São Paulo, domingo, 23 de outubro de 2005

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Movimentos de esquerda se reúnem por mudanças

EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os 34 meses do governo Luiz Inácio Lula da Silva fizeram movimentos e entidades de esquerda acreditarem que não vale mais a pena apostar na eleição de um presidente para resolver ao menos parte dos problemas sociais.
Por conta disso, com o apoio da Igreja Católica, representantes de sem-terra, sem-teto, quilombolas, índios e estudantes se reúnem nesta semana em Brasília para traçar uma nova estratégia política em busca de mudanças.
A organização do encontro também aponta um desgaste de movimentos e entidades com o sistema partidário, principalmente em relação ao PT -base estrutural e política de inúmeras manifestações antes da chegada de Lula ao Palácio do Planalto, em janeiro de 2003.
Para o evento desta semana, nenhum representante de partido foi convidado, nem mesmo intelectuais filiados ou ligados a alguns deles.
Cerca de 8.000 pessoas são esperadas na "Assembléia Popular: Mutirão por um Novo Brasil", que ocorre entre terça e sexta-feira em um ginásio da cidade. Ao final do encontro será divulgado um documento com prováveis pedidos de mudanças na política econômica e de pressa para as reformas agrária e política no país.
À frente do evento, representantes da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) esperam uma autocrítica em relação à esquerda e uma avaliação sobre as articulações dos partidos para as eleições do ano que vem. Foram convidadas figuras carimbadas como o presidente nacional da CPT (Comissão Pastoral da Terra), dom Tomás Balduíno, e o bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, que ficou conhecido após passar dez dias em greve de fome e conseguir que o governo federal adiasse por tempo indeterminado o início das obras de transposição das águas do rio São Francisco.
"Está na hora de fazer uma avaliação e tomar posicionamentos sobre projetos para o país. [No governo Lula] A gente teve algumas perdas nesse direcionamento por parte da esquerda, uma certa desarticulação. A perda de um projeto nacional", disse irmã Delci Franzen, da coordenação da Pastoral Social da CNBB.

Racha na esquerda
A chamada "desarticulação" citada pela representante da CNBB ficou evidente com o auge da crise política. Em agosto passado, por exemplo, uma ala representada por PSTU, PSOL e Conlutas (Coordenação Nacional de Lutas) fez um ato contra Lula um dia depois de CUT (Central Única dos Trabalhadores), UNE (União Nacional dos Estudantes) e MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) liderarem manifestação a favor do presidente na Esplanada dos Ministérios.
"A esquerda está sem representatividade. Está difícil saber hoje quem representa de fato a esquerda. Na verdade, antes era apenas um partido [PT] que sintetizava toda essa expectativa da esquerda", afirmou Delci Franzen.
Atualmente, depois de ter apoiado Lula nas últimas quatro eleições presidenciais, movimentos, entidades e a chamada ala progressista da Igreja Católica preferem falar em projetos a longo prazo, deixando nomes e partidos fora de questão. Para o MST, por exemplo, o apoio eleitoral na expectativa de mudanças faz parte do passado.
"Era preciso concluir esse ciclo de apostar na expectativa de um presidente sendo eleito, vindo de nosso meio, e que poderia resolver o problema de nosso povo. Vamos partir para outra estratégia, que não é a de apenas eleger presidente", disse João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do movimento. O líder dos sem-terra completou: "Não podemos ficar presos a calendários eleitorais, e sim fazer um programação mais a longo prazo".
Na mesma linha do coordenador nacional do MST está o bispo de Jales (SP), dom Demétrio Valentini, integrante do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República. "Percebemos que isso [apoio de movimentos e entidades a partidos e políticos] é desgastante e não abre horizontes. Então pensamos agora em algo a longo prazo", disse o bispo.


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