São Paulo, quinta-feira, 22 de novembro de 2007

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PF investigará doação de laranjas ao PT

Polícia pede autorização da Justiça para apurar repasse de R$ 500 mil de empresas que atuariam em esquema de fraude da Cisco

Investigadores suspeitam que a Cisco seja real doadora do dinheiro; os supostos sócios não teriam condições de doar cada um R$ 250 mil

MARIO CESAR CARVALHO
JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
DA REPORTAGEM LOCAL

A Polícia Federal pediu autorização à Justiça federal para abrir um inquérito específico para investigar por que duas empresas de laranjas doaram R$ 500 mil para o PT.
A doação de R$ 500 mil foi feita por duas empresas da Bahia, a Nacional Distribuidora e a ABC Internacional, que fariam parte de uma esquema de fraude em importações que seria controlado pela Cisco. Cada uma das empresas aparece em recibos com tendo doado R$ 250 mil, conforme a Folha revelou no último domingo.
Os supostos sócios das empresas não teriam condições de fazer uma doação desse porte, segundo os policiais. A Nacional, por exemplo, seria controlada por uma pessoa cujos rendimentos em 2006 somam R$ 17.493,32 (R$ 1.460 por mês).
A interpretação da PF é que a Cisco, a maior empresa de rede de computadores do mundo, usou as duas empresas de laranja para dar dinheiro ao PT.
Em troca da doação, ainda de acordo com os policiais, o PT teria ajudado uma distribuidora da Cisco, a Damovo, a ganhar um leilão eletrônico da Caixa Econômica Federal de R$ 9,9 milhões. Para a polícia, a Caixa mudou um edital para que a Damovo ganhasse a disputa.
A Caixa diz que o edital não sofreu mudanças. A Damovo também nega ter sido beneficiada na disputa. O diretório nacional do PT informou que o partido não tem como verificar se uma empresa que doa está envolvida em fraudes.
A polícia tem dois tipos de indícios de que a Cisco é a real doadora do dinheiro. Um dos indícios são as conversas telefônicas de dois executivos da empresa no Brasil.
Carlos Carnevali Júnior, diretor de vendas da Cisco, e Sandra Tumelero, gerente que atendia a Caixa, foram flagrados falando sobre a doação. Outro indício são os recibos de doação. Eles foram apreendidos com Marcelo Ikeda, diretor de vendas da Mude, maior distribuidora da Cisco.
O pedido da abertura do novo inquérito foi feito pela delegada Erika Tatiana Nogueira, que preside a investigação sobre a Cisco. A investigação não deve se restringir às doações de R$ 500 mil. Outras 16 empresas que fizeram doações ao PT neste ano. O motivo é o valor elevado que o PT arrecadou num ano sem eleições. Entre fevereiro e setembro deste ano, o partido recebeu R$ 6,22 milhões. O valor é o terceiro maior da história do partido. Só perde para 2004 e 2006, anos eleitorais.
Os policiais trabalham com a hipótese de que o PT teria criado um novo esquema de arrecadação depois do escândalo do mensalão. De acordo com essa hipótese, os doadores usariam laranjas para ficarem impunes no caso de eventuais investigações. O uso de laranjas teria ainda a vantagem de a empresa não associar sua marca à suspeita que ronda as doações.
O pedido de abertura de novo inquérito é, na prática, uma formalidade. Raramente, a Justiça nega esse tipo de solicitação. O novo inquérito é necessário porque a investigação sobre a Cisco está focada em fraudes nas importações. A empresa é acusada de usar uma rede de empresas para importar equipamentos com preços subfaturados em até 75%, o que teria causado um prejuízo aos cofres públicos de mais de R$ 1,5 bilhão.
O novo inquérito deve investigar os crimes de falsidade ideológica, sonegação fiscal (as empresas ABC e Nacional não teriam capacidade de fazer a doação), formação de quadrilha e uso de caixa dois.


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