|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ELEIÇÕES 2008 / SÃO PAULO
Maior adversário de Marta foi o "kassabinho", diz psicólogo
A figura do "bom menino" evidenciou contradições da petista, que encarna a figura da "mulher discriminada", mas na realidade "é rica"
Já filósofo acha que prefeito projeta imagem que não desperta nem amor nem ódio
RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL
Mais que o político Gilberto
Kassab, candidato do Democratas, quem criou dificuldades
reais para a aspirante petista à
Prefeitura de São Paulo, Marta
Suplicy, foi o simpático e abobalhado "kassabinho".
Quem defende a idéia é o psicólogo Jacob Pinheiro Goldberg, autor, entre outros, de
"Monólogo a Dois" (Centro de
Estudos da Mentalidade, 2002)
e "Cultura e Agressividade"
(Landy, 2004). Ele argumenta
que é possível fazer uma "análise psicológica" da conduta dos
candidatos "enquanto atores
do teatro político" -o que é diferente, diz, da condenável tentativa de fazer psicanálise à distância desses indivíduos.
Para Goldberg, a imagem de
Marta entrou em crise ao se ver
confrontada com um oponente
que veste "o papel de bom menino" e que tem seu "traço de
regressão infantil" tão bem representado pelo bonequinho
criado pelo marketing político.
A petista, afirma o psicólogo,
sempre procurou encarnar "a
condição da mulher brasileira,
que é verdadeiramente discriminada numa sociedade brutalmente machista". Ocorre
que essa identificação, não só
com as mulheres, mas com as
minorias em geral, criava uma
dissonância, ele diz, com outra
característica de Marta, a de ser
"uma mulher rica e poderosa".
"Até pela origem dela como
mulher rica, se cria uma dissonância entre essa imagem [de
identificação com as minorias]
e seu poder. Ela corria o risco
de se aproximar de uma situação não persuasiva, não convincente", diz Goldberg.
O problema era menor, defende o psicólogo, quando Marta se confrontava com uma figura pública como a de Paulo
Maluf (PP), afinal um representante desse poder tradicional, machista, "candidato da ditadura". Diante de Kassab, o
"bom menino", ele diz, as contradições da imagem de Marta
se tornam mais evidentes.
"O Gilberto Kassab tenta fazer o papel de bom menino, e
nesse papel ele fica bem ajustado. Até essa falta de casamento
vai bem com essa imagem, sabe? Tem uma coisa de moço
bom do interior, casadoiro, o
genro que toda mãe do interior
gostaria de ter. Ele mesmo diz
que está sendo muito assediado
com propostas de casamento",
diz o psicólogo. "O kassabinho
tem um traço de regressão infantil que eu vejo no Kassab."
O professor de ética e filosofia política da USP, Renato Janine Ribeiro, faz ressalvas à interpretação de Goldberg e afirma que "a imagem depende do
público": "Não há percepção
universal". Marta, por exemplo, "é uma personagem complexa", dona de "uma exuberância de significados, alguns
deles percebidos antipaticamente pela classe média, como
o fato de ela estar próxima dos
pobres", afirma Janine Ribeiro.
Já Kassab teria sua percepção por diferentes públicos menos condicionada que a de Marta, ele diz, por "projetar a imagem de uma tela semi-vazia":
"Ele é do PFL (também conhecido como DEM) mas também
do PSDB", diz Janine Ribeiro.
"E seu partido, como praticamente não existe em São Paulo,
permite que dele se diga o que
quer que seja. Na Bahia, o PFL-DEM é uma identidade precisa;
em São Paulo, não."
Numa interpretação oposta à
de Goldberg, Janine afirma que
a petista se beneficiou, no passado, de suas supostas "contradições". "Apesar de petista e de
sexóloga, ela se beneficiou de
ser rica e bonita: numa cidade
conservadora, isso atenuava o
veneno do radicalismo. A contradição de Marta na verdade a
beneficiava, não a prejudicava.
Para muitos conservadores, ser
rico é uma vantagem, e defender as minorias, um problema."
Já o "low profile" de Kassab,
afirma, é o que o beneficia hoje.
"Também tem suas vantagens,
porque não desperta muita inveja nem ódio. Não imagino fanatismo a favor ou contra Kassab, como há contra Marta. Alguém diz que vota em Marta só
por ser contra Kassab? Quem
tem medo do excesso de significados não gosta dela."
A imagem de "tela semi-vazia" de Kassab também serve
para o filósofo explicar sua capacidade de destinatário dos
votos tucanos: "Kassab herda
bem um patrimônio tucano, o
da sensatez que não entusiasma. No esgotamento de Geraldo Alckmin, que mostrava uma
contradição entre a auto-imagem zen e a prática real do ataque ininterrupto aos adversários, Kassab expressa bem a
idéia de que um governo pode
ser bom porque seria neutro,
limpo ("Cidade Limpa'), como
se fosse possível governar sem
tomar decisões. Marta se expõe
mais e por isso se arrisca".
Texto Anterior: Bastidores Próximo Texto: Frase Índice
|