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Ingerência política afetou
Telebrás, diz ex-ministro
PRIVATIZAÇÃO
"Sou favorável à
forma como foi feita
a privatização da
Telebrás e acho que
os serviços vão
melhorar"
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CRISTIANA NEPOMUCENO
da Sucursal de Brasília
A ingerência política nas operadoras do Sistema Telebrás e a intervenção negativa do governo no
caixa das então estatais foram os
fatores que levaram a qualidade
do sistema de telecomunicações
do país a piorar a partir dos anos
80.
A avaliação é do capitão reformado da Marinha Euclides
Quandt de Oliveira, ex-ministro
das Comunicações no governo Ernesto Geisel (1974/1979) e um dos
fundadores da Embratel e da Telebrás. Quandt de Oliveira ajudou a
formular grande parte das regras
de telecomunicações que vigoraram por mais de 20 anos. Participou da criação da Embratel, em
1965, e da Telebrás (1972).
Recentemente, foi convidado a
ocupar uma vaga no conselho de
administração da Tele Centro-Oeste Celular, comprada pela
empresa brasileira Splice no leilão
do Sistema Telebrás, realizado no
último dia 29. "Sou quase um
conselheiro familiar da Splice.
Funciono como a voz da experiência", afirmou. A seguir, trechos
da entrevista concedida à Folha:
Folha - O sistema brasileiro de telecomunicações foi estruturado no
governo militar. Na visão dos militares, qual seria o papel das telecomunicações no país?
Euclides Quandt de Oliveira -
Antes do governo militar o sistema
de telecomunicações era muito
segmentado. Eram cerca de 1.200
operadoras de telefonia, estatais e
privadas, funcionando no país e
não havia regras. As operadoras
foram sendo incorporadas ao Sistema Telebrás depois de 1972,
quando a empresa foi criada.
Folha - O sr. participou da fundação da Telebrás e foi ministro das
Comunicações. O que o senhor
pensava a longo prazo?
Quandt de Oliveira - O que estava se visualizando era a tentativa
de atender a demanda nacional reprimida em dez anos. Em 1972,
quando foi implantada a Telebrás,
a densidade de telefones no Brasil
era mais ou menos um telefone
por cem habitantes.
Mas o objetivo era implantar um
sistema de redes locais que pudesse se interligar com o sistema de
longa distância
interestadual já
implantado
pela Embratel.
No entanto, as
empresas locais quase não
conseguiam se
interligar com
a Embratel
porque não tinham condições técnicas.
Folha - Ao
longo dos
anos, a demanda não foi atendida
e os serviços pioraram. O que houve com o Sistema Telebrás?
Quandt de Oliveira - A quebra
do crescimento da Telebrás. A empresa cresceu ao longo de 20 anos
quase sem receber dinheiro do governo. Ela funcionava com base na
receita das operadoras, que eram
fiscalizadas pela Telebrás.
A Constituição de 1967 determinava que as estatais deveriam funcionar como empresas privadas e
elas funcionavam. Só que o governo começou a segurar o crescimento da Telebrás. Ela tinha dinheiro sobrando e o governo começou a fazer com que esses recursos encobrissem faltas que
existiam em outras estatais.
Folha - Quando isso começou?
Quandt de Oliveira - A partir
de 1982. O governo começou a dizer que as empresas não poderiam
crescer porque teriam de aplicar os
lucros obtidos em bônus federais e
Letras do Tesouro. Para que sobrasse dinheiro, o governo impediu que elas reinvestissem no sistema. De 1972 a 1982 as empresas
cresceram, em média, 20% a 40%
ao ano. Se a partir de 1982 elas crescessem 10% ao ano, hoje você não
teria mais ninguém reclamando
por telefone. Mas não deixaram. E
a partir de
1985, as coisas
pioraram.
Folha - Por
quê?
Quandt de
Oliveira -
Porque começaram a aparecer pessoas por
indicação política ocupando
posições nas
empresas. Essas pessoas não
tinham a mesma competência,
mas como o sistema estava razoavelmente organizado ele continuou a funcionar. Isso se fez sentir
mais na Telerj, que hoje é a empresa que tem os piores serviços.
Folha - O sr. está dizendo que foi
o Estado, depois da redemocratização, que deteriorou um sistema
que funcionava bem?
Quandt de Oliveira - Sim, foram o Executivo e o Legislativo.
Mas isso não teve relação com a redemocratização. Foram apenas
pessoas mal escolhidas.
Folha - O sr. é favorável à privatização?
Quandt de Oliveira - Há quatro
anos eu era contrário. Eu sempre
acreditei que não se deve privatizar
empresas ou estatizá-las por ideologia. Você tem de privatizar ou estatizar por necessidade.
Folha - O sr. mudou de idéia?
Quandt de Oliveira - Sim, porque a Lei de Licitações (8.666) acabou com tudo. Por causa dela o
serviço público passou a comprar
o mais barato, independentemente da qualidade. Qualquer licitação
passou a demorar um ano para ser
concluída. Essa lei foi feita para
moralizar o serviço, mas não é assim que se moraliza. Moraliza-se
botando na cadeia quem rouba.
Folha - Então o sr. é favorável à
privatização da Telebrás da maneira como ela foi feita?
Quandt de Oliveira - Sou favorável à forma como foi feita e acho
que os serviços vão melhorar.
Quando essa privatização começou a ser planejada, o então ministro das Comunicações, Sérgio
Motta, me pediu sugestões. Durante dois anos eu mandei, mas é
claro que você sempre acha que
poderia ter feito algo diferente.
Folha - O que o sr. faria diferente?
Quandt de Oliveira - Eu tentaria manter a pesquisa e o desenvolvimento das tecnologias de comunicações vinculados à alguma empresa. Poderia ser, por exemplo, a
Telesp, que é a maior operadora.
Folha - O sr. aposta no modelo de
regulação criado pela Anatel? Ela
poderá fiscalizar bem o setor?
Quandt de Oliveira - É possível.
Mas há uma área delicada que é a
radiodifusão. Nesse caso, não é a
palavra que está sendo transmitida, é como ela está sendo transmitida. Você tem de ter uma rede para verificar isso. Não é censura para saber o que os outros estão falando, mas fiscalizar se a frequência está sendo usada corretamente.
Raio X
Nome: Euclides Quandt de Oliveira
Idade: 78 anos
Naturalidade: Rio de Janeiro
Cargos que ocupou: é
capitão-de-mar-e-guerra reformado da
Marinha. Foi presidente do Conselho
Nacional de Telecomunicações
(65/67), participou da criação da
Embratel (65), foi diretor de
Telecomunicações da Siemens do
Brasil (69/72), presidente da Telebrás
(72/74) e ministro das Comunicações
do governo Ernesto Geisel (74/79).
Cargo atual: Membro do conselho
da Tele Centro-Oeste Celular.
Estado civil: casado com Maria de
Lourdes de Góis Monteiro de Oliveira.
Tem seis filhos e 11 netos.
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