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JANIO DE FREITAS
Notas e fotos
Já são dois, e perfeitamente
distintos, os aspectos críticos
dos desdobramentos provocados pelas fotos nas quais a viúva
de Vladimir Herzog o reconhece, despido e acabrunhado sobre
um catre, que nem a agressiva
nota oficial do Exército negou
ser em dependência sua.
O primeiro dos aspectos decorre dessa nota. Seu desatino, seja
considerada do ponto de vista
histórico, político, moral ou militar, inscreve-a e aos seus adeptos nos casos de psicopatologia.
A nota é produto de uma desestruturação que não identifica
fatos e passado, presente e evidências, princípios e regras.
Constrangido pelo desatino que
também o atingiu, o governo levou dois dias mas, afinal, conseguiu extrair do Exército uma
nota, tão sucinta quanto a anterior foi prolixa, de sentido à primeira vista decente.
A nota desatinada teve autores e responsáveis, não sendo
uns e outros necessariamente os
mesmos. Autores e responsáveis
agiram em um sistema funcional que lhes possibilita desatinos como aquele e, já se tem o
direito de supor, outros de mesmo ou pior quilate. Diante disso, que providências, além da
nota para mascarar uma situação vergonhosa, o governo já tomou, como é do seu dever? Ou
ainda pensa tomar? Ou nem
pensa tomar?
Não são palavras de um jornalista que "tem má vontade
com Lula", ou coisa que o valha,
são da colunista do "Globo" Tereza Cruvinel, justificadamente
bem conceituada: [a nota desaforada do Exército] "só aconteceu porque o atual governo, repetindo os que o antecederam,
cultua o silêncio sobre os crimes
da ditadura". É o que também
chamou de "opção do governo
Lula por evitar toda apuração
dos crimes da ditadura".
Lula tem sua quota de responsabilidade pelo acesso fascistóide que procedeu do Exército e
deve ao país o exercício da responsabilidade de que está investido como presidente. A notinha
pretensamente reparadora não
pôde escamotear a sua insinceridade de remendo e, como tal,
não inicia o processo de consertos sem o qual a democracia
brasileira estará, sempre, sob o
desafio de espadas.
O outro aspecto crítico é bem
paisano. Ao divulgar no domingo as fotos de Herzog, o "Correio
Braziliense" informou que foram encontradas nos arquivos
da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados.
Em 28.8.97, aqui foi publicado
um artigo ("O serviço dos agentes") motivado por documentos
que o cabo José Alves Firmino,
ex-agente, retirou do Exército e,
de quebra, indicavam a persistência da espionagem "sob o regime dito constitucional no governo dito democrático do presidente dito democrata" (Fernando Henrique). O governo não teve maior interesse nos documentos, que poderiam levar a
investigações contrárias ao seu
desejo de proteger, não de esclarecer. Jornais também não levaram adiante a senda oferecida
pelo ex-agente.
Mas como a Câmara dos Deputados, os atuais e os então integrantes da sua Comissão de
Direitos Humanos e o hoje ministro Nilmário Miranda explicam a responsabilidade pelo absurdo de que só agora, passados
sete anos de sua entrega, as fotos
sejam notadas? Ou os documentos não foram sequer folheados,
ou o foram e também na Comissão de Direitos Humanos, com
os seus bravos petistas, fez o acovardamento conveniente sobrepor-se ao dever parlamentar,
ético e humano. Também por
este lado o país tem o direito de
receber explicações e atitudes.
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