São Paulo, domingo, 23 de abril de 2006

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SECA

Retirados das margens do Jequtinhonha para construção de hidrelétrica, lavradores sofrem com perda de safra

Falta de água atinge expulsos por usina

THIAGO GUIMARÃES
DA AGÊNCIA FOLHA

O início da operação da usina hidrelétrica de Irapé, no Vale do Jequitinhonha (MG), não pôs fim aos problemas dos ribeirinhos deslocados pela obra.
Nascidos e criados às margens do Jequitinhonha e de seus afluentes -áreas úmidas e naturalmente férteis-, esses lavradores enfrentam hoje dificuldades no abastecimento de água e perdas de safra. Promessa de salvação econômica para uma das regiões mais pobres do país, a usina de Irapé consumiu US$ 1 bilhão e deverá gerar 360 MW, energia para 1 milhão de pessoas. A barragem da usina, com 208 metros de altura, é a mais alta do Brasil.
Em dezembro, a Justiça Federal embargou as obras de Irapé, três dias depois do início do enchimento do lago da usina. Atendeu pedido do Ministério Público Federal, que alegou descumprimento, pela Cemig (estatal mineira de energia), do termo firmado em 2002 para reconstituição dos direitos das 1.151 famílias atingidas.
A Cemig, que já havia depositado R$ 4,9 milhões em juízo como garantia aos reassentados, alegou não ter como parar o enchimento do lago. A Justiça Federal revogou a liminar e as águas já subiram 122 metros na barragem -cota ainda insuficiente para geração.
Transferidos para terras mais altas, os expulsos pela usina de Irapé sofrem com a falta de água, agora bombeada de córregos distantes ou poços profundos. "A água é o problema maior de todos os reassentamentos", disse Maria de Lourdes Souza, 40, da comunidade de quilombo de Porto Coris.
Segundo Souza, a água é retirada de um córrego "sujo", por duas bombas que "dão problema todo dia". Ela afirmou que a comunidade perdeu as duas últimas safras -uma porque a Cemig demorou a preparar as terras e a última por causa da seca.
A Folha ouviu quatro representantes de associações de reassentados (são 28 ao todo), e todos relataram problemas de falta de água. Otarcísio Machado, 54, da associação Mandassainha e Ventania, disse que o poço da comunidade secou e os carros-pipa pararam de chegar. "Estamos guardando água das goteiras."
Das 1.151 famílias atingidas em sete municípios, 638 optaram pelo reassentamento. Nas novas áreas, maiores, experimentam um outro tipo de agricultura, com uso de fertilizantes e longe dos padrões de lavoura familiar.
A Cemig afirmou que há problemas de abastecimento de água em alguns reassentamentos de Irapé, mas que eles estão sendo sanados. Negou que haja casos de contaminação de água.


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