São Paulo, domingo, 25 de fevereiro de 2007

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No recesso, deputados usam verba de R$ 6 mi da Câmara

Dinheiro é soma de indenizações por gastos nos Estados de 488 congressistas nas férias

Parlamentares pediram,em média, ressarcimentode R$ 12 mil em janeiro; gasto foi ainda maior entre os que não foram reeleitos

RANIER BRAGON
LETÍCIA SANDER

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Câmara reembolsou 488 deputados federais num total de R$ 5,9 milhões por supostos gastos de trabalho durante janeiro, mês de recesso do Congresso Nacional. Mais de duas centenas de deputados que encerraram o mandato naquele mês tiveram os maiores reembolsos, R$ 13 mil em média para cada um, o que representa 87% da verba prevista.
O Congresso Nacional entrou em recesso em 23 de dezembro e só retomou a atividade no último dia 1º. Apesar disso, todos os 513 deputados continuaram tendo direito à chamada "verba indenizatória", que destina R$ 15 mil mensais para gastos com consultorias, pagamento de aluguel de escritórios, combustível, alimentação, hospedagem e "divulgação do mandato", entre outros.
Apenas 25 abriram mão do benefício no mês de janeiro.
Ao apurar a justificativa dos deputados para os gastos no mês de férias, a Folha se deparou com casos controversos como o do líder da bancada do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), o que mais gastou no mês, R$ 25,5 mil (o valor que excede R$ 15 mil é reembolsado nos meses seguintes).
O peemedebista afirmou ter usado parte do dinheiro, reservado para divulgação do mandato parlamentar, para pagar o jornal "Tribuna do Norte", de Natal, pela publicação de notícias sobre suas atividades em Brasília. Alves, que é diretor-presidente do jornal, disse não considerar indevida a "compra de reportagens" nem o direcionamento de dinheiro público ao seu jornal.
"Não tenho rendimento do jornal, não recebo nada do jornal. Quem dirige são os diretores, não tenho nenhuma retirada do jornal." Mas quem faz as retiradas, a família? "É. A rigor, jornal lucro não dá. Só a Folha. [Na Tribuna] é uma reclamação, uma choradeira danada."
Em outro caso, João Caldas (PR-AL), que não se reelegeu depois de ser acusado de envolvimento com o escândalo dos sanguessugas, admite o uso de R$ 15 mil em janeiro, o limite da verba, para que os eleitores "não se esqueçam" dele. Tudo dentro da rubrica "divulgação do mandato parlamentar". "Quem não se comunica se trumbica", avalia. "Político tem que interagir com a sociedade. E só interage se comunicar", disse, concluindo: "A Câmara e o Senado, se fossem duas empresas, seriam falidas. Não há racionalidade no Parlamento, tudo é exagerado".
Outro exemplo questionável reúne os suplentes que assumiram apenas nas férias de janeiro. Todos eles foram reembolsados por supostos gastos de trabalho, entre eles, José Rajão (PSDB-DF), que afirmou ter gasto R$ 14,5 mil com "consultorias, assessorias, pesquisas e trabalhos técnicos". "Se eu tenho que prestar contas, é para a Câmara, e não a vocês", disse.
O total de R$ 5,9 milhões reservado pela Câmara para reembolso dos 488 deputados por trabalhos em janeiro dá uma média de R$ 12 mil para cada parlamentar. Entre os 241 deputados não-reeleitos, a média sobe para R$ 13 mil.
Já 71 deputados que foram acusados de participação ou no esquema dos sanguessugas ou no esquema do mensalão, o reembolso médio foi ainda maior, de R$ 13,5 mil.

Defesa
O deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), que chefia a área administrativa da Câmara, defendeu o uso da verba em janeiro afirmando que os gastos de manutenção dos escritórios estaduais dos deputados se mantêm naquele mês e que, para os não-reeleitos, o custo de desativação pode ser até superior.
Serraglio, que não apresentou até agora nenhum valor a ser reembolsado por gastos em janeiro, admite, entretanto, que "pode haver malandragem". "Cada caso é um caso, pode ter malandragem, como pode não ter. Vi um cara, que tenho o maior respeito por ele, com um valor alto lá atrás. Disse "Meu Deus, esse cara com esse valor, muito acima". E eu tenho convicção de que ele não fez bobagem", afirmou.
A Câmara não permite o acesso às prestações de contas dos deputados relativa à "verba indenizatória". Serraglio diz ser favorável à abertura da consulta, mas ressalva que essa tem que ser uma decisão da Mesa Diretora, composta por mais seis colegas, entre eles o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP).


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