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São Paulo, terça-feira, 25 de março de 2003

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DESGASTE PETISTA

Críticas de presidente da Câmara criam crise no comando de Lula

João Paulo mira em líderes do PT, mas acerta em Dirceu

PLÍNIO FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL

O ataque do presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha, à articulação política do governo Luiz Inácio Lula da Silva foi precedido de um telefonema àquele que, em tese, seria o alvo principal, o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu. A intenção, segundo manifestou a assessores, era criticar os líderes do governo no Congresso, numa disputa por espaço no comando político.
Na sexta-feira, João Paulo afirmou: "Estamos batendo cabeça. O governo está um pouco desorientado na condução política. Precisa acertar o passo".
A declaração parecia ser uma trombada direta com Dirceu, o principal articulador da candidatura de João Paulo à Presidência na Câmara. Mas ela foi combinada na quarta-feira à noite, em telefonema de João Paulo ao ministro-chefe da Casa Civil.
Naquele dia, o PFL, com uma bancada de 77 deputados, havia conseguido obstruir a pauta de votação da Câmara por quatro horas. Obstrução é uma estratégia não prevista nos regimentos do Congresso em que parlamentares de um partido permanecem em plenário, mas não são contados como quórum para a sessão. Assim, a pauta fica obstruída enquanto não houver o quórum parlamentar mínimo para votação (257 dos 513 deputados).
Na semana anterior, PFL e PSDB já tinham usado a tática da obstrução e conseguido adiar a votação de uma medida provisória que trancava a pauta.
Cobrado pelo ministro da Casa Civil, João Paulo queixou-se, dizendo que Dirceu precisava "organizar sua tropa", no caso, Aldo Rebelo (PC do B-SP), líder do governo na Câmara, e Nelson Pellegrino (PT-BA), líder do partido.
Como no Senado, o PFL também havia conseguido obstruir a pauta, a crítica foi estendida ao líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP), e ao líder da bancada, Tião Viana (PT-AC).
João Paulo disse a Dirceu que externaria suas críticas à condução política dos líderes, como um alerta. Avaliava que o governo Lula precisa dar sinais de força no Congresso, em especial para assegurar as reformas tributária e previdenciária, consideradas cruciais para a política econômica.
O plano é colocar em votação as duas reformas até julho e dedicar o segundo semestre às leis regulamentadoras necessárias.
Dirceu aceitou a argumentação, mas não imaginava que seria tomado como alvo principal das críticas. Na quinta-feira, reuniu os líderes na Câmara e no Senado na tentativa de rever as linhas de ação no Congresso, reunião que se repetiu na noite de ontem.
Na sexta-feira, ao saber das declarações de João Paulo em São Paulo, o secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, saiu em defesa de Dirceu. "A condução política do governo está a cargo do ministro-chefe da Casa Civil, que já obteve várias vitórias importantes, como a eleição das Mesas da Câmara e do Senado."
À resposta pública de Dulci, apontando algo próximo a ingratidão na frase de João Paulo, sucedeu-se um telefonema ao presidente da Câmara na noite de sexta-feira. Depois de três horas de tentativa de contato, Dulci localizou João Paulo no interior do Estado. Atribuiu suas declarações ao relato -supostamente carregado no tom- que os jornalistas haviam feito das frases do deputado.
Ficou o dito pelo não dito, mas os alvos de João Paulo eram os líderes do governo no Congresso. Certo de que não tem como entrar numa disputa política com Dirceu -desde a campanha eleitoral o nome político mais forte de Lula-, João Paulo tenta se fortalecer e ocupar espaços. Restringir a ação de Rebello e Pellegrino na Câmara, é uma forma de tal.
Petistas reagiram acusando a "falta de habilidade" de João Paulo na presidência da Casa como um dos motivos para as dificuldades encontradas no plenário.
Culpam o deputado pelas dificuldades na tentativa de votação da proposta de emenda constitucional que abre espaço para a autonomia do Banco Central.
Enfrentando críticas dentro do próprio PT, a emenda foi colocada por João Paulo na pauta de votações da semana passada, mesmo sem a liderança do governo na Câmara ter conseguido um acordo que desse a garantia suficiente da obtenção dos 308 votos necessários à aprovação.
A base oficial do governo na Câmara é de 253 deputados. Com a adesão do PMDB, o governo conseguiria a base formal de 323 deputados, uma margem apertada para a votação de emendas constitucionais em razão de ausências e defecções.


Colaborou RANIER BRAGON, da Sucursal de Brasília


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