São Paulo, domingo, 26 de junho de 2005

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ESCÂNDALO DO MENSALÃO/O PUBLICITÁRIO

Para movimentos sociais e radicais, gestão petista deu mais força aos conservadores e está enfraquecendo ala progressista

Militantes vêem governo "despetizado"

LAURA CAPRIGLIONE
DA REPORTAGEM LOCAL

FÁBIO ZANINI
EM SÃO PAULO

A saída do governo de José Dirceu, elevado à condição de neoaliado pelo MST, e o esperado encolhimento do PT no governo com a reforma ministerial acenderam a luz vermelha nos movimentos sociais, entre radicais e na militância do partido, que avaliam estar perdendo a guerra contra a "ala conservadora".
Na terça-feira da semana passada, 43 entidades e movimentos, entre eles a CUT (Central Única dos Trabalhadores) e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), esboçaram uma tentativa de reação à onda de denúncias que abala o governo.
A inspiração, genérica, é a aliança feita na Venezuela pelo presidente Hugo Chávez com movimentos sociais, contra as chamadas "elites empresariais".
Em documento intitulado "Carta ao Povo Brasileiro", as entidades manifestam-se contrárias "a qualquer tentativa de desestabilização do governo, patrocinada pelos setores conservadores".
Em outro ponto, escrevem: "De olho nas eleições de 2006, as elites iniciaram, através dos meios de comunicação, uma campanha para desmoralizar o governo".
No ato de lançamento da "Carta", João Pedro Stédile, coordenador nacional do MST, disse que Lula deveria aproveitar o momento de crise política para "fazer do limão azedo uma limonada" e defendeu uma "limpeza nos ministérios que não estão claramente comprometidos com o povo".
Pareceu que daria certo. No mesmo dia, discursando para trabalhadores rurais, Lula fez eco ao MST e desqualificou as denúncias envolvendo seu governo. Chamando-as de "bobagens", o presidente disse que eram motivadas pelo "medo" de sua reeleição.
Durou pouco. Na quinta-feira, em pronunciamento em rede TV, Lula recuou: "Se houver gente que tenha cometido desvios de conduta, usarei toda a força da Lei". Na sexta, confirmou a progressiva "despetização" do governo, oferecendo ministérios ao PMDB.
"O presidente Lula precisa de governabilidade social, mais importante do que as alianças com partidos políticos que vem fazendo", afirma João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do MST.

Ministros demonizados
Na mesma linha vai a esquerda petista. "Lula chegou ao poder em condições muito melhores do que as de Chávez para peitar o conservadorismo. O PT é um partido estruturado e com relação forte com movimentos sociais, mas as alianças impedem o avanço", afirma o deputado Ivan Valente (PT-SP).
Para o MST, o governo Lula é um governo em disputa. Demonizados pelo movimento estão cinco ministros: Antônio Palocci (Fazenda), Roberto Rodrigues (Agricultura), Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento), Henrique Meirelles (Banco Central) e Luiz Gushiken (Secretaria de Comunicação). Do outro lado, na análise dos sem-terra, está José Dirceu, identificado como pólo de resistência à política econômica.
"O núcleo conservador do governo continua firme, enquanto o Dirceu, que era o símbolo da ala progressista, teve de sair", declara Rodrigues.
O descontentamento dos movimentos sociais contamina até correntes moderadas do partido, como a "PT de Luta e de Massa", que apóia a recondução de Genoíno à presidência do PT, em setembro, quando será escolhida a nova direção partidária.
Presidente do Diretório Zonal da Capela do Socorro, com 7.500 filiados, e membro do "PT de Luta e de Massa", Glauco Piai acha que está em curso uma operação de "sanitização" do governo.
Ele lembra que, em 1992, o publicitário Duda Mendonça, então a serviço de Paulo Maluf, criou um slogan contra a candidatura de Eduardo Suplicy à prefeitura de São Paulo que dizia: "Não temos nada contra o Suplicy, só não queremos o PT mandando aqui". "É a mesma coisa agora: a elite até engole o Lula, mas não quer o PT mandando. Por isso exige do presidente a despetização."


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