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DEMOGRAFIA
Ocupação do campo volta a aumentar nos anos 90, mas o atrativo é o setor de serviços, não a agricultura
População rural cresce e muda de perfil
JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
da Reportagem Local
Após décadas de quedas consecutivas, a população rural brasileira voltou a crescer nos anos 90.
Mas isso não se deve à agricultura.
Ao contrário, houve uma mudança de padrão: o êxodo rural foi
substituído pelo êxodo agrícola.
Diante da crise na agricultura, a
população das áreas rurais encontraram opções para sua sobrevivência, mas em outros setores, especialmente o de serviços.
A diferença é que, agora, essas famílias não precisaram abandonar
o meio rural para encontrar uma
nova fonte de renda.
Ocupações como as de jardineiro, caseiro, professora primária e
empregada doméstica, além de
empregos ligados ao lazer rural
(como em hotéis fazenda e pesque-pague), absorveram boa parte dessa mão-de-obra que, em outra
época, teria migrado para a cidade.
Assim, em 1997, de cada 10 pessoas ocupadas na área rural, apenas 7 estavam vinculadas à agricultura. Em 1981, eram 8 em cada 10.
Essas são algumas das principais
conclusões do projeto "O Novo
Rural Brasileiro", que após três
anos de pesquisas será apresentado num seminário a partir de
quarta-feira, na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
Nos anos 80, a população rural
caiu em média 0,2% ao ano. Como
resultado, em 1992 havia 450 mil
pessoas a menos fora do perímetro
urbano dos municípios brasileiros
do que em 1981.
Nos anos 90 a tendência se inverteu: a população rural começou a
crescer 0,5% ao ano. Em 1997, já
havia 530 mil pessoas a mais nas
áreas rurais do que em 1992.
"Desde os anos 70 a população
rural não-agrícola vem crescendo.
Como esse grupo era muito pequeno, não era suficiente para reverter
a queda da população rural total",
diz José Graziano da Silva, um dos
coordenadores da pesquisa.
"Nos anos 90 intensifica-se, especialmente na agricultura, a tendência de a economia se voltar para o setor de serviços. Os motivos
são a importação de alimentos e os
cortes no crédito agrícola."
Esses fatores se somam às novas
tecnologias de plantio e colheita,
que necessitam cada vez menos de
mão-de-obra.
Ao mesmo tempo, o aumento do
desemprego, da violência e do custo de vida nas cidades tornou a migração para os centros urbanos
muito menos atraente.
Pressionada nas duas pontas, a
população rural voltou-se para atividades não-agrícolas que não implicassem sua saída do campo.
Professor de economia agrícola
da Unicamp, Graziano ressalva
que ainda há migração de pessoas
do campo para a cidade, mas em
níveis muito inferiores aos das últimas décadas.
O importante, segundo ele, é que
a tendência mudou. "Felizmente,
ao contrário do que aconteceu nos
EUA, estamos revertendo o êxodo
rural antes que haja uma desertificação do campo."
Se esse fenômeno implica benefícios, como uma menor pressão
habitacional e por empregos nas
cidades, também requer adaptações nas atuais políticas públicas.
O economista cita, por exemplo,
a necessidade de uma política habitacional voltada para o meio rural. Graziano julga extemporânea,
por exemplo, a proibição de loteamentos fora do perímetro urbano
dos municípios.
Ele afirma que na área rural há
demanda tanto por condomínios
de luxo quanto por moradias de
baixa renda. Em ambos os casos a
oferta é tangida por uma legislação
elaborada quando o rural ainda
era sinônimo de agrícola.
Outro setor que precisa ser repensado é o de transportes. A pesquisa mostra que é cada vez maior
o número de pessoas que mora na
área rural e trabalha na cidade (ou
vice-versa) e cuja demanda vai
além da rede de ônibus urbanos.
A terceira área que envolve políticas públicas é a de crédito. Quase
todos os mecanismos existentes
obrigam a destinação dos recursos
a atividades agrícolas.
Até mesmo no caso da eletrificação rural, diz Graziano, o interessado tem que provar que usará a
energia para produção agrícola.
Mais: que obterá dessa atividade
uma renda suficiente para pagar o
empréstimo.
"Isso não faz mais sentido, porque grande parte desse público (do
programa de eletrificação) já trabalha na cidade ou em atividades
rurais não agrícolas", afirma o
professor da Unicamp.
Apesar de o nome oficial ser "O
Novo Rural Brasileiro", o projeto
de pesquisa é mais conhecido por
seu apelido: Rurbano.
A expressão foi emprestada pelos pesquisadores de um livro do
sociólogo Gilberto Freyre: "O que
é Rurbano", de 1962.
Opositor da reforma agrária nos
moldes pregados então pelas ligas
camponesas, Freyre cunhou a expressão rurbano para sintetizar o
conceito de ruralidade como opção de moradia e lazer.
Mais de três décadas depois, o
nome foi resgatado pelos pesquisadores de "O Novo Rural Brasileiro" que, coincidentemente, chegaram a conclusões semelhantes às
do autor pernambucano.
A pesquisa é coordenada por
dois professores da Universidade
Estadual de Campinas: Graziano e
Rodolfo Hoffmann.
Além do Núcleo de Economia
Agrícola da Unicamp, participam
do projeto 11 universidades federais e dois núcleos da Embrapa
(Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária), num total de 25
pesquisadores.
O financiamento para a realização do trabalho é da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo) e do Pronex
(Programa Nacional de Núcleos de
Excelência).
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