de dizer que o encontro nada tinha a
ver com a hipótese, aventada pela
mídia, de que ele apoiaria Lula no
caso de o segundo turno ser disputado entre o petista e Ciro Gomes.
"Minha predisposição é, primeiro, a de que Serra (José Serra,
o candidato do PSDB) vá para o
segundo turno. Se, por acaso isso
não acontecer, eu sou presidente
do Brasil e vou atuar como magistrado, com equilíbrio".
O presidente não descartou a hipótese de um novo encontro com
os candidatos, mas disse que "eles
têm que se encontrar é com o povo".
Diplomacia
O discurso de FHC ante a Assembléia Geral uruguaia serviu
também para reafirmar pontos
básicos da diplomacia praticada
durante os seus oito anos de governo e para manifestar suas expectativas em relação ao legado
que deixará ao sucessor.
Foi, acima de tudo, uma manifestação de fé no Mercosul, apesar
de o bloco (e cada um de seus
quatro integrantes isoladamente)
estar mergulhado na maior crise
de sua história.
"O Mercosul tem um lastro histórico e político que é imune à cizânia. Se iniciamos juntos o projeto de integração, estou certo de
que continuaremos juntos a usufruir de seus benefícios", afirmou.
Também anunciou o empenho
do governo brasileiro em conseguir, ainda no seu período presidencial, um acordo entre o Mercosul e os países da Comunidade
Andina (Venezuela, Colômbia,
Peru e Equador).
Seria um passo para "a criação
de um espaço econômico sul-americano", velho projeto da diplomacia brasileira, iniciado
quando Itamar Franco era o presidente e, FHC, o seu chanceler.
Trata-se, na essência, de unir os
países sul-americanos para melhor negociar com o poderoso
Norte.
Sobre a negociação com os Estados Unidos, para constituir a Alca
(Área de Livre Comércio das
Américas), reafirmou o que já dissera na Cúpula das Américas, em
Québec, no ano passado:
"A Alca somente será atraente
se assegurar benefícios equilibrados a todo o hemisfério, o que implica maior acesso aos mercados
mais afluentes. Sem isso, a Alca
torna-se irrelevante ou perde sua
razão de ser".
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