|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
VIAGEM AO ORIENTE
Para dissidente chinês, ausência de comentários sobre abusos na China é uma "vergonha"
Silêncio de Lula decepciona ONGs de direitos humanos
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
O fato de o presidente do Brasil,
Luiz Inácio Lula da Silva, não ter
nem mencionado as violações aos
direitos humanos existentes na
China durante sua visita ao país é
uma "grande decepção", de acordo com organizações de defesa
dos direitos humanos e um dissidente chinês ouvidos pela Folha.
"A ausência de um comentário
de Lula sobre os abusos ocorridos
na China é uma vergonha, sobretudo quando sabemos o quanto
sofrem os trabalhadores chineses
por conta do desrespeito a seus
direitos e que o presidente brasileiro foi um líder sindical atuante", afirmou Xu Shuiliang, 59, um
dos mais conhecidos dissidentes
chineses que vivem nos EUA.
"Ademais, há outros problemas
muito graves na China, como prisões sem julgamento, tortura e
perseguição política, étnica ou religiosa", acrescentou Xu, que é
membro do Conselho de Coordenação do Free China Movement,
uma das maiores iniciativas internacionais pró-democracia na
China. Ele passou mais de 12 anos
em prisões chinesas por conta de
sua ligação com a luta pela liberdade de expressão no país.
Segundo Sara Davis, pesquisadora da Human Rights Watch, o
fato de o chanceler Celso Amorim
afirmar que "Lula está consciente
de que os direitos humanos fazem
parte da Constituição chinesa"
demonstra que o Brasil "dá importância à retórica das autoridades chinesas, não a seus atos".
"Essa declaração nos desaponta. Afinal, infelizmente, a Constituição chinesa é um documento
vazio em muitos aspectos, visto
que ninguém pode ser processado por violar os direitos que constam dessa Carta. A verdade é que
a China não tenciona implementar os direitos constitucionais relacionados à defesa dos direitos
humanos", apontou Davis.
Vale lembrar que, numa visita
oficial realizada em 1995, o então
presidente do Brasil, Fernando
Henrique Cardoso, também deixou de criticar a situação dos direitos humanos na China. À época, a omissão foi alvo de duras críticas de organizações de defesa
dos direitos humanos.
Segundo a Anistia Internacional, "sérias violações aos direitos
humanos continuam a existir na
China, e, em alguns aspectos, a situação se deteriorou". "Dezenas
de milhares de pessoas continuam a ser detidas por exercer
pacificamente seu direito à liberdade de expressão, de associação
ou de credo. E a pena de morte
continua a ser aplicada na China",
indicou a assessoria de imprensa
da Anistia Internacional.
Davis disse entender por que
muitos Estados deixam de censurar a China. "Em alguns casos, Pequim acaba ameaçando impor
duras sanções comerciais ou deixar de investir em determinados
países. Não podemos esquecer
que, por conta de seu poder econômico e de seu imenso mercado,
a China se tornou uma parceira
comercial muito atraente."
Mesmo assim, a União Européia e os EUA, que são parceiros
comerciais da China bem mais
importantes do que o Brasil, não
deixam de criticar a situação dos
direitos humanos no país e apoiaram uma resolução que condenava a China na Comissão dos Direitos Humanos da ONU. Em
abril, o Brasil ajudou a bloquear
essa resolução, em Genebra.
De acordo com Amorim, Lula
mencionou o fato ao presidente
chinês, Hu Jintao. No comunicado conjunto assinado ontem por
ambos, a China agradeceu ao Brasil o voto favorável em Genebra.
Pequim afirma que a situação
dos direitos humanos e a da proteção aos trabalhadores têm melhorado nos últimos anos no país.
Tibete
O Brasil afirmou ser favorável
ao princípio de uma só China e
contrário à independência de Taiwan e do Tibete. Nesse aspecto, a
posição do atual governo brasileiro não difere da de anteriores.
No que tange ao Tibete, todavia,
a declaração brasileira foi "decepcionante", segundo Brian Given,
presidente do Comitê Canadá-Tibete de Ottawa, organização não-governamental que faz parte de
uma rede internacional de defesa
dos direitos dos tibetanos.
"O que diria Lula se um líder internacional afirmasse ser contrário à independência do Brasil? Ele
demonstrou desconhecimento da
causa tibetana. Afinal, o dalai-lama [líder espiritual e político
-no exílio- do Tibete] já disse
que não luta pela independência
do Tibete, mas por sua autonomia
interna", avaliou Given.
Texto Anterior: Evento sobre pobreza exclui Fome Zero Próximo Texto: Frase Índice
|