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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ CPI DO BANESTADO
José Mentor (PT-SP) não indiciou Maluf, Toninho da Barcelona e diretores do Rural, nem investigou operações no MTB Bank
Relator blindou PT e governo em 7 casos
RUBENS VALENTE<
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Sob risco de cassação por ter recebido R$ 120 mil em cheques de
empresa de Marcos Valério, o deputado federal José Mentor (PT-SP) atuou para blindar, na relatoria da CPI do Banestado, pelo menos sete linhas de investigação
que atingiriam interesses do PT e
do governo federal.
No cargo-chave da comissão,
Mentor não convocou para depor
nem incluiu na lista dos indiciados donos e diretores do Banco
Rural, o ex-prefeito paulistano
Paulo Maluf (PP), o ex-dono da
Transbrasil Antônio Cipriani, o
presidente do Banco Central,
Henrique Meirelles, o doleiro Toninho da Barcelona e o empresário de ônibus Ronan Maria Pinto,
além de deixar de investigar operações no MTB Bank que comprometeriam Duda Mendonça,
marqueteiro da campanha de
Luiz Inácio Lula da Silva em 2002.
Mentor costumava emitir elogios e antecipar conclusões sobre
investigados. À época já criticados pela oposição, hoje os discursos do deputado, à luz das revelações da CPI dos Correios, ganham
novos significados.
"(...) Quero registrar a cooperação que o Banco Rural tem apresentado desde o início da CPI",
elogiou o deputado, em meados
de 2004, em sessão aberta da CPI.
O banco estava sob investigação
por operar com doleiros brasileiros por meio de empresas offshore no Banestado de Nova York,
cerca de US$ 4,3 bilhões.
Sabe-se agora que em maio de
2003 o Banco Rural havia concedido um empréstimo de R$ 3 milhões à direção nacional do PT
com aval do publicitário mineiro
Marcos Valério de Souza. Além
disso, foram das contas do Rural
que cerca de R$ 30 milhões, segundo a versão de Valério, chegaram ao PT e partidos aliados.
Os dirigentes do Rural nunca
foram intimados por Mentor a
depor na comissão e seus nomes
não foram incluídos na lista de indiciados do relatório final.
Na sessão de 29 de junho de
2004, Mentor fez uma defesa explícita de Paulo Maluf, à época
sob intensa investigação da PF
por supostas evasão e lavagem de
US$ 200 milhões no exterior.
"Com relação ao sr. Paulo Maluf, a relatoria, até este momento,
desconhece qualquer documento
que baseie uma acusação. (...) Não
há fundamento na CPI para essa
convocação, não há documento
que sustente uma acusação."
O publicitário mineiro Marcos
Valério, em depoimento e papéis
entregues à Procuradoria Geral
da República, explicitou ligações
financeiras entre o PT e o PP de
São Paulo, partido de Maluf.
O ex-prefeito decidira apoiar a
então prefeita Marta Suplicy na
disputa do segundo turno das
eleições. No primeiro turno, vigorava um pacto de não-agressão.
Uma semana depois do discurso de Mentor na CPI, o presidente
do PP paulista, deputado federal
Vadão Gomes, começou a ser
abastecido com o dinheiro do esquema, segundo as informações
de Valério. O ex-tesoureiro nacional do PT Delúbio Soares orientou a entrega de R$ 1 milhão no
dia 5 de julho, início da campanha
municipal. Em 16 de agosto, mais
R$ 2,7 milhões irrigaram o PP.
"Atrapalha"
Na semana passada, em depoimento a membros da CPI dos
Correios, o doleiro Antônio Claramunt, o Toninho da Barcelona
disse que trocava dólares para
membros do PT durante a "campanha presidencial" de 2002.
Mentor também atuou para
tentar adiar o depoimento de Barcelona, alegando que ouvi-lo iria
"atrapalhar" seu trabalho de relator. Além disso, retirou um pedido para que fossem enviados à
Justiça Federal os dados bancários de Toninho - pedido que ele
mesmo havia apresentado. O doleiro nunca foi ouvido pela CPI.
Mentor fez três referências a Toninho em seu relatório final com
descrições sobre a atuação do doleiro que reunidas não passariam
de uma página. Mas, na parte dos
indiciados, não incluiu Toninho.
Em contrapartida, o relatório
alternativo do presidente da CPI,
Antero de Barros (PSDB-MT),
dedica 22 páginas ao doleiro.
Em abril do ano passado, Toninho foi o centro de uma divergência entre Barros e Mentor, durante sessão da CPI. O presidente da
comissão decidira marcar o depoimento do doleiro para dali a
uma semana. Mentor reagiu na
hora. "(...) Queria registrar, sr.
presidente, até por uma atribuição regimental do relator, que é
conduzir a investigação, a minha
discordância, salvo melhor juízo
de Vossa Excelência, pelas duas
propostas de diligências, uma delas em relação ao sr. Toninho Barcelona", disse Mentor.
O relator alegava que o depoimento do doleiro devia ser adiado
por uma questão estratégica. "Esta comissão já aprovou a convocação de Sua Senhoria [Toninho]
há muito tempo. Vossa Excelência participou de uma reunião
com a força-tarefa, em Curitiba,
de discussão sobre o tratamento a
ser dado aos doleiros. Temos uma
estratégia na investigação dos doleiros. Pode não atrapalhar o Ministério Público, pode não atrapalhar a Polícia Federal, mas atrapalha a relatoria [da CPI]."
Compadre
Bem relacionado com o advogado Roberto Teixeira, compadre
do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, o empresário Antônio Celso
Cipriani estava sob foco da oposição na CPI por operações bancárias feitas por sua empresa, seu irmão, Emídio, e a empresa Cave
Creek, de sua mulher, Marise.
Cipriani recebeu um tratamento obsequioso no relatório final de
Mentor. O deputado não só excluiu-o da lista de indiciados como também recomendou que o
governo federal investigasse "denúncias" que Cipriani teria feito
numa carta enviada à comissão
sobre suposta concorrência desleal na aviação.
Em 23 de junho de 2004, os microfones da TV Senado captaram
um diálogo entre Mentor e dois
aliados da comissão, Serys Slhessarenko (PT-MT) e Eduardo Valverde (PT-RO), no qual o relator
discutiu uma estratégia de retaliar
a oposição, caso fosse aprovada a
convocação do advogado Roberto Teixeira, o que nunca ocorreu.
Mentor qualificou Teixeira como
"compadre do Lula (...), e é meu
amigo" - amizade que Mentor já
havia salientado em entrevista à
Folha, dias antes.
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