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Descuido da polícia apontou o cativeiro
DA AGÊNCIA FOLHA, EM ASSUNÇÃO
A uruguaia Lilian Celiberti, 50, é
um documento vivo das atividades da Operação Condor.
Sua prisão em Porto Alegre, no
dia 12 de novembro de 1978, é o
único caso comprovado de participação dos aparatos repressivos
de dois países sul-americanos em
uma mesma missão.
Lilian Celiberti foi detida com
Universindo Díaz, integrante, como ela, do uruguaio Partido por la
Victoria del Pueblo.
No seu caso, o policial brasileiro
Orandir Portafi Lulas, o ex-jogador do Internacional conhecido
como "Didi Pedalada", foi condenado e ficou preso, por seis meses,
por abuso de autoridade.
A pena não foi cumprida porque ele era réu primário.
Lilian Celiberti foi recentemente
à Itália, para contar sua história ao
juiz Giancarlo Capaldo, do Tribunal de Roma. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
Agência Folha - Como foi sua experiência no Brasil?
Lilian Celiberti - Eu e Universindo Díaz fomos presos em Porto
Alegre por repressores brasileiros
e uruguaios. Estávamos organizando uma campanha a favor da
anistia no Uruguai, tomamos
contato com muita gente, jornalistas, historiadores...
Agência Folha - Vocês passavam
informações de um apartamento
para a Europa?
Celiberti - Sim, passávamos informações sobre a repressão.
Agência Folha - E por isso foram
presos?
Celiberti - Por tudo. Por passarmos informações, por participarmos de uma campanha pela anistia e porque tínhamos contatos
com muitos militantes. Éramos,
nós próprios, militantes do Partido por la Victoria del Pueblo.
Agência Folha - Vocês foram torturados?
Celiberti - Sim, eu recebi choques elétricos. Universindo, além
dos choques, foi torturado no
pau-de-arara e espancado.
Agência Folha - Durante quanto
tempo vocês ficaram presos em
Porto Alegre?
Celiberti - Um dia. Depois da
captura, pela manhã, fomos enviados para a fronteira. Universindo foi levado para a prisão no
Uruguai, e eu voltei para Porto
Alegre.
A polícia queria transformar o
apartamento em que eu estava em
uma espécie de ratoeira. Comigo
presa lá, as pessoas iriam me ver
sem saber da situação. Era uma
forma de atrair as pessoas.
Agência Folha - E como isso se resolveu?
Celiberti - Eles disseram para eu
passar informações para a França,
e eu aproveitei para mostrar a
companheiros de Paris que algo
estava errado comigo.
Agência Folha - Como a sra. conseguiu fazer isso com os policiais
por perto?
Celiberti - Tínhamos códigos.
Principalmente na Argentina, isso
era muito comum. As pessoas tinham de utilizar de códigos para
se comunicar.
Agência Folha - A partir disso, o
mundo ficou sabendo...
Celiberti - Sim. Os companheiros de Paris procuraram o pessoal
do dom Paulo Evaristo Arns, que
acionaram um advogado. Jornalistas me procuraram no apartamento, e os policiais disseram que
eu era contrabandista.
Depois, devolveram-me para o
Uruguai. Descobriram, é claro,
que não havia registro de uma
contrabandista uruguaia presa. A
prisão era clandestina.
Agência Folha - Quanto tempo
você ficou presa no Uruguai, depois?
Celiberti - Foram mais cinco
anos, em outras condições, porque todos sabiam que nós estávamos detidos pela repressão.
Agência Folha - Recentemente, a
sra. depôs para a Justiça italiana.
Como foi?
Celiberti - O depoimento durou
pouco mais de três horas e eu contei a minha experiência. Acho que
foi bastante importante.
Eles têm interesse em esclarecer
todos os fatos sobre a Operação
Condor, e é claro que eu tinha
muito o que dizer.
O juiz disse que vai a Madri no
final de junho, para se encontrar
com o juiz espanhol Baltasar Garzón e trocar informações.
Fui como testemunha, porque o
meu caso é de sequestro e já prescreveu. Mas agora, pelo que ele (o
juiz Garzón) me falou, a investigação sobre a Operação Condor vai
se centrar em como funcionou tudo isso. Saber que ela existiu, eles
já sabem.
(LG)
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