São Paulo, segunda, 25 de janeiro de 1999

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COMBATE À SECA
Metade do dinheiro previsto -US$ 600 milhões- terá de ser gasta com produtos e serviços espanhóis
Projeto sigiloso prevê verba da Espanha


LUCIO VAZ
da Sucursal de Brasília

O governo brasileiro prepara sigilosamente um megaprojeto de combate aos efeitos da seca, avaliado inicialmente em US$ 600 milhões, com recursos da Espanha. Metade dessa verba terá de ser gasta com produtos e serviços de empresas espanholas.
O total do programa poderá chegar a US$ 3 bilhões, com a inclusão do projeto de transposição das águas do rio São Francisco, avaliado em US$ 1,5 bilhão. Os espanhóis já manifestaram interesse no projeto.
Os espanhóis queriam inicialmente que 85% dos recursos fossem gastos na Espanha, mas o governo brasileiro conseguiu reduzir esse percentual para 50%.
A Polícia Federal fechou um contrato semelhante com a França, para compra de equipamentos, com a obrigação de gastar naquele país 100% dos recursos financiados.
O dinheiro será liberado pela estatal espanhola Expansion Exterior, uma empresa de desenvolvimento que empresta dinheiro a outros países para estimular a compra de produtos, tecnologia e serviços espanhóis.
Empresas espanholas poderão formar "joint ventures" com empresas brasileiras para produzir no Brasil equipamentos necessários ao projeto. O objetivo será a redução do custo de transporte dos produtos.
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Núcleos de produção
O projeto de combate à seca, preparado pela Secretaria de Políticas Regionais, não prevê obras de irrigação, mas sim a implantação de núcleos de produção agrícola em nove Estados do Nordeste.
O projeto vai beneficiar também o nordeste de Goiás, Estado do ministro Ovídio de Ângelis, responsável pela elaboração do programa no âmbito da Câmara de Políticas Regionais. Essa região não está incluída no Polígono das Secas.
Cada núcleo reunirá produtores em cooperativas e se dedicará a um tipo específico de produto, como algodão, fruticultura, hortifrutigranjeiros, entre outros. Serão excluídas culturas de produção mais cara, como o arroz irrigado, por exemplo.
O governo cederá recursos para a implantação do projeto (terra, sementes, insumos), armazenamento, transporte e comercialização. Também implantará infra-estrutura em cada núcleo, como serviços de saúde, educação, segurança, telefone e comércio.
O governo vai procurar parcerias com a iniciativa privada para determinados projetos. Uma empresa privada poderá instalar, por exemplo, uma fábrica de fios ou mesmo uma malharia nas proximidades de um núcleo de produção de algodão.
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Histórico
O primeiro contato entre os dois governos para tratar do assunto ocorreu quando o presidente Fernando Henrique Cardoso esteve na Espanha em abril no ano passado. FHC pediu que o ministro Ovídio de Ângelis (Políticas Regionais) tocasse o projeto.
O ministro esteve na Espanha no final do ano passado para conhecer projetos do governo espanhol na região semi-árida daquele país. Procurado pela Folha na semana passada, o ministro não quis falar sobre detalhes técnicos do projeto.
De Ângelis disse que só poderá dar informações sobre o funcionamento do programa após a sua aprovação pelo Conselho de Políticas Regionais, que tem o ministro Clóvis Carvalho (Casa Civil) como presidente. O ministro de Políticas Regionais é o secretário-executivo do conselho.
Após aprovado pelo conselho, o projeto passará por uma fase de detalhamento, quando serão ouvidos governos estaduais, universidades, ONGs e órgãos do governo federal, como a Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste). Essa fase vai ter uma duração de 90 dias.
Fechado o projeto, os dois governos irão preparar o contrato de financiamento. Como se trata de empréstimo externo, o projeto terá de ser aprovado pelo Senado. Serão gastos mais 90 dias. A implantação do projeto deve começar, portanto, no segundo semestre.
² Outro lado
De Ângelis afirmou que considera natural a cláusula contratual que exige a compra de produtos espanhóis (50% do total). "O governo concede o financiamento justamente para estimular a compra de produtos no seu país. Mas os juros compensam: são de apenas 3,75% ao ano", disse.
O ministro disse que não haverá perigo de compras superfaturadas porque o contrato vai estabelecer os preços máximos de cada produto, com base no mercado internacional. Além disso, disse, o governo brasileiro vai fazer licitações entre empresas espanholas.
De Ângelis afirmou que a região nordeste de Goiás foi incluída no projeto porque apresenta as mesmas características geoeconômicas do Nordeste brasileiro.



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