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JANIO DE FREITAS
No conjunto da obra
A atual modalidade de concorrência pública deu e dá margem a crimes sem fim
A
S MUDANÇAS na Lei de Licitações, propostas pelo governo,
já aprovadas na Câmara e
agora em curso no Senado, nem de
longe resolvem o problema das fraudes em concorrências públicas, particularmente as de obras cujo custo
atrai grandes empreiteiras. Se o governo Lula tinha também o propósito de reduzir a imoralidade das concorrências, e não só o de agilizá-las
para o seu Programa de Aceleração
do Crescimento, precisaria ter estudado mais o assunto, pesquisar os
truques da corrupção para restringi-los, de fato.
No boletim que publica como matéria paga, o "Janela" já está no 13º
ano e na edição 683, o SindusCon,
sindicato das empresas de construção de São Paulo, cobra dos senadores algumas "correções" no projeto,
"sob pena de o Estado ficar legalmente impedido de contratar os
melhores bens e serviços pelo melhor preço". Não se trata aqui de discutir as intenções do SindusCon, sejam quais forem, mas de fazer algumas observações, forçosamente ligeiras, sobre "correções" que deseja.
Uma delas é a exclusão do exame
de preço como primeira etapa da
concorrência, para depois ser verificada a habilitação técnica da empresa que propôs o melhor preço. Tal ordem, segundo o SindusCon, "abre o
risco de contratação de empresas
sem condições de executar a obra ou
que a abandone pela metade". O argumento não é verdadeiro. O início
da concorrência pela constatação do
melhor preço não exclui, no projeto
que o Senado examina, a verificação
posterior da habilitação técnica. Se
nessa segunda etapa o proponente
do melhor preço não for aprovado, o
segundo melhor preço entra em pauta, para exame de sua habilitação.
A vigente precedência do exame
técnico tem sido importante para a
longeva fraudulência nas licitações.
De saída, pela margem que oferece
para já no edital ser dirigido o resultado. Aqui mesmo revelou-se, na série de concorrências desmascaradas, o truque de um mínimo quesito
intrometido em longo e complexo
edital: para a aprovação técnica, era
necessário ter a experiência de colocação de 20 mil m2 de piso de granito. Quem sabe colocar um metro
quadrado está apto a fazê-lo em
qualquer dimensão. Mas, como foi
mostrado aqui, era o quesito quase
imperceptível que decidia a concorrência: só a construtora Andrade
Gutierrez tinha os 20 mil m2 para
exibir, na construção do novo aeroporto de Belo Horizonte. A revelação levou a anularem aquela concorrência, mas as artimanhas de
editais não se extinguiram ali.
Depois de truques como aquele, o
preço pode ter a altura que tiver,
porque os demais candidatos já estão eliminados. Outro fator contrário à precedência do exame técnico
é facilitar a dúvida, a priori, sobre os
que exponham menos exuberância
técnica, embora suficiente. Mesmo
que seu preço seja melhor e a habilitação atenda ao exigido, a grandiosidade, o prestígio e a força política do
outro concorrente facilitam a deformação do resultado.
Em sentido oposto, o SindusCom
argumenta que, se primeiro for feita
a escolha a empresa com o melhor
preço, "muitos administradores públicos se sentirão constrangidos a
inabilitá-la, caso ela não atenda a todas as demais exigências". Só se esses administradores públicos estiverem dispostos a ver-se denunciados e a enfrentar processos criminais por prevaricação ou improbidade.
Por fim, apesar de haver muito
mais a ser considerado e dito, a evidência é que a atual modalidade deu
e dá margem a crimes sem fim, sob
o nome de concorrência pública.
Quem se impressiona com os feitos
da Gautama não faz idéia, ainda
bem, do quanto são pouco expressivos no conjunto da obra desta e outras empreiteiras. E governos.
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