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ELIO GASPARI
O mau humor de Lula Figueiredo
"Não votei porque não
votei", essa foi a resposta de Lula quando lhe perguntaram porque não apareceu na
eleição do PT que ajudou a fundar, cuja militância levou-o à
Presidência da República. Dias
antes, quando lhe pediram que
explicasse o uso de dinheiro do
partido para custear seis passagens aéreas usadas por sua família numa viagem a Brasília,
disse assim: "Eu estranharia se
fosse o PSDB ou o PFL que tivesse pagado a minha passagem,
mas o PT tinha mais era obrigação de pagar".
Lula continua assemelhando-se ao general João Figueiredo
(1979-1984). Têm em comum o
gosto pela Granja do Torto, o recurso a palavrões em audiências
institucionais e a paixão pelos
improvisos delirantes.
Nada a ver com a viagem de
Napoleão à China ou a descoberta de afrodescendentes na
Nigéria. As duas respostas dos
últimos dias são um exemplo de
uma confusa mistura de humor
simplório a serviço de evasivas
grosseiras.
O "não votei porque não votei" ecoa Jânio Quadros explicando porque bebia uísque:
"Bebo porque é líquido. Se fosse
sólido, come-lo-ia". Trata-se de
desprezar a curiosidade da audiência. No mesmo dia em que
Lula não votou porque não votou, 272 mil petistas votaram
porque votaram.
Lula poderia ter dito qualquer
coisa, menos fazer gracinha com
um partido que está na lona
muito mais por sua causa do
que por culpa da militância
anônima da estrelinha.
Por mais que se estranhe a ausência de Lula, bem como sua
explicação, o episódio envolve
um petista e seu partido e pode-se argumentar que os estranhos
não têm nada a ver com isso. Já
a segunda resposta, relacionada
com as passagens, é diferente. Se
o PT pagasse as viagens da família Lula da Silva (inclusive
das namoradas de dois de seus
filhos) com reais arrecadados
na militância, tudo bem. A boca
livre foi paga pelo Fundo Partidário, arca alimentada pelos
impostos cobrados aos trabalhadores. Dinheiro público. A legislação não permite o uso desses recursos para cobrir gastos
de familiares. A resposta brincalhona do "nosso guia" mistura
humor de segunda com prepotência de primeira. Se o PSDB
ou o PFL quiserem pagar contas
dos Lula da Silva sem recorrer
ao dinheiro do Fundo Partidário, podem fazê-lo, mas não podem avançar sobre o Fundo
Partidário.
Gritos de guerra como "ninguém neste país tem mais autoridade moral e ética do que eu"
parecem-se com o brado de Figueiredo ameaçando os adversários da redemocratização:
"Prendo e arrebento". Na manhã de 1º de maio de 1981, o general foi informado de que explodira uma bomba dentro do
carro de um capitão do DOI, estraçalhando um sargento. O tigrão miou. Figueiredo julgou-se
traído pelas pessoas que armaram a bomba do Riocentro. Pode-se acreditar que não teve nada a ver com aquilo, mas ele
soube direitinho o que aconteceu naquela noite.
Ademais, sabia quem botava
bombas em bancas de jornais.
Em agosto passado, Lula disse o
seguinte: "Quero dizer a vocês,
com toda a franqueza, eu me
sinto traído. Traído por práticas
inaceitáveis das quais nunca tive conhecimento". Práticas não
traem. Quem trai são pessoas.
Figueiredo nunca disse os nomes de quem o traiu.
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