São Paulo, Quarta-feira, 26 de Maio de 1999
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JANIO DE FREITAS
Não há dúvida mesmo

O incumbido de dar explicações pelo presidente da República precisou mentir, para enfrentar o ponto essencial da participação de Fernando Henrique Cardoso na articulação de Luiz Carlos Mendonça de Barros e André Lara Resende para manipular a privatização da Telerj e mais 15 telefônicas. Logo, não é preciso dizer mais nada sobre a impossibilidade de explicação do presidente da República.
É suficiente registrar a mentira, na afirmação central do ministro Pimenta da Veiga: ""Todos os telefonemas que o presidente recebeu tinham a finalidade de prestar informações genéricas" sobre a privatização. Essa foi a resposta de Pimenta quando questionado sobre a autorização de Fernando Henrique (""Não tenha dúvida") para o uso de seu nome, pedido por Lara Resende, em pressões que enfraquecessem um dos concorrentes e favorecessem outro.
Não foi um telefonema de informação, mas de deformação ilegal da concorrência, por ambos, e, por Fernando Henrique, do uso da autoridade de presidente da República.
O Ministério Público Federal, que já concluiu pela ocorrência de manipulações no preparo do leilão daquelas telefônicas, proporciona a compensação possível para a desesperança provocada pela classe política. Mas a esta bastaria a omissão conduzida pelos senadores e deputados governistas. Foi um exagero abusivo o espetáculo de pequenez, ainda mais pessoal do que político, oferecido ao longo do dia. Como se política de governistas só pudesse ser praticada em um mundo de anões morais.
É infindável a capacidade desses senadores e deputados de falar na necessidade de não prejudicar o andamento das reformas, numa suposta agenda positiva, no interesse nacional de não prejudicar a economia com questões políticas. A decência pessoal e a probidade administrativa não entram na concepção de interesse nacional nem, ao menos, da agenda positiva. Nenhum viu, no diálogo tão preciso da gravação transcrita, a concordância de uso da autoridade da Presidência da República para forçar o deslocamento da Previ, rico fundo de pensão do Banco do Brasil, de um consórcio para outro.
De todas as manifestações que pude recolher no dia todo, um só governista me proporciona a exceção de praxe. Do senador Lúcio Alcântara, do PSDB: o conteúdo das gravações transcritas ""denota uma grande permissividade. Houve pelo menos suspeita de negócio sujo"; e aquela, exposta nas fitas, ""não seria a melhor conduta para um presidente num negócio desses". Pelo menos no primeiro momento, Lúcio Alcântara teve a melhor conduta para um senador.
Pensando melhor, a atitude dos governistas é até compreensível: há uma perfeita adequação na fraudulência explicada pela mentira.


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