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ALIMENTAÇÃO
Na hora de ir comprar comida, menos de R$ 1 de cada R$ 5 gastos no país vem de famílias de excluídos
Pobre come 60% menos do que deveria
da Reportagem Local
A piada é velha: uma pessoa come um frango, outra não come nada, mas, pela média, ambas comeram meio frango. Em proporções
diferentes, é o que acontece com o
mercado alimentar brasileiro.
Uma a cada três famílias das regiões metropolitanas do país vive
com renda de até R$ 600,00 por
mês. Mas na hora de ir à feira, à
padaria ou ao supermercado, menos de R$ 1,00 de cada R$ 5,00 gastos vem dessas famílias excluídas.
Ou seja: sua parcela do mercado
alimentar é 60% menor que deveria ser. Longe da periferia, os domicílios com renda mensal superior a R$ 2.400,00 abrigam apenas
17% das famílias das maiores cidades. Mas sua fatia do mercado de
alimentação é o dobro disso: elas
comem 34% dos produtos.
Em poucos casos as distorções
provocadas pelo cálculo de uma
média são tão dramáticas quanto
no da alimentação. As diferenças
no consumo de comida entre classes sociais variam de produto para
produto, de cidade para cidade.
Assim, a média de gasto para
compra de carne bovina de primeira, de R$ 11,89 por mês, sugere
que todas as famílias das cidades
pesquisadas estão comendo 2 kg
de contra-filé por mês. Engano.
Com gasto mensal de R$ 2,64
com carne de primeira e R$ 3,37
com carne de segunda, uma a cada
dez famílias não consome mais do
que 0,5 kg de fraldinha e 1 kg de
músculo. São famílias com três
pessoas e cuja renda, somada, não
passa de R$ 240,00/mês.
Na outra ponta da cadeia estão
famílias com três a quatro pessoas
e renda superior a R$ 3.600,00 por
mês. Elas também representam
10% da população, mas gastam
quase dez vezes mais em carne de
primeira do que o outro grupo.
Os R$ 28,90 de despesa com carne bovina são suficientes para esse
segmento comprar 3,6 kg de contra-filé e 1 kg de carne moída por
mês. Além de cortes mais macios,
cada membro da família de elite terá comido no mínimo o dobro de
carne do que os excluídos.
A distorção se reproduz em cerca
de 90% dos mercados.
Apenas três itens são proporcionalmente mais consumidos pelas
famílias excluídas do que pelas demais: carne de boi enlatada, farinha de mandioca e açúcar cristal.
Nos mercados de leite em pó e
feijão as famílias mais pobres têm
praticamente a mesma fatia que
representam da sociedade: 33%.
Com 17% do total de famílias, a
elite das regiões metropolitanas
tem participação superior a sua representação social em 90% dos
mercados. Só em quatro ela fica
abaixo, justamente os de produtos
populares, como farinha de mandioca e carne bovina de segunda.
Mais do que isso, as famílias com
renda superior a R$ 2.400,00 dominam seis mercados. Produtos
como azeitona e azeite de oliva são
mais consumidos por esses 17% da
população.
Cada cidade ou região metropolitana tem suas próprias características na hora de ir à mesa.
Em São Paulo, por exemplo, o
que diferencia a alimentação das
famílias de elite das excluídas é o
consumo de aves que não o frango:
64% do mercado é das famílias
com renda superior a R$ 2.400,00.
O fenômeno se repete em Porto
Alegre, mas a maior característica
do cardápio das famílias ricas gaúchas é a azeitona: 78% do consumo
vai para a elite. Só 4% das empadas
dos pobres recebem azeitona.
(JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO)
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