São Paulo, segunda-feira, 26 de fevereiro de 2007

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ARTIGO

Bush e Lula podem ser mais ambiciosos

RICHARD G. LUGAR
JOSÉ MIGUEL INSULZA

NOSSO HEMISFÉRIO tem grandes exportadores de petróleo, como Canadá, México e Venezuela; e importadores de petróleo, como Estados Unidos, Chile, Uruguai e quase todos os países menores da América Central e do Caribe.
E tem também o Brasil. Apesar de sua grande população e forte crescimento econômico, o Brasil se transformou de um grande importador de petróleo (46% do petróleo consumido era importado há apenas 10 anos) em um país que é auto-suficiente em petróleo.
Os brasileiros fizeram isso em parte promovendo a conservação de energia e trabalhando duro para achar novas fontes domésticas de petróleo.
Mas eles também apostaram fortemente no etanol feito de cana. Desafiando o ceticismo generalizado, os brasileiros decidiram há 30 anos usar cana-de-açúcar como uma fonte de energia independente.
Apesar de a tarefa ter sofrido reveses, hoje o Brasil substituiu cerca de 40% de seu consumo de gasolina por etanol. O país até mesmo exporta o produto aos EUA, apesar da alta tarifa.
O Brasil tem usado uma combinação de requerimentos obrigatórios de mistura, incentivos fiscais e empréstimos e pesquisa subsidiados, assim como programas inovadores de "clusters" de biocombustíveis (agribusiness em larga escala focado na produção de energia em áreas de crescimento marginal), para ajudar a criar a economia de escala necessária para um setor eficiente.
Para levar o etanol aos consumidores, o Brasil construiu uma rede de dutos que transportam o etanol das fábricas aos revendedores domésticos de gasolina.
E mais de 70% dos novos veículos vendidos lá são flex-fuel, que podem usar uma mistura de até 85% de etanol e gasolina.

Importação de petróleo
A experiência do Brasil traz lições importantes para outros importadores de petróleo.
Nós sabemos dos perigos da alta dependência de importações de fontes de energia. Os preços podem se elevar e a oferta pode até ser interrompida, levando o caos ao Orçamento do governo, apagando o crescimento econômico e elevando o potencial de instabilidade doméstica e manipulação política pelos países produtores de petróleo.
Isso é especialmente verdade para alguns dos países mais pobres da região, como Haiti, Nicarágua e Guiana. Os desafios que essas nações em desenvolvimento enfrentam são exacerbados pelo alto preço das importações de petróleo.
Nem todo mundo pode plantar cana-de-açúcar de forma tão eficiente quanto o Brasil. Mas com a nova tecnologia celulósica próxima de se tornar comercial, praticamente qualquer tipo de biomassa -raspas de madeira, palha, restos agrícolas, até esterco de vaca- pode ser usada na produção de biocombustíveis.
A experiência dos EUA, que faz etanol de milho e recentemente passou o Brasil como o maior produtor do mundo, mostra que a produção de biocombustíveis pode trazer renda mais alta e empregos a comunidades empobrecidas.

Promovendo o etanol
Os problemas da dependência do petróleo e o potencial dos biocombustíveis serão destacados no encontro de junho da Organização dos Estados Americanos, no Panamá. O foco principal será a energia, incluindo a procura por soluções sustentáveis de produção e uso.
Tudo isso apresenta ao Brasil e aos EUA uma oportunidade sem precedentes de se juntar a uma parceria estratégica que enfrentaria dois dos maiores desafios do hemisfério: a insegurança energética e a pobreza.
A dupla poderia liderar um movimento para espalhar e aprofundar o desenvolvimento de biocombustíveis na região.
O presidente George W. Bush viaja a São Paulo em março para se encontrar com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para assinar um importante acordo bilateral para melhorar a cooperação em biocombustíveis no setor privado, promover o uso de etanol na região e começar a transformar o etanol em uma commodity global.
Esse é um bom primeiro passo, mas acreditamos que os dois podem ser mais ambiciosos. Os presidentes Bush e Lula deveriam expandir e energizar a iniciativa lançando um programa conjunto de investimentos, treinamento e pesquisa para criar capacidade de produção de biocombustíveis em toda a região e no mundo. Financiamentos e empréstimos de bancos regionais de desenvolvimento poderiam ser usados para verificar a possibilidade de usar biocombustíveis em cada país.
Investimentos e empréstimos dos EUA, do Brasil e de outros governos interessados, assim como do setor privado, poderiam melhorar a tecnologia celulósica, treinar fazendeiros e construir fábricas e sistemas de distribuição. O senador Lugar apresentará um projeto de lei nos EUA com essa proposta.
Um programa de investimentos desses poderia, a curto prazo, criar um mercado de biocombustíveis pujante no hemisfério Ocidental, que aliviaria a pobreza, criaria emprego e renda, melhoraria a segurança energética, fortaleceria a independência das nações e protegeria o meio ambiente.
Se implementada vigorosamente e expansivamente, essa parceria sinalizaria uma mudança transformadora na política dos EUA para a América Latina, uma verdadeira colaboração Norte-Sul em uma estratégia econômica e de segurança que beneficiaria todos.


RICHARD G. LUGAR é senador por Indiana e principal representante do Partido Republicano no Comitê de Relações Exteriores do Senado dos EUA. JOSÉ MIGUEL INSULZA é secretário-geral da Organização dos Estados Americanos


Este artigo foi publicado originalmente no jornal "Miami Herald"


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