São Paulo, domingo, 22 de junho de 2008

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ELEIÇÕES 2008 / JUSTIÇA ELEITORAL

Interpretação da lei eleitoral muda muito, diz procurador

Para José Jairo Gomes, lançamento de propostas em entrevistas pode configurar fraude

Autor de livro citado na ação contra o jornal e a revista "Veja São Paulo" afirma que as leis têm como objetivo equilibrar a disputa eleitoral

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

"A Justiça Eleitoral dá uma determinada interpretação hoje, daqui a dois meses muda", diz o procurador regional eleitoral de Minas Gerais, José Jairo Gomes, 40. Ele é autor do livro "Direito Eleitoral", citado na sentença que condenou a Folha pela entrevista com a pré-candidata Marta Suplicy.
No caso da internet, ele afirma que "a ausência de regras, esse vácuo legislativo, deixa as pessoas sem saber o que fazer".
Gomes avalia que, no caso da entrevista da ex-ministra do Turismo, a representação da Promotoria Eleitoral não foi "indevida", pois ela não pediu votos mas lançou propostas. Ex-promotor de Justiça, Gomes é doutor e professor de direito civil da Universidade Federal de Minas Gerais.  

FOLHA - Por que a internet é um espaço interditado nas eleições?
JOSÉ JAIRO GOMES
- A internet não é um espaço interditado. Ela não sofreu ainda uma regulamentação do legislador nem o TSE se pronunciou definitivamente. O candidato pode abrir uma página na internet, mas só a partir de 6 de julho. Porque a lei veda a propaganda eleitoral antes dessa data.

FOLHA - A internet foi equiparada ao rádio e à televisão, mas ela não é uma concessão pública...
GOMES
- A internet tem uma capilaridade muito grande. O problema não é o fato de não ser concessão. O cinema é um bem particular. Mas é vedada a realização de propaganda no cinema, local de acesso público.

FOLHA - Sendo a internet um veículo tão democrático e acessível, onde estaria o risco de desequilíbrio?
GOMES
- Um grupo econômico com interesse de colocar no poder um determinado segmento poderia manipular, controlar os portais e deixar de fora outros candidatos. É impossível que as pessoas tenham tratamento igual. A lei procura equilibrar a disputa pelo poder.

FOLHA - Quais serão os limites das comunidades virtuais?
GOMES
- É uma grande interrogação. Porque o TSE não traçou limites. Isso não significa que se pode fazer tudo. A propaganda extemporânea é vedada. Se um pré-candidato manda spams, vai ser caracterizado como propaganda extemporânea.

FOLHA - Uma entrevista com um pré-candidato é de interesse público. O jornal terá que perguntar sobre temas como raças de cachorros?
GOMES
- Um pré-candidato notório evidentemente não vai recitar os poemas de Camões. Vai falar de política. O problema não é a entrevista. Há um dispositivo que permite à imprensa escrita dar a sua opinião. Quando se trata de pré-candidato, a propaganda só pode ser feita a partir do dia 6 de julho.

FOLHA - Mas aí se está admitindo que a entrevista é propaganda.
GOMES
- Não necessariamente. O pré-candidato pode opinar sobre a política em geral. Não pode é lançar a candidatura.

FOLHA - O sr. leu a entrevista de Marta Suplicy, na Folha?
GOMES
- Li.

FOLHA - O sr. acha que houve abuso? Ela fez pedido de voto?
GOMES
- Ali não é propriamente pedido de voto. Na Justiça Eleitoral, muitos entendem que pode haver propaganda extemporânea sem pedido de voto, quando o pré-candidato expõe os seus projetos.

FOLHA - Supondo uma entrevista igual, o sr. entraria com ação?
GOMES
- Eu tenho a impressão de que a representação aí não é indevida. Na entrevista dela, ela lança propostas. Há decisões que condenam essa prática e decisões que dizem que isso não seria irregular.

FOLHA - Qual dispositivo legal define temas proibidos aos jornais?
GOMES
- Na verdade, a lei não especifica os temas. O que é propaganda eleitoral? Quando a gente pesquisa na Justiça, encontra condutas bastante semelhantes a essa que foi veiculada sendo considerada como propaganda. Então, se faz um raciocínio por analogia.

FOLHA - O jornal alega que se trata de uma censura inaceitável.
GOMES
- Desconheço os detalhes do caso. Tenho a impressão de que censura é uma palavra um pouco forte. Para que haja uma sanção, é preciso que haja um processo. As pessoas se defendem. Vejo isso como uma manifestação democrática.

FOLHA - Seu livro foi citado na sentença por tratar da igualdade de oportunidades. O jornal teria que repetir o horário eleitoral, com anúncios classificados dos candidatos?
GOMES
- Houve esse problema também na regulamentação dos debates. Houve intervenção da Justiça Eleitoral para dizer que todos os candidatos precisam estar representados.

FOLHA - O jornal entrevistou outros pré-candidatos.
GOMES
- O problema é outro. É o momento. Agora, esse tema não poderia ser veiculado.

FOLHA - A citação de seu livro na sentença trata da igualdade.
GOMES
- É porque não há ainda um candidato. Quando um pré-candidato tem projeção, a situação dele, para ser escolhido na convenção, fica fortalecida. Pode haver outro pré-candidato sem o mesmo destaque.


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