|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
JANIO DE FREITAS
As indenizações
Certos assuntos são de particular dificuldade, já por suas
complexidades jurídicas e humanas, e, como se não bastasse, ainda pelo alto risco de tangerem relações pessoais. Estão nesse caso
as lembranças do pré-64 e do golpe, dos antecedentes de 68 e do
AI-5, do período e dos diferentes
aspectos de ações da luta armada.
No mesmo caso, e mais recentes,
estão a anistia e as indenizações a
vítimas e a outros que se consideram ou se apresentam como vítimas físicas ou funcionais do golpe
e da ditadura.
A volta das indenizações à notoriedade evidenciou o agravamento, em vez das correções facilitadas pelo tempo, do descritério
e das injustiças. É quase inacreditável, e só não é por vivermos onde vivemos, que pessoas já idosas,
doentes, portadoras de seqüelas
dos crimes de que foram vítimas
em quartéis e na polícia, esperem
ainda pela decisão sobre suas indenizações em filas que nem lhes
permitem vislumbrar alguma
certeza, mas tão só incógnita. Se
não for humilhação.
Em sua edição de 14 de julho, a
revista "Carta Capital" reúne algumas entrevistas que refletem
essa negação de todo o sentido
institucional das indenizações.
Não estão claras as razões do absurdo, se devidas mais a imperfeições da própria legislação específica, se decorrentes de interpretações, da usual retenção de verbas
pela tecnocracia econômica do
governo, ou de outros motivos.
Mas, seja qual for o quadro, não
há justificativa possível para que
a viúvas de mortos e desaparecidos, tantas delas com filhos criados no sofrimento e na penúria,
fossem destinadas indenizações
de R$ 70 mil, R$ 100. E a outras
pessoas se concedam indenizações na ordem de milhões e pensão mensal vitalícia, seja qual for
o grau de propriedade em cada
um desses casos. A questão é a
disparidade que resulta em injustiça intolerável: para centenas,
milhares talvez, a indenização
concedida ou ainda esperada
confunde-se com novo castigo.
É indispensável, é urgente, que
o governo e as comissões incumbidas de mortos, desaparecidos, indenizações e anistia procedam ao
reexame dos seus fundamentos
legais, das interpretações, critérios e disponibilidades necessárias para corrigir as distorções havidas e evitar outras.
Indenizações não apagam perdas e sofrimentos, mas, sobretudo, não devem ser um modo de
lhes dar continuidade.
Texto Anterior: Propaganda eleitoral: Natal normatiza uso de espaços públicos Próximo Texto: Eleições 2004 - Campinas: Justiça condena cartilha feita por prefeitura Índice
|