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REGRAS DO JOGO
Os bandidos no cenário eleitoral
LUÍS FRANCISCO CARVALHO FILHO
Desde sábado nenhum candidato pode ser preso, salvo
em flagrante delito. E a partir de
1º de outubro (até 48 horas depois
das eleições), o princípio vale
também para os eleitores em geral: ninguém poderá ser preso
-nem mesmo um criminoso com
a folha corrida de Elias Maluco-
, só em flagrante ou em cumprimento de sentença condenatória
por crime inafiançável.
É uma espécie de estado de exceção e isso causa estranhamento
nas pessoas. Sobretudo num momento em que prender bandidos
é a palavra de ordem mais prazerosa...
A origem da garantia está na
proteção da liberdade política.
Vem de uma época em que candidatos indesejáveis e eleitores de
oposição eram arbitrariamente
detidos nas vésperas da votação
para assegurar a vitória de algum
coronel.
O sentimento de todos é o de
que o estado de vigilância da opinião pública, hoje muito mais
agudo pela perspectiva da informação instantânea, em tempo
real, inibe esse tipo de abuso. Não
é que os coronéis tenham acabado. Há hoje mecanismos menos
grosseiros de dominação.
Dois casos concretos chamam a
atenção do país: o ex-todo-poderoso Jader Barbalho, candidato a
deputado federal no Pará, às voltas com a acusação de desvio de
verbas da Sudam, e Pedro Passos,
companheiro de Joaquim Roriz e
candidato a deputado pelo Distrito Federal, com prisão decretada
por grilagem de terras públicas no
coração da República.
Em plena campanha, Jader
Barbalho e Pedro Passos permaneceram escondidos durante os
últimos dias, à espera da chegada
do sábado, e conseguiram suspender temporariamente os mandados de prisão expedidos por conta
da garantia prevista no Código
Eleitoral.
Fica a sensação de que a justiça
é uma farsa e que a impunidade é
uma regra. Jader é o retrato de
um político que não precisaria
mais existir e, com efeito, não se
tolera mais essa mania esquisita
de deixar Brasília ser alvo de
aventureiros imobiliários.
Mas a questão não é tão simples. Se há o argumento de que as
duas ordens de prisão são anteriores e se relacionam com delitos
comuns, praticados num passado
mais distante, pode existir a desconfiança de uma motivação
ideológica, não processual, no
cerne das duas decisões judiciais.
Por que só agora a prisão dos réus
se tornou inadiável, necessária?
Com a palavra os tribunais.
Querem ver como o momento
político é capaz, sim, de estimular
agressões à liberdade individual?
Enquanto Elias Maluco, preso
em 19 de setembro, era exibido
para mídia, o secretário da Segurança afirmava, orgulhoso, que,
no Rio de Janeiro, não há poder
paralelo: lá, dizia ele, em discurso
sem intenções eleitorais, só existe
poder legítimo, democraticamente eleito...
O secretário vira as costas e
uma cena constrangedora de poder paralelo transcorre livremente. A reportagem da Folha merece
ser reproduzida pelo que contém
de espírito crítico e corajosa diferença em relação à cobertura dos
outros jornais: "Ao final da apresentação, após a saída das autoridades, jornalistas xingaram Maluco, insistindo que ele levantasse
a cabeça. Um policial apertou as
nádegas do traficante, que reagiu
a chutes. Ele não conseguiu acertar o policial."
Ninguém liga porque se trata de
Elias Maluco, o suposto assassino
de Tim Lopes, da TV Globo. É a
imprensa e a polícia de mãos dadas. Salve-se quem puder.
lfcarvalhofilho@uol.com.br
LUÍS FRANCISCO CARVALHO FILHO,
advogado criminal e articulista da
Folha, escreve às quartas nesta coluna
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