São Paulo, quinta-feira, 26 de abril de 2007

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JANIO DE FREITAS

Pelegos outra vez

Sindicalistas do governo nos trouxeram um peleguismo disfarçado na forma e idêntico aos fins do predecessor

OS SINDICALISTAS AGRACIADOS no atual governo com a oportunidade, em ministérios e outros postos influentes, de fazer alguma coisa coerente com o sentido do sindicalismo mostraram-se, todos, omissos ou desleais para com sua origem de classe.
Sindicalistas mais apegados ao poder e a políticos do que aos seus princípios declarados constituíram -conhecidos como pelegos- uma praga que contribuiu muito para a derrocada do regime democrático em 1963/64, até o golpe. Com os modos de operação e peculiaridades determinados pelas circunstâncias atuais, bastante diferentes daquele passado, o que nos trouxeram os sindicalistas do governo é um peleguismo disfarçado na forma e idêntico aos fins do predecessor. Digamos, em homenagem à moda palavrosa, um neopeleguismo.
A proposta com que o sindicalista Luiz Marinho, ex-presidente da CUT, inaugura sua estada como ministro da Previdência é de um reacionarismo imoral. Quer esse sindicalista a redução das pensões por morte à sua metade, com o eventual acréscimo de 10% se houver, além da viúva, dependente menor. Isso, neste país que ostenta a mais indecente aposentadoria dos assalariados, assistência social que é uma humilhação e salários que não permitem ao trabalhador se prover nem sequer minimamente para os males da velhice. (Não incluídos, é claro, os privilegiados metalúrgicos das montadoras automobilísticas e outras indústrias do ABC paulista.)
Luiz Marinho passou pelo Ministério do Trabalho e lá não deixou mais que o registro contábil dos seus vencimentos e das mordomias generosas. Alguém se lembra que Jaques Wagner foi ministro de alguma coisa, fez ou disse alguma coisa aproveitável pelos sindicalizados que o elevaram a figura política? Ricardo Berzoini, que até empurra bem o PT para as aparências da sobrevida, só será ministro lembrado como precursor da investida de Luiz Marinho contra a viuvez desvalida e os idosos sem auto-suficiência. Três casos que valem por tantos outros.
Manchete distraidamente ultradireitista, no caderno Dinheiro da Folha de domingo, decretava: "Benefício social é bomba-relógio fiscal". Referia-se ao que é gasto com portadores de deficiência e com idosos. A explicação da diretora de Benefícios do Ministério de Desenvolvimento Social (sic), Maria José Freitas (sic), "há sempre entrada de pessoas", no "estoque de benefícios" (sic) e a "saída não ocorre na mesma proporção". Um dia talvez o estoque de informação da tecnocrata inclua as notícias de que a população brasileira cresce e envelhece, adoece mais porque são mais pessoas com menos assistência, e o crescimento econômico é insuficiente para gerar os empregos que aumentem a arrecadação da Previdência.
Bomba-relógio é o neopeleguismo que pratica as receitas neoliberais e recheia uma bomba-relógio que não é a da manchete.


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