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São Paulo, quarta-feira, 22 de outubro de 2003

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ELIO GASPARI

Depois da bala perdida, a bala petista

Reforma tributária é coisa a respeito da qual todos têm opinião e estão dispostos a fazer tudo para defender seus interesses, menos ler sobre ela. Pena, porque quanto menos o sujeito lê, maior é a tunga que toma. A ekipekonômica de Lula se prepara para mais uma reforma tributária no melhor estilo de Pindorama. Toma mais de quem não tem para tomar menos de quem tem. Temia-se o populismo, mas se preservou o nababismo.
O cidadão tem R$ 1 milhão no banco e gosta de mover seu dinheiro, indo de fundos de renda fixa para aplicações cambiais ou carteiras de ações. Esse pobre miserável muitas vezes não consegue fazer três refeições por dia (por falta de tempo). Ele é obrigado a pagar a CPMF a cada movimento que faz com seu dinheiro. Uma verdadeira injustiça. O mercado é pai e manteve o doutor Joaquim Levy na ekipekonômica. Ele é o atual secretário do Tesouro e sustenta a necessidade de isentar esses pobres investidores do pagamento da CPMF. Nas suas palavras: "A idéia é o investidor entrar num ambiente no qual pode se movimentar sem pagar CPMF". Uma espécie de carro blindado para proteger o andar de cima do fisco.
O doutor Levy é um sábio. Quer criar um "ambiente" especial para os investidores. (As aplicações na Bolsa não pagam CPMF. As aplicações de injeção pagam.)
Que tal um "ambiente" para os desempregados? Ou para os cheques com os quais os desempregados pagam o colégio de seus filhos? Ou a saúde dos familiares? Sempre é bom lembrar que em São Paulo há dois doutores desempregados para cada analfabeto desocupado.
Dirá o pessoal da ekipekonômica que esse tipo de proposta é demagógica. Falando francamente, é, porque seria muito difícil fazê-la funcionar. Se fosse fácil, seria adotada.
Seria fácil fazer funcionar a proposta do senador Jorge Bornhausen, do PFL, pela qual o que se venha a pagar de CPMF possa ser deduzido do que se deva ao Imposto de Renda. Ou a do senador Tasso Jereissati, do PSDB, pela qual sempre que a arrecadação for maior do que a inflação a alíquota da CPMF cai 0,01%. Diz o doutor Antonio Palocci que essas propostas são ruins porque reduzem a arrecadação. Poderia informar se o CPMF-Zero para aplicações financeiras aumenta arrecadação?
A questão está na outra ponta, na plutofilia. Assim como o demagogo quer arrastar consigo a patuléia, o plutófilo adora cuidar do alpiste do andar de cima.
O CPMF-Zero é coisa de plutófilo. Surge no momento em que o PT-Federal perfilha a universalização das taxas de iluminação e de lixo. Elas permitirão aos municípios que cobrem taxa de iluminação pública, com base no consumo residencial, mesmo em bairros onde iluminação pública não há.
À primeira vista, a plutofilia de Lula faz parte do pesadelo do ajuste fiscal. Talvez não. Um sábio que entende de números e de políticas públicas resume seu medo: "Você pode muito bem ter um país com o 1% mais rico feliz com os rendimentos do capital e os 40% mais pobres encantados com os plásticos do Bolsa-Escola". Quem estiver no meio tomará bala petista.


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