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ENTREVISTA
ANTÔNIO DELFIM NETTO
PT está em declínio e foi o principal opositor de Lula
Economista diz que presidente deu aval à implementação da proposta de déficit zero, elogia a inteligência do petista e defende PMDB como sócio do governo
Bruno Miranda/Folha Imagem
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Delfim Netto (PMDB-SP), candidato a deputado, em entrevista |
MALU DELGADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Aos 78 anos, Antônio Delfim Netto (PMDB-SP) oscilou de protagonista de governos militares a colaborador do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a quem
dará o voto, novamente, nesta eleição. Implacável, autor de um manancial de frases tão célebres quanto ácidas e alvo de polêmicas sobre o período em que comandou a economia no Brasil, o ex-ministro elogia a
"inteligência admirável e intuitiva" de Lula com a
mesma naturalidade com que classifica o PT de "partido em murcha e principal opositor" do petista.
Em entrevista à Folha, Delfim afirma que Lula tomou a
decisão política de executar o
programa do "déficit nominal
zero", abominado pelos petistas. O presidente teria sido
atropelado pela crise do mensalão. "Dias antes do escândalo
do mensalão, o presidente disse: Eu topo", revela.
Delfim tem certeza de que
Lula, se reeleito, colocará em
prática, "por necessidade", esse
rigoroso ajuste fiscal que passa
por uma nova reforma da Previdência, autonomia do Banco
Central, redução do tamanho
do Estado e enfrentamento do
mito das vinculações orçamentárias para a educação e a saúde. Conversa para deixar petistas de cabelo em pé.
Para Delfim, Lula não foi
eleito em 98 porque o PT tinha
um programa do século 19. "O
Lula demorou para entender
que foi ele que elegeu o PT, e
não o PT que o elegeu", explica.
Depois de 25 anos ao lado de
Paulo Maluf, do PDS ao PP,
Delfim filiou-se ao PMDB.
Acredita que Lula, se reeleito,
atrairá novos segmentos da legenda: "Não é simplesmente
uma adesão por carguinho. O
PMDB vai ajudar a formular
um programa para o país".
Admirador do ex-ministro
da Fazenda Antonio Palocci,
Delfim torce para que ele e o
petista estejam juntos no Congresso em 2007, para ajudar
Lula a fazer novas reformas,
mas considera que a quebra de
sigilo do caseiro Francenildo
Costa "um erro imperdoável".
O mentor do milagre econômico acredita que o país voltará a ter crescimento entre 5% a
6%, se fizer o ajuste fiscal. A seguir, os principais trechos:
Folha - O que explicaria o favoritismo de Lula nas pesquisas?
Delfim - O governo Fernando
Henrique entregou para Lula o
país quebrado. É verdade que
ele procurou a estabilização,
fez um plano brilhante, mas entregou o país em situação extremamente difícil. A eleição
do Lula é produto do fato de
que a sociedade rejeitou a política do Fernando Henrique. O
Lula de 98 jamais teria sido
eleito. O seu programa era absolutamente inadequado. O
que elegeu o Lula foi a Carta ao
Povo Brasileiro. O programa do
PT em 98 era um programa mal
construído do século 19. Dizia
simplesmente o seguinte: com
suficiente vontade política,
dois mais dois podem ser cinco.
Folha - O sr. é considerado hoje um
dos conselheiros do presidente.
Delfim - De vez em quando ele
me honra com um convite e eu
vou lá tomar um café. Tenho
grande admiração por ele. Lula
é muito inteligente, intuitivo. É
o único político no Brasil que,
quando fala de pobre, está sentindo honestamente. É católico
fervoroso. A idéia de que quer
cuidar dos pobres, em todos os
políticos é cínica. No Lula, é
verdadeira.
Folha - A política de metas de inflação deve persistir?
Delfim - Seria uma loucura
abandonar a política de metas.
A meta tem que ser pensada,
não pode ser muito ambiciosa,
senão o custo social do ajuste é
muito alto. Tem que haver
aperfeiçoamentos. O Banco
Central não pode ser vítima de
um mito em que o Brasil não
pode crescer mais de 3%. Você
pode ampliar o horizonte de tal
forma a manipular câmbio e juros com um pouco mais de cuidado. O regime [de metas] exige a autonomia do BC.
Folha - Mas o PT é contra o debate
sobre autonomia do BC agora.
Delfim - E o que é o PT? O PT é
um partido em murcha. O Lula
demorou para entender que foi
ele que elegeu o PT, e não o PT
que o elegeu. O PT só o atrapalhou. Se for reeleito, será pela
maioria dos brasileiros. Vai fazer outra vez um governo de
coalizão. Não podemos imaginar que o Lula fez o programa
do PT. Fez o programa da Carta
aos Brasileiros. Os maiores
opositores ao Lula estão no PT,
que se consideram traídos.
Achavam que a Carta era para
enganar trouxa. O Lula teve
sorte, uma iluminação, quando
poupou as Finanças do PT. O
Palocci não tem nada de PT.
Folha - Como o sr. analisa a queda
do ex-ministro Antonio Palocci?
