São Paulo, quarta-feira, 21 de outubro de 2009

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ANÁLISE

Captação ilícita de recursos

CARLOS VELLOSO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A decisão do juiz eleitoral paulista, cassando e tornando inelegíveis por três anos 13 vereadores da Câmara Municipal de São Paulo, que receberam, nas eleições de 2008, doações da AIB (Associação Imobiliária Brasileira), traz ao debate a questão das doações ilícitas. A Lei Eleitoral proíbe que sindicatos façam doações a políticos.
Ademais, pessoas jurídicas não podem fazer doações que ultrapassem 2% de sua renda bruta do ano anterior.
A decisão é das mais importantes. Doações ilícitas maculam as eleições, porque estabelecem o desequilíbrio entre os candidatos, com ofensa ao princípio da igualdade, que é inerente à República. Por isso devem ser combatidas com vigor. No ponto, avulta a participação do Ministério Público como fiscal do exato cumprimento da lei.
A recente lei aprovada pelo Congresso Nacional, a lei da reforma eleitoral, que, em termos de reforma, não trouxe nenhum avanço, deveria ter sido mais rigorosa. Isso não tendo acontecido, corre ao Ministério Público e à Justiça Eleitoral o dever de preencherem o vazio da lei. É que, vale repetir, contas de candidatos e partidos que não reflitam o que constitui a vontade da lei -a lei quer eleições limpas- desequilibram o pleito e atentam contra sua legitimidade.
No caso paulista, verificou-se que a doadora não tem funcionários, suas receitas provêm de doações das empresas do setor imobiliário. Essa entidade teria doado a candidatos, na eleição municipal de 2008, cerca de R$ 10,5 milhões. Ela existiria, segundo a sentença, com a finalidade de encobrir doações de eventuais fontes vedadas, dentre elas entidades sindicais. O juiz considerou-a "um simulacro de associação", sem "atividade própria".
Tenho sustentado que a Justiça Eleitoral deve ousar em prol do interesse público-eleitoral. Sempre que o fez teve o aplauso da sociedade. Foi assim, por exemplo, em 1945, quando investiu a então convocada Assembleia Constituinte de poder constituinte originário. E quando impôs a fidelidade partidária, impedindo o troca-troca entre partidos políticos.
A democracia possível é a democracia representativa, indireta. Eleições limpas constituem pressuposto da legitimidade da representação. Realizar esse pressuposto é obrigação da Justiça Eleitoral com o auxílio do Ministério Público.


CARLOS MÁRIO DA SILVA VELLOSO é ex-presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral)


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