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OUTRO LADO
"Fui de espontânea vontade"
FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL
FERNANDO EICHENBERG
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DE PARIS
"A minha vida é um livro aberto. Eu sou um homem correto",
disse o ex-prefeito Paulo Maluf,
em entrevista à Folha, de Paris,
em dois telefonemas, à noite. Maluf disse que foi dar informações
ao banco por "livre e espontânea
vontade". "Eu não gostaria que o
banco tivesse nenhuma dúvida
sobre a origem do dinheiro".
Maluf diz que a polícia fazendária foi chamada pelo diretor do
banco Crédit Agricole quando estava prestando informações sobre
o depósito de US$ 1,4 milhão que
mantém na instituição. Disse que
"os bancos têm todo o direito,
mais do que isso, tem obrigação
de suspeitar [de lavagem]. "E cada depositante de cada banco tem
obrigação de dar as explicações".
Ele disse que a origem do dinheiro é a venda de um terreno,
herança de seu pai. "Eu disse [às
autoridades] que o dinheiro tem
origem legal, está tudo declarado.
É um patrimônio que eu tenho há
mais de meio século", afirmou.
Maluf disse que o dinheiro depositado no banco veio pelo Banco Central, pelo BCN. "É relativo a
um terreno que meu pai comprou, em 1940, que herdei em 25
de dezembro de 1943, na rua Vergueiro. Foi vendido no início do
ano por R$ 8 milhões, dos quais
20% pertencem a mim. Uma parte desse dinheiro mandei para cá,
e a outra ficou comigo, no Brasil".
Durante entrevista coletiva,
questionado se teria havido uma
transferência de dinheiro da Suíça, Maluf disse que "uma das
transferências para o total da conta veio de uma fundação, está registrado no imposto de renda, de
mais ou menos US$ 1,5 milhão".
Maluf disse que não tem conta
na Suíça. "A Fundação Blackbird
é do meu filho, criada por questões de herança". E acrescentou:
"Prestei todas as declarações de
maneira espontânea. Gostaria
que todos os homens públicos
brasileiros fossem investigados
1% do que sou investigado". Leia
a seguir a entrevista:
Folha - O sr. disse [na entrevista
anterior, por telefone] que tinha
ido prestar depoimento por livre e
espontânea vontade... O sr. foi convocado pelo banco? Há a informação de que a Embaixada do Brasil
foi notificada da sua detenção.
Maluf - Olha, do que a embaixada foi notificada, eu não sei. Estou
dizendo que fui de livre e espontânea vontade falar com o sr. Jean-Marc Bouyge [diretor do Crédit
Agricole].
Folha - Mas o sr. foi ao banco retirar o dinheiro?
Maluf - Fui dar explicações das
coisas que a Folha publicou [sobre a existência do depósito].
Folha - Mas o banco lhe havia pedido essas informações?
Maluf - Não. Na hora que a Folha publicou, eu não gostaria que
o banco tivesse nenhuma dúvida
sobre a origem do dinheiro.
Folha - Não era uma convocação
do banco? O banco é obrigado a informar...
Maluf - Não. Eu marquei do Brasil. Eu telefonei do Brasil e fui lá na
segunda-feira.
Folha - Por que o sr. foi novamente ao banco?
Maluf - Eu fui porque eu tinha
mais documentos para mostrar.
Folha - Quais eram os documentos que o banco estava pedindo?
Maluf - Eles não me pediram nada. Eu fui mostrar a escritura formal de partilha onde esse terreno
foi herdado, no dia 25 de dezembro de 1943.
Folha - O sr. estava conversando
com o diretor...
Maluf - Estava conversando com
ele quando ele me disse: "Eu tenho
que mandar essas explicações para o Ministério do Interior. Já que
o sr. está na França, o sr. daria as
explicações?" Eu disse: "Eu quero
dar hoje, porque amanhã vou para Montecarlo".
Folha - A polícia já estava lá,
quando o sr. chegou?
Maluf - Não, foi chamada.
Folha - Foi chamada pelo banco?
Maluf - Foi chamada por ele [pelo diretor]. Com certeza.
Folha - E o sr. foi em que condição? De detido?
Maluf - Não. Fui na condição de
declarante espontâneo.
Folha - O sr. me falou que o seu dinheiro tinha duas origens, a venda
do terreno e a outra parte...
Maluf - Leia a Folha, meu querido...
Folha - O que eles perguntaram?
Qual era a dúvida deles? Era lavagem de dinheiro?
Maluf - Para minha, por assim
dizer, surpresa desagradável,
quando você tem conta no banco,
supõe-se que tem o mínimo de segredo bancário, até pela violência
que está acontecendo em São
Paulo.
Folha - Mas eles lhe perguntaram
sobre a origem do dinheiro?
Maluf - Eu telefonei para ele [para o diretor do banco] e perguntei:
"Como é que a notícia chegou à
Folha?".
Folha - Eles perguntaram sobre
suspeita de lavagem?
Maluf - Eu acho que eles têm todo o direito. Mais do que isso, têm
obrigação de suspeitar. E cada depositante de cada banco tem obrigação de dar as explicações.
Folha - A informação que o jornal
tinha é que houve notificação de
um juiz, haveria um processo. O sr.
estaria respondendo a um processo, apesar de o sr. dizer que foi
prestar [declarações espontâneas]...
Maluf - Estou lhe dizendo que fui
de maneira espontânea... Se existia processo, foi por causa da notícia da Folha, mas eu desconheço.
Desconhecia qualquer processo.
Folha - Pediram alguma coisa em
seguida, para o sr. prestar novas
informações? O sr. está em que
condição, atualmente?
Maluf - Agora? Eu estou no hotel...
Folha - O sr. pode sair a qualquer
hora do país?
Maluf - Se o sr. quiser jantar comigo, está convidado. Eu digo
mais. Eu não vou voltar para o
Brasil, pois se eu voltar para o Brasil ainda vem a exploração... Vou
ficar aqui duas semanas.
Folha - O sr. faz alguma ligação
desse episódio de hoje com a investigação que é feita no Brasil?
Maluf - Eu desconheço investigação no Brasil. Estão me investigando há quatro anos. A cada
quatro anos vem uma nova eleição e acusações sem provas. A minha vida é um livro aberto. Eu sou
um homem correto. Sou o único
brasileiro que entrou multibilionário na política...
Folha - E o que o sr. vai fazer com
esse dinheiro que está no banco?
Maluf - Ah... meu querido, isso
eu não tenho que dar satisfações a
você. Eu botei em nome da minha
mulher e ela tem um marido vivo.
Mas se um dia eu me for, é minha
obrigação...
Folha - O valor é US$ 1,4 milhão. É
isso?
Maluf - É.
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