Delfim - Uma pena. O Palocci
certamente cometeu erros. Esse lance final foi uma tolice
enorme. É um homem absolutamente decente, digno, inteligente, persistente. Espero que
ele esteja lá no Congresso, porque certamente será um fator
muito importante, e dentro do
próprio partido. A República de
Ribeirão é joguinho político local, interiorano. A quebra do sigilo é que é a coisa grave. E vou
dizer mais: imperdoável.
Folha - E Palocci era seu principal
aliado para amadurecer no governo
a idéia do déficit nominal zero.
Delfim - As pessoas não sabem,
mas o presidente Lula participou de todas as reuniões. Ele
estava absolutamente convencido da necessidade de um programa que propunha, ao longo
de cinco, seis, oito anos, uma
redução da carga tributária e do
endividamento público para
poder ter grau de liberdade para crescer. Eu posso ter sido talvez o comecinho disso. Mas
aquilo nasceu em reuniões das
quais participaram o Palocci,
outros membros do governo e o
presidente. Dias antes do escândalo do mensalão, o presidente disse: "Eu topo". Depois
houve uma desintegração. Não
foi uma invenção do sr. Delfim
Netto. Foi pedido do governo
para pôr em discussão pública e
criar suporte para uma idéia
que o governo ia executar.
Folha - O debate será retomado
num eventual segundo mandato?
Delfim - Na minha opinião vai
ser retomado. Se não pelas virtudes do Lula, será por necessidade. Há duas reformas que
precisam ser feitas e só o Lula
pode fazer. A primeira é a reforma da Previdência. O regime,
como está, é insustentável. Produz 1% do PIB de déficit crescente por ano. Estamos dentro
de uma revolução demográfica.
O Brasil está ficando velho. O
segundo problema é a informalidade, que exige a reforma trabalhista. Não se trata de tirar
direitos. Trata-se de dar estímulos ao setor privado e ao trabalhador para que se formalize.
Só o Lula pode produzir essas
duas reformas, porque o trabalhador acredita nele.
Folha - Qual seria o papel do PMDB
num segundo governo Lula?
Delfim - Boa parte do PMDB
está apoiando o Lula. Acho que,
definida a eleição, essa parte vai
crescer. Não é simplesmente
uma adesão ao Lula por fazer
esse carguinho aqui, outro ali.
Vai ajudar a formular um programa para o país. Há muita
coisa a ser aperfeiçoada.
Folha - O sr. vota de novo em Lula?
Delfim - Sim, é a melhor opção,
para terminar o que começou.
Folha - Está preparando o caminho
para o Brasil crescer a taxas de 5%?
Delfim - Acho que sim. Nunca
tivemos uma situação tão boa
como hoje. Só que deixamos de
considerar o efeito devastador
da carga tributária. Nunca houve um esforço fiscal no governo
Fernando Henrique, só no segundo mandato. Deixou quatro
problemas: crescimento medíocre, carga tributária insuportável, endividamento mais
que insuportável e vulnerabilidade externa terrível.
Folha - Qual a saída para crescer?
Delfim - Diria que nos próximos quatro anos, se puserem
em prática essa política [de
ajuste fiscal], certamente voltará a um crescimento entre 5% a
6%, sustentável, com equilíbrio
interno e externo.
Folha - E os gastos públicos? Houve
elevação por causa da eleição?
Delfim - Acho que há um equívoco. Não se violou Orçamento
uma única vez. Ele vai cumprir
os 4,25% [de superávit]. As
duas reformas importantes
têm que ser acompanhadas por
controle do gasto público de
custeio, pelo IPCA. Não vai reduzir os gastos com saúde, com
educação. Vai exigir o choque
de gestão dentro do setor. As
vinculações são a avó da vagabundagem. A mãe, se você faz
alguma coisinha errada, te dá
uns tapas. A avó, te dá uns beijinhos. O recurso cai do céu. O
caso brasileiro é muito mais
grave que a velha Belíndia do
Bacha [Edmar Bacha]. É a Ingana: impostos da Inglaterra e
serviços iguais ao de Gana.
Folha - Dá para discutir o mito das
vinculações num próximo governo?
Delfim - Nada radical funciona.
É um programa para no mínimo quatro ou cinco anos. Ninguém está imaginando um Estado mínimo.
Folha - O sr. dizia que era preciso
crescer e depois repartir o bolo. Lula
fala para a elite e a classe média que
repartirá o "bifinho" com os pobres.
Delfim - O que eu sempre disse
é que você não pode distribuir o
que não tem. O Fernando Henrique distribuiu. A proposição
do Lula está correta. Se existe o
bifinho, nós podemos distribuir. Produzir o bifinho é um
problema econômico. A teoria
econômica não decide como
distribuir o bifinho. A organização política decide.
Folha - E o mensalão?
Delfim - Eu acho a coisa mais
trágica que poderia ter acontecido para a sociedade. Foi um
mecanismo devastador. Felizmente veio a público e foi apurado por uma CPI. Lamento é
que outros mecanismos devastadores para a moralidade do
Congresso não tenham sido
apurados com a mesma força. O
Lula teve conhecimento disso
da mesma forma que nós: de
uma maneira trágica.
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