São Paulo, sábado, 24 de novembro de 2007

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Câmara ignora acordo de governo e índios

Deputados discutem projeto que regulamenta exploração mineral em reservas e abandonam proposta de novo estatuto

Eduardo Valverde (PT-RO) diz que "tramitação do PL vai dar mais visibilidade para falarmos de outras questões, como o estatuto" p ANA PAULA BONI
DA REDAÇÃO

A Câmara dos Deputados ignorou acordo feito entre o governo Lula e índios e retomou no início deste mês a discussão do projeto de lei que regulamenta a exploração de minérios em terras indígenas.
O acordo havia sido feito no âmbito da CNPI (Comissão Nacional de Política Indigenista), que é composta por 70 integrantes, entre eles representantes de 12 ministérios, 39 índios e entidades indigenistas.
Na primeira reunião da CNPI, em junho deste ano, ficou decidido que a discussão da mineração se daria de uma forma mais ampla, dentro do projeto de lei que cria o Estatuto das Sociedades Indígenas.
A despeito dessa decisão, no último dia 7 a Câmara instalou comissão especial, criada em maio, para debater apenas a exploração mineral. Entre seus 18 membros, 13 são deputados de partidos que compõem a base aliada ao governo.
"Em vez de se criar uma comissão especial para discutir o PL do estatuto, criou-se uma somente para discutir a questão da mineração, obedecendo aos interesses das empresas mineradoras. Esse é o absurdo da questão", afirma Saulo Ferreira Feitosa, representante do Cimi (Conselho Indigenista Missionário) na CNPI.
As entidades indigenistas criticam a falta de pressão do Planalto sobre a bancada e argumentam que, depois que o projeto de lei da mineração for aprovado, o PL do novo estatuto, que tramita há 16 anos no Congresso, será esquecido.
"A avaliação é que, se a exploração for tratada isoladamente, a discussão em torno do novo estatuto será esvaziada", afirma Ricardo Verdum, assessor de políticas indigenistas do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), que também integra a CNPI.
O relator da comissão especial da Câmara, deputado Eduardo Valverde (PT-RO), discorda do possível esvaziamento. "A tramitação do PL da exploração vai dar mais visibilidade para falarmos de outras questões, como o estatuto", diz ele, que é o coordenador da frente parlamentar em defesa dos povos indígenas.
Valverde justifica ainda que a tramitação do projeto de lei do novo estatuto só está paralisada na Câmara desde 1994 porque tem como um dos capítulos a regulamentação da exploração mineral. "Se destravamos isso, enfrentando logo o que tem de enfrentar, será mais fácil encarar o estatuto."
Édio Lopes (PMDB-RR), presidente da comissão especial, concorda com Valverde e completa que a mineração deve ser mesmo tratada em uma lei separada. "Há quantos anos se discute o estatuto? O estatuto é uma coisa, a exploração mineral é outra, independentemente de ser em terra indígena", afirma o deputado, de um dos Estados onde o interesse minerário é maior.

O estatuto
O principal ponto elencado por entidades indigenistas em defesa do novo estatuto é a autodeterminação dos povos indígenas, que não está contemplada no Estatuto do Índio, de 1973. Hoje, eles estão sob a tutela da Funai (Fundação Nacional do Índio). Com a nova legislação, os povos terão autonomia para tomar decisões sem o intermédio do governo, explica Ricardo Verdum.
Além disso, o projeto de lei prevê uma série de outros direitos dos índios, como demarcação da terra, educação, saúde, direitos autorais etc.
"Os índios poderão definir as políticas públicas para eles mesmos. Por isso, votar a mineração sem regulamentar os direitos dos índios é uma coisa extremamente questionável", afirma Rogério Duarte do Pateo, antropólogo do ISA (Instituto Socioambiental).


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