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Ex-militante se lembra de gritos de ajuda em espanhol vindos da pior cela do Dops
Marcelo Soares/Folha Imagem
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A professora da Unicamp Sônia Miriam Draibe, 64, que ficou presa no Dops no fim de 1973 |
DA REPORTAGEM LOCAL
Gritos de "ajuda" e "socorro" em espanhol vindos de
uma cela no Dops em novembro de 1973 desde então foram uma interrogação para a
professora da Unicamp (Universidade de Campinas) Sônia Miriam Draibe, 64, ex-militante da organização de esquerda Polop (Política Operária), presa pelo Exército e
pelo Dops em 1971 e 1973, respectivamente. Ela nunca soube quem era o dono de tal voz.
No último domingo, ao ler
na Folha reportagem sobre a
localização de familiares de
Miguel Sabat Nuet (1923-1973), Sônia disse ter tido a
certeza de que era ele a pessoa que ocupava, naqueles
dias, a pior cela do Dops, conhecida como "fundão" ou
"forninho".
"Sempre ouvimos descrições horrorosas sobre aquela
cela. Isolavam a pessoa como
uma punição. Era uma tortura", disse Sônia. "Lembro
bem dos gritos, duravam o
dia todo. Ele repetia brados,
gritos, invocações. Dizia:
"Maria, Socorro", "Maria del
Socorro", "Santa Maria", "Ajude-me'", recordou-se Sônia.
Segundo seus familiares,
Nuet era muito católico e
produziu o que chamou de
"escritos teológicos".
Alarmada com os gritos,
Sônia uma vez pediu explicações a um carcereiro, que lhe
respondeu tratar-se de "um
argentino louco". Nuet havia
morado em Buenos Aires.
A professora e a pessoa que
ela identifica como sendo Miguel eram os únicos presos do
Dops entre os dias 23 e 26,
quando foi transferida da delegacia para o DOI-Codi, órgão do Exército na rua Tutóia. Segundo a versão da polícia, Miguel teria se matado
entre 27 e 30 de novembro.
A professora havia sido detida por ter voltado do Chile,
que sofrera um golpe de Estado em setembro daquele ano.
Em 1971, já havia sido presa
por ligações com a Polop.
Sônia contou que o delegado Sérgio Paranhos Fleury,
morto em 1979 em Ilhabela
(SP), comandava os interrogatórios na delegacia. Foi ele
o autor do seu interrogatório,
que durou só dois minutos.
Sônia disse ter tido sorte: no
dia 23 a delegacia comemorava, com bebida alcoólica, a
aprovação da "Lei Fleury",
feita sob encomenda e que facultava ao juiz a possibilidade
de não decretar a prisão de
réus primários. Fleury era
acusado de chefiar grupos de
extermínio em São Paulo.
(RV)
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