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JANIO DE FREITAS
O Grande Medo
Nem o "sim" nem o "não"
venceram o referendo, e
quem confiar no resultado aritmético das urnas logo logo perceberá a força do seu engano. O
vencedor do referendo foi o
Grande Medo. Esse Medo latente, insidioso, que a todos nos faz
tão temerosos da arma que o
alheio possa ter, quanto temerosos de não ter defesa alguma na
aflição. Esse Medo que, antes do
ladrão presumido, nos rouba a
segurança, e nos faz ver calçadas como campos minados, e
em nossos carros nos faz sentir-nos como em trincheiras expostas ao ataque a qualquer momento, em qualquer lugar.
Os dois lados do referendo só
foram dois na aparência. São a
mesma coisa, dita de duas formas. Nas duas últimas semanas,
a ausência de barreira se mostrou com clareza na rapidez
com que tanta gente passou, do
"sim" ou da dúvida, para o
"não". A dúvida provava que as
duas hipóteses atendiam ao
mesmo sentimento. A mudança,
portanto, não serviu a outro senhor, que era único.
Se um lado ou outro aparenta
vantagem na contagem das urnas, não faz diferença. O que
importa, do mesmo modo para
quem votou "sim" e quem votou
"não", é extinguir o Grande Medo. E nem um lado nem outro
poderia fazê-lo. Todos sabemos
muito bem porquê.
Bem, nem todos. "The New
York Times", por exemplo, diz
ao mundo que a criminalidade
no Brasil se deve a que "os brasileiros são muito propensos a atirar uns nos outros". O jornal e
seu correspondente no Brasil, o
misto de jornalista e humorista
Larry Rohter, têm toda a autoridade moral e histórica para tratar da mortandade por tiros.
Primeiro, porque falam pelo
país dos "serial killers". Além
disso, porque representam, na
matéria, a experiência das mortandades que os EUA têm praticado em outros países, com variedade e insistência como nenhum outro povo na história -
sempre apoiado pelo "NYT",
embora com um ou outro quase
arrependimento. E, afinal de
contas, trata-se do maior fabricante e exportador de armas.
Que o "Guardian" e o "Independent" fossem na linha do "NYT"
é apenas a força da fatalidade
inglesa, de seguir na rabeira dos
guerreiros americanos para
lembrar-se dos seus tempos de
opressora mundial.
Quem votou "sim" e quem votou "não" deu votos igualmente
bons. O Grande Medo, em qualquer caso, continua impávido e
colosso como se pensou que o
país fosse.
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