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CAMINHO DAS ÁGUAS
Primeiras indenizações por desapropriações já foram pagas pelo governo federal em dois municípios do Ceará
Fortaleza é maior beneficiária da transposição
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
KAMILA FERNANDES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CARIRI (CE)
Principal peça na defesa da
transposição do rio São Francisco, o argumento do governo de
que o projeto levará água a 12 milhões de pessoas na região mais
atingida pelas secas é baseado em
estimativa da população moradora nas cidades localizadas na área
de influência do projeto em 2025.
Um terço do total refere-se à população que Fortaleza terá em 20
anos, o que faz da capital do Ceará
a principal beneficiária da obra.
Apenas uma parte menor da
conta do governo -cerca de 400
mil pessoas- está fora das cidades, nas margens dos canais ou de
rios que contarão com as águas do
rio em seus leitos, segundo o Ministério da Integração Nacional.
Ao longo dos mais de 700 km de
canais de concreto a serem construídos na caatinga, deverão ser
beneficiadas logo após a conclusão da obra cerca de 70 mil pessoas, afirma ainda o ministério.
Mapeamento feito pelo ministério na área total dos municípios
alcançados pela primeira etapa do
projeto de transposição mostra
que, numa área total de 2 milhões
de hectares, há 45 mil hectares de
terras próprias para a agricultura;
64 mil hectares são considerados
"moderadamente" aptos para a
agricultura e outros 23 mil hectares dependeriam de projetos de
irrigação mais sofisticados e caros. O restante seria reservado à
preservação ambiental.
O ministro Ciro Gomes confirma que o abastecimento das cidades é "a razão de ser" do projeto.
"A transposição não vai acabar
com a seca, nem é a resposta para
toda a população do semi-árido,
mas vai permitir que 12 milhões
de pessoas passem a conviver
com a seca", insiste.
Em pequenos povoados do semi-árido, segundo Ciro, a saída
apontada pelo governo para remediar os efeitos da seca é a construção de cisternas. "A transposição não resolve o problema real
das populações difusas", disse.
O primeiro impacto do projeto
será sentido por cerca de 700 famílias que serão deslocadas de
suas terras para dar passagem à
obra. As primeiras indenizações
foram pagas em dois municípios
ao sul do Ceará: Brejo Santo (a 540
km de Fortaleza) e Mauriti (a 515
km da capital). Os pagamentos,
que começaram no fim do mês
passado, já somam R$ 733 mil.
Essas famílias preferiram indenização em dinheiro à transferência para as vilas de reassentamento a serem construídas pelo Ministério de Integração Nacional.
De acordo com o Siafi (sistema
de acompanhamento de gastos
do governo), R$ 11,6 milhões dos
R$ 43,7 milhões que a lei orçamentária autoriza para despesas
com indenizações em 2005 já
eram objeto de empenho (passo
preliminar aos pagamentos).
Além do Ceará, Pernambuco e
Paraíba têm áreas de desapropriação na primeira etapa do projeto,
onde também serão construídos
canais para o transporte de água
do rio, pelo eixo leste, com captação na cidade de Floresta (PE).
Para o eixo norte, a água será tirada em Cabrobó (PE). Na segunda etapa do projeto, a água será levada ao Rio Grande do Norte.
As primeiras indenizações liberadas foram para os casos em que
não houve reclamações contra a
avaliação feita pelo ministério.
Pendências legais, como a falta
de documentos de propriedade e
imóveis hipotecados a bancos,
atrasam novos pagamentos.
Nenhuma das áreas de Brejo
Santo e Mauriti onde já foram pagas as indenizações sofre com a
falta d'água crônica. Em Mauriti,
as propriedades têm acesso à água
por meio de poços perfurados.
Em Brejo Santo o abastecimento é garantido pelo açude Atalho,
que nunca secou e que também
receberá águas do São Francisco.
"Aqui a gente tem água, mas é
até egoísmo pensar em se opor a
uma obra dessas, porque mais
adiante o povo não tem água de
jeito nenhum", disse José Sávio
Martins Sampaio, 45, dono de
uma fazenda que foi parcialmente
desapropriada em Mauriti.
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