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ESPIONAGEM
Espiões escolhem alvos que, além de dados relevantes, possam ter mágoa dos ex-empregadores; ex-cônjuges também foram procurados para divulgar
informações
Kroll usou ex-executivos para investigar empresas e governo
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
Oitenta arquivos de computador da Operação Tóquio -nome
pelo qual os espiões da Kroll Associates se referiam à investigação
contratada pela Brasil Telecom-
tornados disponíveis na internet,
na última semana, mostram que a
sedução dos ""ex" é uma das armas mais utilizadas na espionagem empresarial.
Além de usar informações de
funcionários públicos em órgãos-chave, como a Polícia Federal e o
Banco Central, a Kroll se aproximou de ex-executivos e de ex-cônjuges dos investigados para
obter dados sobre os negócios da
Telecom Italia, alvo principal da
espionagem.
Conforme a Folha noticiou em
julho, o ministro Luiz Gushiken e
o presidente do Banco do Brasil,
Cássio Casseb, foram espionados,
bem como os empresários Nelson
Tanure -acionista dos diários
"Jornal do Brasil" e "Gazeta Mercantil"-, Naji Nahas, Luiz Roberto Demarco, as Organizações
Globo, a Telecom Italia, o ex-presidente da Parmalat Gianni Grisendi, além de fundos de pensão.
A jornalista Cristina Konder,
que foi vice-presidente do "Jornal
do Brasil" até maio deste ano,
aparece em um dos relatórios da
Kroll como alvo para abordagem.
Por ter se demitido do cargo, foi
vista como possível fonte de informações sobre Nelson Tanure.
Konder, atual diretora de conteúdo do "Jornal dos Esportes",
no Rio de Janeiro, disse que ficou
assustada ao saber do fato pela
Folha e que não foi procurada por
ninguém interessado em informações sobre Tanure, com quem
afirma manter bom relacionamento. "Talvez tenham se dado
conta de que eu seria um alvo
ruim", completou a jornalista.
Para a PF, os espiões se retraíram depois de a Operação Tóquio
ter sido revelada pela Folha.
O ex-diretor executivo da Globopar (Globo Participações)
Mauro Molchansky era outro alvo para abordagem, embora os
espiões considerassem a iniciativa
arriscada. O nome dele aparece
em relatório da Kroll como alvo
para contato, ao lado da advertência ""too dangerous", que significa
"muito perigoso".
Molchansky foi executivo da
Globopar até abril de 2002 e
acompanhou de perto a associação da Telecom Italia na Globo.com e os negócios conjuntos
dos dois grupos em telefonia celular. Ele concluiu que os espiões
desistiram de procurá-lo.
Mágoa
Os espiões escolhem os alvos
que, além de informações relevantes, possam ter mágoa dos ex-empregadores, o que os tornaria
mais receptivos ao contato. Foi
com essa ótica que o espião português Tiago Verdial se aproximou
do motorista Adelson Pugliese,
que serviu ao ex-presidente da
Parmalat Gianni Grisendi.
Grisendi também vinha sendo
investigado pela Polícia Federal
por suspeita de fraude na gestão
da Parmalat e o telefone do motorista estava grampeado. A PF descobriu a Operação Tóquio e passou a vigiar os passos de Verdial e
de outro espião da Kroll.
Gianni Grisendi foi presidente
da TIM (Telecom Italia Mobile,
do grupo Telecom Italia) de abril
de 2001 a maio de 2002 e acionista
minoritário de uma outra empresa italiana, a Tecnosistemi, que
prestou serviços à TIM no Brasil.
A empresa faliu deixando R$ 100
milhões de dívidas.
Na busca de elos entre a Telecom Italia e Grisendi, a Kroll se
aproximou de ex-funcionários da
Tecnosistemi. Os relatórios referem-se a contatos de Tiago Verdial com um ex-presidente da
empresa, identificado como CR,
que teria repassado informações
sobre corrupção em prefeituras
petistas no Estado de São Paulo.
O ex-presidente referido seria
Claudio Raffaelli, que nega ter
passado informações à Kroll. Ele
afirmou que não teve contato
com Verdial e qualificou de absurda a informação sobre pagamento de propinas às prefeituras.
Os funcionários cooptados são
identificados por siglas. Uma ex-funcionária da Telecom Italia no
Brasil, que teria repassado informações sobre Carmelo Furci, é
identificada como M. Um dos arquivos da Kroll diz que M é amiga
de uma ex-assessora de FHC no
Palácio do Planalto. O espião usa
a ligação entre elas para obter informações da CPI do Banestado.
Funcionários públicos
Os arquivos atribuídos à Kroll
foram entregues à Polícia Federal
pela Telecom Italia, no dia 16 de
julho, e podem ser localizados nos
sites ucho.info e www.carosamigos.com.br.
No relatório intitulado ""Project
Tokio 5", o espião diz ter recebido
informação da PF de que o ex-presidente da Telecom Italia no
Brasil Carmelo Furci não estava
na lista da CPI do Banestado.
Outro relatório cita o conteúdo
de conversas telefônicas de Nelson Tanure com seu advogado
Carlos Eduardo Bulhões e com o
ex-presidente do grupo canadense TIW Bruno Ducharme, ex-sócio do Opportunity na Telemig
Celular e Tele Norte Celular.
O relatório afirma que as gravações teriam sido obtidas junto à
PF ""por vias legais", mas Bulhões
disse desconhecer a existência de
tal autorização judicial.
Segundo advogados consultados pela Folha não há forma legal
de se obter o teor de conversas telefônicas na Polícia Federal.
Um dos arquivos da Kroll contém 46 e-mails do empresário
Luiz Roberto Demarco. Entre
eles, estão duas mensagens de
Gushiken para Demarco, de fevereiro e março de 2001, sobre a
criação de um portal da Previdência e sobre uma reunião na
Abrapp (Associação Brasileira de
Previdência Privada).
Segundo Demarco, os textos reproduzidos pela Kroll são parte
de 6.000 e-mails que ele afirma terem sido roubados do computador de sua empresa, em abril de
2001, e repassados à Kroll por sua
ex-mulher Regina Yasbek. Procurada pela Folha, Yasbek não respondeu a acusação.
Colaborou RUBENS VALENTE, da Reportagem Local
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