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São Paulo, domingo, 26 de janeiro de 2003

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CASO SILVEIRINHA

Para especialistas, centralização pode ter facilitado corrupção

Inspetoria aumentou o seu poder na gestão Garotinho

MURILO FIUZA DE MELO
DA SUCURSAL DO RIO

Foco do suposto esquema de corrupção comandado pelo fiscal Rodrigo Silveirinha Corrêa durante a gestão de Anthony Garotinho no governo do Estado do Rio de Janeiro (1999 a abril de 2002), a Inspetoria de Contribuintes de Grande Porte não se limitava a fiscalizar apenas as grandes empresas arrecadadoras do Estado, como o seu próprio nome sugere.
A Folha teve acesso a documento da Secretaria Estadual de Fazenda que traz a arrecadação das 368 empresas, sob a fiscalização da inspetoria, entre 1999 e abril de 2002. Do total, apenas 118 eram consideradas realmente de grande porte - arrecadavam acima de R$ 1 milhão por mês de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
Outras 206 empresas registraram arrecadação menor que R$ 1 milhão e 44 não apresentaram dados completos. Em função do sigilo fiscal, a Folha não divulgará os nomes dos contribuintes.
Na lista, em meio a grandes companhias de petróleo, telefonia e eletricidade, há pequenos mercados, distribuidoras de bebidas, uma usina de açúcar e até uma cooperativa de leite.
Uma subsidiária de uma empresa do setor de aviação recolheu, por exemplo, R$ 7,18 de ICMS em um ano e dois meses sob a fiscalização da inspetoria.
Ex-subsecretário de Administração Tributária de Garotinho, Silveirinha, três fiscais de renda do Estado e quatro auditores federais são suspeitos de enviar ilegalmente US$ 33,4 milhões para contas na Suíça. O dinheiro teria vindo supostamente do pagamento de propinas por parte de empresas monitoradas pela inspetoria.
Quando as acusações vieram à tona, Silveirinha tinha acabado de ser nomeado presidente da Companhia de Desenvolvimento Industrial pela governadora Rosinha Matheus (PSB). Acabou sendo demitido no dia 10.
O órgão fiscalizador é um exemplo do poder que Silveirinha ganhou ao longo da administração de Anthony Garotinho. Em janeiro de 1999, quando foi criada, a Inspetoria de Grande Porte fiscalizava 268 empresas. Dois anos depois, elas já eram 368.
Segundo as regras da Secretaria de Fazenda, uma empresa para ser fiscalizada pelo grupo de Silveirinha deveria ser autorizada por resolução assinada pelo secretário de Fazenda.

Inspetoria
Após a publicação da resolução no Diário Oficial, apenas os fiscais da inspetoria -cerca de 50- estavam autorizados a conduzir todo o processo de fiscalização, incluindo o acompanhamento mensal da arrecadação das empresas, o planejamento da ações até as inspeções nas empresas.
Para se ter uma idéia, o corpo de fiscais da inspetoria representava apenas 6,4% do total da categoria ativa no Estado -cerca de 780 servidores. Segundo os tributaristas Ives Gandra da Silva Martins e Osiris Lopes Filho, essa centralização na área de fiscalização do Estado pode ter favorecido práticas de corrupção pelo grupo de Silveirinha.
"O acompanhamento fiscal das grandes empresas deve ser centralizado, mas não a fiscalização, porque, se isso ocorre, o fiscal fica com um poder que pode gerar corrupção. Nessa situação, o cara [o fiscal] vira dono de um cartório", afirma Lopes Filho, que foi secretário da Receita Federal no governo do presidente Itamar Franco (1992-1994).

Críticas
Ives Gandra também desaprova o método adotado pela inspetoria de Silveirinha. "O ideal é que quem fiscaliza não pode ter o controle da arrecadação das empresas. É assim que acontece na Receita Federal", declarou.
O líder do PT na Assembléia Legislativa, Carlos Minc, que deverá integrar a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) sobre o caso, afirma que o suposto esquema atuava em quatro áreas: na venda de anistia de multas a empresas com dívidas com o Estado; na aplicação de multas ilegais, posteriormente canceladas mediante pagamento de propina; na autorização de fusões de empresas devedoras de ICMS; e na concessão de benefícios fiscais pelo Fundes (Fundo de Desenvolvimento Econômico e Social).
Procurado pela Folha, o ex-governador Anthony Garotinho não quis fazer comentários sobre o conteúdo desta reportagem.


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