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Os sombras
"Arapongas" invadem a campanha eleitoral, fingem-se
de repórteres e recolhem munição contra os adversários
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LILIAN CHRISTOFOLETTI
JULIA DUAILIBI
DA REPORTAGEM LOCAL
O incidente envolvendo o presidenciável Ciro Gomes (PPS) e o
cinegrafista do PT, ocorrido anteontem em Fortaleza, trouxe à
tona uma estratégia adotada sem
restrições pelos partidos: a espionagem política.
Enquanto gravava para seu programa eleitoral, Ciro viu entre os
cinegrafistas um que não usava o
crachá de imprensa. Foi a senha
para descobrir que o profissional
estava infiltrado para monitorar
seus movimentos.
"Agora, em todo o lugar que eu
ando, tem um provocador", afirmou o presidenciável após o episódio. Além de Ciro, outros candidatos à eleição de 2002 também
têm motivos para acreditar nisso.
Durante uma semana, a Folha
conversou com partidos, com
marqueteiros e com correligionários sobre arapongagem política.
Oficialmente, todos negam a prática e se colocam como vítimas da
artimanha. Nos bastidores, no entanto, relatam as "medidas de
proteção".
"Sei que esse trabalho não é dos
mais virtuosos, mas estamos em
uma guerra e precisamos nos proteger", afirmou Gustavo, um dos
assessores do PT, destacado para
acompanhar eventos de Geraldo
Alckmin (PSDB) e de Paulo Maluf
(PPB), principais adversários do
candidato petista ao governo de
São Paulo, José Genoino.
O nome fictício, a pedido do assessor petista, atende à regra número um da arapongagem, que é
a de manter o anonimato.
Para isso, Gustavo, municiado
de um bloquinho de anotações e
de um gravador, ao lado de um
fotógrafo -também espião-,
mistura-se aos repórteres destacados para cobrir o evento. Atentos, eles registram tudo: as placas
de carros oficiais usados em campanha, as gafes do adversário e
mesmo detalhes que podem render desconforto ao inimigo.
Foi Gustavo, por exemplo, que
flagrou, no último dia 15, o uso de
carros oficiais em evento político
de Alckmin. Após passar uma hora em frente ao prédio do evento,
o fotógrafo que o acompanhava
fez cerca de 120 fotos. Em seguida,
Gustavo ligou para as redações.
Mas o que faz um espião político se não ocorrer nada de interessante? A ordem, então, é partir para o ataque. Durante entrevistas
coletivas, por exemplo, são instruídos a fazer, de forma insistente, perguntas constrangedoras e
provocativas ao candidato.
"Como o senhor justifica os gastos com o Rodoanel?", perguntou
várias vezes, à queima-roupa, um
espião do PPB a Alckmin na última quarta-feira, após a sabatina
realizada pela Folha. A obra é um
dos temas favoritos de Maluf para
provocar o adversário.
Um dia depois, quando foi a vez
de Maluf ser sabatinado, o mesmo
entrevistador desfilava no local
do evento com um crachá do PPB
dependurado no peito.
"Não fazemos isso", diz o presidente do PPB em São Paulo, Jesse
Ribeiro. "Se algo assim ocorre,
são pessoas que fazem por conta."
Maluf, que está em sua oitava
campanha para um cargo majoritário, tem como praxe não responder a perguntas agressivas de
repórteres desconhecidos. Invariavelmente, pergunta para qual
veículo a pessoa trabalha. "Faço
isso porque sempre colocam alguém para me espionar", diz.
Olhos abertos
Um cuidado comum às assessorias é identificar os repórteres.
Antes de o presidenciável José
Serra (PSDB) chegar a um evento,
uma equipe fica responsável pelo
mapeamento do local e pela identificação dos profissionais.
"A nossa preocupação é com o
que temos de mais valioso: a informação", diz Edmilson Miranda, 51, agente aposentado da Polícia Federal e ex-secretário de Segurança de Alagoas, que colabora
com a campanha de Serra.
Para identificar um agente secreto transvestido de repórter,
prestam atenção ao teor e ao modo como a pergunta é formulada.
Câmeras de vídeo e máquinas fotográficas que destoem dos equipamentos utilizados pela imprensa em geral também colocam a
equipe em alerta.
"Às vezes, aparece um cinegrafista com uma câmera diferente,
aí você repara. Outras vezes, um
falso repórter, com gravador em
mãos, faz perguntas insistentes e
agressivas com a clara finalidade
de embaraçar o candidato", diz o
marqueteiro de Maluf, José Maria
Braga. O conselho, segundo ele, é
ficar de olhos abertos sempre.
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