São Paulo, quarta-feira, 26 de março de 2008

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Trabalhador anda 40 km para relatar "escravidão"

Parente de fazendeiro acusado nega a suspeita

JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA

Uma suspeita de escravidão por dívida e de trabalho degradante em uma propriedade rural de Alta Floresta (MT) levou à prisão em flagrante do dono da fazenda -o que nunca havia ocorrido até então no Estado.
O Ministério Público do Trabalho só teve conhecimento da situação na fazenda depois que um dos trabalhadores abandonou seu alojamento e andou -sem água ou comida- cerca de 40 km em um atalho aberto na meio da mata fechada para fazer a denúncia.
De acordo com seu relato, ele e dois colegas só poderiam ir embora depois de pagar, com trabalho, alimentos comprados pelo proprietário.
O procurador do Trabalho Rafael de Araújo Gomes afirmou que, ainda assim, a travessia não pode ser considerada uma fuga, já que o fazendeiro Altair Vezentin não o impediu fisicamente de ir embora, apenas o obrigou a andar pela floresta para fazê-lo.
"[Vezentin] Disse que ele [trabalhador] poderia ir, mas os outros dois deveriam ficar para garantir o pagamento do que ele havia comprado para eles comerem, uns R$ 400 em arroz, café, açúcar e óleo", afirmou o procurador.
Antes uma das principais modalidades de trabalho análogo à escravidão, a ligação por dívida é hoje uma prática raramente encontrada pela fiscalização. Normalmente, as péssimas condições de alojamento e alimentação é que acabam por configurar o crime.
A discórdia entre os três e o empregador começou quando eles perceberam que o trabalho combinado -preparar o campo para a pecuária- seria mais complicado do que parecia.
Eles tentaram então negociar um pagamento mais alto, o que foi negado pelo fazendeiro, segundo a Procuradoria.
A denúncia foi feita no dia 17 e o procurador chegou ao alojamento no último dia 20, quando, com dois policiais, prendeu Vezentin -que já foi liberado.
Gomes disse que os trabalhadores banhavam-se e bebiam a água de um riacho. Como banheiro, usavam a floresta. Ficavam em uma barraca cujo teto era de plástico.
A Folha ligou para a casa de um irmão de Vezentin, mas não encontrou o fazendeiro. Uma cunhada disse que ele nega a suspeita. Ele também pode ser indiciado por aliciamento de trabalhadores.


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