São Paulo, segunda, 24 de agosto de 1998

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NORDESTE
Em Monsenhor Tabosa, no sertão cearense, mortes de crianças sobem de 53,6 para 150 por 1.000 nascidos vivos
Seca faz mortalidade infantil crescer 180%

Lalo de Almeida/Folha Imagem
Antonia da Silva Moreira segura no colo seu filho Robson, 1, que pesa 7kg, 2kg a menos do que o normal


MARIO VITOR SANTOS
enviado especial a Ceará


A mortalidade infantil em regiões da seca no Nordeste está crescendo neste ano em relação ao ano passado em proporções que chegam a 180%. Esse índice foi registrado na cidade de Monsenhor Tabosa (CE), no sertão dos Inhamuns, onde a mortalidade infantil subiu de 53,6 por 1.000 nascidos vivos no primeiro semestre de 1997 para 150 por 1.000 no mesmo período deste ano.
As informações são de divisões regionais de saúde e de secretarias municipais de saúde, a partir de dados coletados pelo programa de agentes comunitários do Ceará.
Em Crato (550 km ao sul de Fortaleza), o índice de mortalidade subiu, nos primeiros seis meses de 1998, para 49 óbitos de crianças com menos de dois anos por 1.000 nascidas vivas. Em igual período do ano passado, o índice era de 29.
Na região de Crateús (350 km a sudoeste de Fortaleza), o número médio de mortes de crianças até dois anos foi a 77 por 1.000. A taxa é equivalente à estimativa da ONU para Bangladesh ou Nigéria.
No primeiro semestre do ano passado, os doze municípios da área registraram taxa de 56 por 1.000. A taxa do Japão está em torno de 4, nos EUA, 7, e em Cuba, 9, segundo estimativa da ONU.
Nas cinco cidades da região de Tauá (450 km a sudoeste de Fortaleza), a taxa de óbitos infantis cresceu de 64 por 1.000 no primeiro semestre do ano passado para 71 neste ano. A média brasileira é estimada em 42 por 1.000.
A secretária municipal da Saúde do Crato, Marinila Macedo, considera que o aumento do número de mortes é reflexo direto da situação de seca que atinge o Nordeste.
O auge da mortalidade infantil no município, localizado na região do Cariri, considerada privilegiada em termos de precipitação de chuvas e de fontes de água, ocorreu em fevereiro, quando a taxa chegou a 121 por 1.000 nascidos vivos, equivalente a expectativas projetadas pela ONU para países como Ruanda e Moçambique.
Em razão do programa de agentes comunitários, da distribuição de leite e cestas básicas e dos esforços de organização de sua estrutura de saúde, a mortalidade infantil vinha caindo no Crato.
No primeiro semestre de 1996, o índice era de 49 por 1.000. Em 1997, a taxa baixou a 29 por 1.000. O agravamento das condições de vida e emprego neste ano fez o índice retornar ao patamar de dois anos atrás.
De acordo com Marinila Macedo, chega a 40% o número de bebês que morrem em casa ou a caminho do hospital.
As causas das mortes, diz ela, "estão associadas à pobreza, à fome e à baixa qualidade da assistência médica. Foram 46% por diarréia e desnutrição, 26% por infecção respiratória aguda e 14% por prematuridade".
Das mães de crianças que morreram com menos de um ano, 91% são analfabetas ou têm o primeiro grau incompleto.
Rio Grande do Norte
Também em áreas do Rio Grande do Norte a situação se agrava. Em Pau dos Ferros (450 km de Natal), única das 37 cidades do alto oeste daquele Estado que mantém levantamento confiável, a taxa de mortalidade infantil apurada pelos agentes comunitários de saúde elevou-se de 38 por 1.000 no primeiro trimestre de 1997 para 55 em igual período deste ano.
A seca expulsa os moradores da área rural fazendo crescer a população das duas maiores favelas de Pau dos Ferros, a dos Sem-Teto e a Beira Rio, onde quase todas as casas são de taipa, de um cômodo e sem privada.



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