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Falta de rigor favorece impunidade
da Reportagem Local
"A noção de crime e castigo funciona bem se for tornada pública",
diz o advogado Ary Oswaldo Mattos Filho, ex-presidente da CVM e
cujo escritório já defendeu vários
empresários que apresentaram recursos ao "conselhinho".
Mattos Filho cita como exemplo
um tribunal que funciona na Bolsa
de Londres. "Uma simples advertência contra um executivo financeiro publicada no 'Financial Times' pode levá-lo a mudar de ofício, tal a repulsa da comunidade",
diz o advogado.
No Brasil, a falta de uma sanção
social -a rejeição pela sociedade
de práticas condenáveis ainda na
esfera administrativa- é terreno
fértil para que prospere a impunidade dos crimes financeiros.
Os envolvidos em irregularidades administrativas costumam
minimizar as infrações com três
argumentos: a) foram punidos por
práticas "normais" e "corriqueiras" adotadas por todo o mercado
à época; b) as irregularidades são
irrelevantes, tanto que as multas
aplicadas são pequenas; c) o mercado ousa, porque está preso a
uma legislação superada.
Como as penalidades são julgadas anos depois da infração, não
contribuem para inibir os crimes.
Mesma trilha
"Nós pagamos o preço de ser
criativos, pois a regulamentação
do BC não se atualiza", diz Antônio Carlos Castrucci, presidente
da ABBC (a entidade reúne bancos
médios e bancos estrangeiros).
Castrucci -que também já foi
multado por atrasar balancetes-
sucedeu na ABBC Antonio Hermann Dias Menezes de Azevedo.
Quando era vice-presidente do
Banco Itamarati, que pertencia ao
ex-rei da soja Olacyr de Moraes,
Hermann foi multado por descumprir normas do BC, maquiar
balanços e fechar contratos irregulares com empresas não-financeiras. Eram os chamados "contratos de gaveta", acordos paralelos
prevendo remuneração indexada
ao dólar, o que era proibido.
Hermann perdeu o recurso no
"conselhinho" e pagou a multa.
Uma operação do Banco Itamarati com empresa controlada -a
Itamarati Comercial Importadora
e Exportadora Ltda.- motivou
denúncia do Ministério Público
Federal, no ano passado.
A operação não tinha autorização do BC e podia representar uma
transferência de crédito de qualidade duvidosa, aparentemente para melhorar o balanço do banco.
Hermann diz que obteve "habeas
corpus", interrompendo a ação.
Ex-diretor do Banespa, Hermann também conseguiu "habeas corpus", livrando-se de processos nos casos de empréstimos
do banco oficial sob investigação.
Piloto de carros de corrida, Hermann é amante da velocidade nas
pistas e acha normal a ultrapassagem das regras pelo mercado. "A
fiscalização é perversa, não permite inovações, e o mercado sempre
anda um pouco na frente do regulador das normas", costuma dizer.
Balanços falsos
Hermann não está faltando com
a verdade. Pelas mesmas práticas
que eram comuns com a inflação
elevada, o conselho rejeitou recurso de Antônio Carlos Lemgruber,
ex-presidente do BC e ex-membro
do conselho pela Febraban.
Lemgruber e José Júlio Senna,
outro diretor do BC, foram multados (em R$ 813, cada) quando
ocuparam cargos de diretoria no
Banco Boavista, por operações
com ajustes informais diferentes
dos permitidos pela legislação.
Executivos que já estiveram no
governo, eles fizeram na iniciativa
privada o que é proibido pelo órgão regulador ao qual serviram.
Por causa do mesmo artifício,
além da apresentação de balanços
maquiados, o "conselhinho" decidiu multar o Banco de Investimento Planibanc, ou seja, a pessoa
jurídica, mas absolveu os administradores da época, entre os quais o
atual presidente do BNDES, Luiz
Carlos Mendonça de Barros.
"No exterior, balanço maquiado provoca punição séria", diz o
advogado Luis Octavio da Motta
Veiga, ex-presidente da CVM.
No período analisado pela Folha, houve apenas uma punição a
empresa que audita balanços, a
Bianchessi (nos anos 80, fato raro,
a CVM também advertiu a Price
Waterhouse, processo arquivado
depois pelo conselho).
(FV)
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