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Filha de Chico Mendes vê vitória de desmatadores
Após 20 anos da morte do líder seringueiro, Elenira Mendes dirige ONG no Acre
Reservas defendidas pelo ambientalista hoje estão tomadas por gado; Ibama elabora plano para que área seja somente extrativista
MATHEUS PICHONELLI
DA AGÊNCIA FOLHA
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELÉM
Vinte anos após a morte de
Chico Mendes, Elenira Mendes, 24, filha do seringueiro,
afirma que os desmatadores
que patrocinaram o assassinato
de seu pai, em 22 de dezembro
de 1988, seguem vencendo a
"queda de braço" na Amazônia.
"Com certeza eles ganharam
na época. Hoje o cenário é diferente, mas ainda estamos perdendo a queda de braço", afirma ela. "Foram criadas as reservas [extrativistas], sonho do
meu pai, mas esbarramos em
outro problema: como, dentro
das reservas, pessoas vão sobreviver dignamente sem precisar destruir?", questiona.
Elenira tinha quatro anos
quando ocorreu o crime, em
Xapuri (AC). Hoje, preside a
ONG Instituto Chico Mendes e
se dedica a projetos de educação ambiental para a região.
A criação de reservas extrativistas, para uso comum na floresta, era defendida por Chico
Mendes, que se opunha à divisão das terras em lotes e cercas.
"Hoje os bois tomaram conta
das reservas", lamenta ela.
Em setembro, a Folha revelou que a área desmatada na
unidade de conservação federal que leva o nome do seringueiro cresceu 11 vezes desde
1988 e chegou a 6,3% da reserva, que tem atualmente cerca
de 10 mil cabeças de gado.
Segundo o Ibama (Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis), há um plano para que, até
2010, a área seja só extrativista.
Mudança
Em 20 anos, Chico Mendes,
que hoje dá nome ao instituto
do governo federal responsável
pela administração das unidades de conservação ambientais,
já foi tema de livros, teses, filmes e músicas.
Elenira diz, porém, que só se
deu conta da importância do
pai depois dos 18 anos, quando
uma tia deu a ela uma foto com
uma dedicatória escrita por
Mendes: "És a vanguarda da esperança. Elenira, darás continuidade um dia à luta que teu
pai não conseguirá vencer".
"Até então, tinha resistência
em relação à questão ambiental, uma coisa ligada à morte
dele. Mas ler aquilo me fez perceber que precisava me envolver", afirma Elenira, formada
em administração e que se especializou em gestão de recursos ambientais.
A filha do seringueiro conta
que Mendes está prestes a se
tornar também personagem de
histórias em quadrinhos, o
"Chiquinho". Para janeiro, diz,
está previsto o lançamento de
uma revista de Ziraldo.
Ela diz que Mendes teria hoje
"grande projeção política", mas
provavelmente estaria filiado
ao PV -ele foi fundador do PT
no Acre, Estado governado há
quase dez anos pela sigla.
Neste mês, o ativista foi anistiado pela perseguição sofrida
durante o regime militar por
conta de suas atividades sindicais, quando foi enquadrado na
Lei de Segurança Nacional por
"incitar atentado contra a paz".
A viúva de Mendes recebeu
R$ 337,8 mil de indenização e
uma pensão vitalícia de R$
3.000. A decisão, em meio às
homenagens ao líder, ocorre no
momento em que o fazendeiro
Darly Alves da Silva, condenado como mandante do assassinato, passou a cumprir pena
em regime domiciliar. Elenira
diz que a possibilidade de encontrar com Darly causa desconforto, embora a tensão não
seja a mesma da vivida pela família em 1988. "Tenho de
aprender a conviver com isso."
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