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CELSO PINTO
Dólares de curto prazo não vão faltar
Desde a terça-feira da semana passada, quando o
risco Brasil, medido pelo EMBI,
fechou a 706 pontos, o mercado
piorou bastante: o risco voltou
para 825 pontos, uma alta de
16,8%. A piora foi atribuída, de
início, à confusão petista no Senado. Depois, ao medo de deflação nos Estados Unidos e na Europa e à desvalorização do dólar.
Será que, mais uma vez, o
Brasil será atropelado por uma
crise de liquidez externa? Arturo Porzecanski, diretor-gerente
e economista-chefe do ABN
Amro em Nova York, acha que
não. Liquidez externa existe e
continuará abundante. O juro
básico é de apenas 1,25% nos
Estados Unidos e 2,5% na Europa, e a expectativa, com o medo
da deflação, é de novos cortes
nos juros, especialmente o europeu.
Em ciclos de liquidez abundante, o investidor só não vai
buscar mais rendimento em
emergentes se tiver medo de calote, diz. Em 2001, o juro caiu,
mas o medo do calote argentino
retraiu o fluxo para a América
Latina. Em 2002, o juro continuou a cair, mas havia o medo
de um calote no Brasil. Esse medo está superado e só voltará "se
houver uma revolução dentro
do PT que leve, por exemplo, à
saída do ministro Palocci".
Filippo Nencioni, estrategista-chefe do CSFB em Nova York,
concorda. Os sinais de que a liquidez continuará abundante
por longo período, hoje, são ainda maiores do que há um mês.
A correção recente de preços se
deu, principalmente, porque investidores atraídos pela corrida
aos emergentes, mas sem bases
técnicas, estão dispostos a realizar lucros ao primeiro sinal de
reversão. A correção, contudo,
deve durar pouco, porque há
boas razões de fundamento para investidores mais bem informados comprarem.
O risco de deflação americana
pode ajudar: se ocorrer, prejudicará mais as empresas do que os
emergentes, que veriam sua dívida, em dólar, desvalorizada.
Papéis de alguns países de risco
médio, como Panamá, Peru e
Colômbia, já subiram demais,
mas não os do Brasil. Ao contrário, ele acha que o Brasil é a
melhor oportunidade do mercado e recomenda fortemente a
compra.
Porzecanski atribui a retração
dos últimos dias ao medo do
desconhecido. O fantasma da
deflação e o impacto da desvalorização do dólar "são movimentos sísmicos na psicologia
do mercado". Sem entender
bem as consequências de ambos, os investidores recriaram
uma pequena "fuga para a qualidade", comprando títulos
americanos. Ele acha, contudo,
que o risco real de deflação, especialmente nos Estados Unidos, é pequeno e que o investidor vai voltar aos emergentes. E
aí, o Brasil acabará beneficiado.
Existem três classes de emergentes. Os que têm "nível de investimento", como México,
África do Sul, Polônia e Malásia, atraem menos, porque seus
prêmios são pequenos, entre 100
e 200 pontos. Alguns médios, como lembrou Nencioni, valorizaram muito. A Rússia, quase em
"nível de investimento", com
300 pontos, é uma exceção. Os
de maior risco são liderados pelo Brasil e incluem países como
Turquia, Venezuela, Equador e
Nigéria, entre 800 a 1.300 pontos.
O Brasil é, de longe, o de
maior liquidez. Portanto, é opção obrigatória para fundos que
buscam rentabilidade. A concorrência direta ao Brasil, diz
Porzecanski, são menos outros
emergentes de alto risco, do que
o mercado de "high yield" americano. Com uma vantagem
brasileira: a liquidez é muito
maior.
É preciso colocar em perspectiva, de todo modo, o que aconteceu até agora. A idéia de que,
passado o medo do calote petista, o Brasil voltou a março de
2002 (quando o risco chegou a
698 pontos) não é bem verdade.
De março de 2002 até o pico da
confusão, em setembro, o risco
Brasil subiu 1.750 pontos, ou
250%. De lá até o novo vale dia
13 de maio deste ano, caiu 1.737
pontos, ou 71%. Devolveu, portanto, quase todo o excesso.
No entanto, o resto dos emergentes melhorou mais. Em março de 2002, o risco dos emergentes, exceto Brasil, estava em 503
pontos: a diferença com o Brasil
era de 195 pontos. Desde então,
a distância entre o Brasil e o resto subiu a 378 pontos, em setembro, e caiu, hoje, para 369 pontos. Ou seja, está em torno de
170 pontos acima do que estava
em março de 2002.
Olhando pelo lado positivo, isso quer dizer que ainda há espaço para ganhos com o Brasil. O
fato é que a onda positiva arrastou todo mundo. O risco da Nigéria, por exemplo, teve um
comportamento muito parecido
com o do Brasil: subiu 256% entre março e setembro de 2002 e
caiu, desde então, 70%. Argentina e Costa do Marfim, ambos
em moratória, registraram altas expressivas recentes.
A liquidez, contudo, é de capital mais especulativo, de curto
prazo, parte do qual saiu dos
debilitados mercados acionários. Investimento direto mais
estável não deve melhorar por
um bom tempo. "Melhor ter algum capital externo, mesmo especulativo, do que nenhum",
diz Porzecanski. Pelo menos até
as condições externas e internas
melhorarem.
E-mail: CelPinto@uol.com.br
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