São Paulo, segunda-feira, 26 de janeiro de 2004

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POLÍTICA EXTERNA

Representante da Comunidade Européia diz que presidente americano é contra reuniões muito amplas

Bush não deve chamar Lula para cúpula do G8

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A DAVOS

A diplomacia brasileira terá que fazer muito esforço para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva seja convidado por seu colega norte-americano George Walker Bush a participar da Cúpula do G8, marcada para entre 8 e 10 de junho na Sea Island, no Estado sulino da Georgia.
Lula participou, no ano passado, em Evian (França), do que a diplomacia francesa batizou de "diálogo ampliado", ou seja, uma reunião entre os sete países mais ricos do mundo (G7) mais a Rússia e 12 países em desenvolvimento, de diferentes áreas geográficas.
Em entrevista coletiva após a reunião, Lula chegou a dizer que "dificilmente o Bush fará o G8 sem convidar todos os países presentes hoje. Não tem volta atrás".
Tem, sim, a julgar pela avaliação que fez ontem Stefano Sannino, representante pessoal do presidente da Comissão Européia (o italiano Romano Prodi) para as cúpulas do G8. Os representantes são chamados de "sherpa" porque, como os guias do Himalaia, são os que fazem o trabalho de preparar tudo o que os chefes de governo vão discutir na cúpula.
Sannino diz que Bush é contrário a reuniões muito amplas e prefere manter o G8 no formato original, mais simples e informal.
Mas a decisão final sobre a repetição ou não do convite não está tomada, até porque só na semana que vem, em Washington, haverá a primeira reunião dos "sherpas" para começar a definir a agenda.
A eventual ausência do presidente brasileiro na reunião da Georgia combina com o fato de que a América Latina "sumiu do radar de Washington", conforme a avaliação do especialista venezuelano Moisés Naím, que trabalha na capital norte-americana (no centro Carnegie para a Paz Internacional) e edita a revista "Foreign Policy".

"Continente perdido"
No sábado, em debate sobre a América Latina no encontro anual-2004 do Fórum Econômico Mundial, Naím, PhD do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), disparou uma tremenda provocação, que incendiou o debate. "A América Latina passou de ser o quintal dos Estados Unidos para se transformar em Atlântida, o continente perdido", afirmou.
Criticou então a elite latino-americana pelo que chamou de "coexistência pacífica com a normalidade", quando a normalidade é "horrenda".
"Tolice", rebateu Rodrigo Rato, vice-primeiro-ministro espanhol, armado com o seguinte argumento: "Se fosse um continente perdido, as empresas espanholas (que investiram pilhas de dinheiro na região) teriam sido punidas pelo mercado" (porque teriam feito mau investimento).
Mas Rato acabou por aceitar que, em pelo menos um aspecto, a América Latina parece de fato perdida: "A menos que os países latino-americanos mudem suas práticas parlamentares, será impossível conseguir estabilidade, porque nenhum governo é capaz de impor a sua agenda", afirmou.
É uma alusão ao fato de que a liberdade para troca de partidos e a proliferação destes impedem a existência de maiorias estáveis como as que se formam habitualmente na Europa.
Felipe Larraín, professor de Economia da Universidade Católica do Chile, também saltou retoricamente na garganta de Naím, ao propor uma aposta (um jantar) sobre o crescimento da América Latina em 2004, que o provocador Naím situara em apenas 2% a 3%, o que "gerará mais 1 milhão de pobres".
Larraín aposta em algo entre 3,2% e 4%. Naím devolveu: "Mesmo que seja 4%, não terá nada a ver com a América Latina, exceto nos casos de Chile e México. Será por conta dos altos preços das commodities e dos juros baixos no mundo".
Foi então a vez de Kenneth Rogoff, ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional e agora professor de Economia da Universidade Harvard, puxar para outro defeito da América Latina: batizou-a de "serial defaulter".
É uma ironia com os "serial killers", matadores em série, porque a América Latina dá calotes seguidos. O Brasil já deu sete, a Argentina, cinco.
O economista ficou a uma palavra de defender um novo default: prefere falar em "reestruturação" da dívida e pediu "ajuda da comunidade internacional e liderança entre os latino-americanos".
Reforçou o presidente equatoriano Lúcio Gutiérrez: "40% do Orçamento vai para pagar a dívida. Com o restante, é impossível cumprir os parâmetros mínimos da ONU" (as metas de redução da pobreza, aperfeiçoamento da educação e da saúde etc).



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