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MERCADO
Reuniões na véspera de julgamentos geram 'vazamentos'; presidente da entidade diz que não aceita pressões
Lobbies influenciam atuação de conselho
da Reportagem Local
Como o Conselho de Recursos
do Sistema Financeiro Nacional é
um órgão paritário, a participação
de representantes do mercado
abre espaço para os lobbies.
Reuniões na véspera dos julgamentos costumam gerar "vazamentos", quando advogados podem ser orientados sobre a melhor
condução da defesa oral.
Ocorre o que os advogados chamam de "embargos auriculares"
(tentativas de convencimento dos
pares antes da votação).
"O conselho é uma instituição
muito séria. Se houve exageros, foi
mais com o rigor do que com a
condescendência", diz Salo Seibel,
ex-coordenador do PNBE (Pensamento Nacional das Bases Empresariais) e ex-representante da
Abrasca (reúne as companhias
abertas) no conselho.
"Nos casos mais sérios, não
lembro de ter havido diferença de
julgamento entre os representantes da iniciativa privada e os do governo", diz Seibel. "Nos casos de
'troca de chumbo' (empréstimos
de bancos a empresas ligadas) o
conceito era muito claro, os envolvidos sempre eram condenados."
Freio oficial
O balanço dos casos apurados
sugere que o conselho consegue
frear pressões e em várias decisões
se revelou intransigente em relação ao lobby privado.
"Eu não estaria aqui se fosse para aceitar pressões", costuma dizer
Clair Ienitte Gobbo, 61, presidente
do conselho, capixaba, ex-funcionário do Banco do Brasil e ex-contador-geral do Banco Central.
Auditor, formado em administração e direito, Gobbo não gosta
de fotos e não aceita dar entrevistas. Ele concordou em receber a
Folha, junto com o ex-secretário-executivo, Manuel Teixeira, o
novo secretário, Marcos Martins
de Souza, e o procurador da Fazenda, Luiz Alfredo Paulin (conhecido por sua atuação incisiva
durante os julgamentos).
O "conselhinho" já puniu instituições como o Citibank (por não
atendimento a determinação do
BC), advertiu o Banco de Tókio e
multou o Banco Nederlandsche.
O conselho multou, entre outros, o ABC-Roma, o Banco Santista, e o Banco Sudameris (por
empréstimos vedados). Por operações "casadas", puniu instituições
como o Garantia e o Bancesa.
O conselhinho manteve multa ao
ex-presidente da Febraban Leo
Wallace Cochrane Júnior (R$
813,40), sob a acusação de maquiagem nos balanços do Noroeste.
O banco não registrou créditos
em liquidação (ou seja, tinha contas a receber de clientes que não
honraram empréstimos e deixou
de fazer provisão, uma reserva que
reduziria o lucro). O banco ainda
vendeu aquele "crédito podre" a
uma empresa ligada.
Explicação do banco: num programa de desmobilização, o Noroeste vendeu imóveis de valor
contábil baixo. Se vendesse pelo
valor de mercado, pagaria um Imposto de Renda elevado.
Como a financeira do grupo tinha prejuízo fiscal, o banco vendeu os imóveis a essa coligada pelo
valor contábil. A financeira revendeu ao mercado pelo valor real.
Com isso, criou um lucro para a
financeira e reduziu a carga tributária do banco. Para pegar o lucro
de volta, o Noroeste fez uma "cessão de créditos" à financeira (venda de créditos). Para o BC, a financeira deixou de registrar o lucro.
Mercado de capitais
O ex-presidente da Bovespa Fernando Nabuco sofreu punição
grave porque sua corretora, a Baluarte, registrou lastro insuficiente, apresentou contabilidade lacunosa e fez adiantamento a diretores, o que é proibido por lei.
Dois ex-vice-presidentes da Bolsa foram duramente atingidos: Pedro Luiz de Toledo Piza (inabilitado pelo BC, teve a pena reduzida
para multa) e Ricardo Thompson
(inabilitado por dois anos).
Por irregularidades menores, o
"conselhinho" manteve punições
contra o atual presidente da Bovespa, Alfredo Rizkallah, e sua
corretora (Novação).
Foram acusados de registro irregular de operações, manipulação
de contabilidade e de documentação comprobatória, e prestação de
informações inexatas ao BC.
A corretora Magliano, do vice-presidente da Bovespa, Raymundo Magliano Filho, foi multada em R$ 813,4 -punição mantida pelo "conselhinho"- por
"venda de Letras do Banco Central a clientes, a preço unitário notadamente superior aos de mercado, em decorrência de insuficiência de lastro".
A Magliano também teve recurso rejeitado -por unanimidade-
por omissão de dados nas fichas
cadastrais de clientes.
Ação discreta
O "conselhinho" só costuma
aparecer nos julgamentos mais
polêmicos. Foi assim quando acolheu recurso do ex-presidente da
Fiesp, Luis Eulalio de Bueno Vidigal Filho, em 1987, tornando sem
efeito punição da CVM no "caso
Cobrasma" (emissão milionária
de ações em 1986, estimulada com
previsões de lucro infundadas).
O julgamento também beneficiou o Bradesco, o BCN e o Crefisul, que garantiram a emissão.
Por ironia, um dos conselheiros
que absolveu Vidigal foi o então
representante da Febraban, Germano de Brito Lyra, ex-diretor do
Nacional, que hoje está com os
bens em indisponibilidade.
Caso controvertido
O "conselhinho" reapareceu
publicamente em 1996, quando
manteve a pena de inabilitação
aplicada pelo BC ao ex-presidente
da BM&F (Bolsa de Mercantil & de
Futuros) Manoel Pires da Costa.
A punição -em votação desempatada pelo presidente do conselho- depois foi suspensa por liminar obtida na Justiça).
Antes da decisão do "conselhinho", o processo do ex-presidente
da BM&F -acusado de operações
que teriam dado prejuízo à sua instituição financeira- teve idas e
vindas legais.
Um juiz federal deixou de acolher o pedido de arquivamento
formulado por um promotor que
elogiara a atuação de Pires da Costa e de seus sócios.
O feito mais recente do "conselhinho" foi manter a punição aplicada a Naji Nahas, quando havia
rumores de um forte lobby para
absolver o megainvestidor. Ele foi
acusado de fazer negócios em Bolsas com empresas do próprio grupo (as operações conhecidas como
"Zé-com-zé").
(FV)
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