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Tucano repete que não sabia de caixa 2
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
CHICO DE GOIS
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
O senador Eduardo Azeredo
(MG) renunciou ontem à presidência nacional do PSDB, que será assumida pelo prefeito de São
Paulo, José Serra, até o próximo
dia 18. O anúncio oficial foi feito
em discurso no plenário do Senado durante a noite.
"Me sinto usado como instrumento de uma grande farsa,
quando tentam desviar a atenção
da população dos escândalos envolvendo o governo e o PT", disse
o senador na sua despedida.
O afastamento de Azeredo é fruto do desgaste sofrido em decorrência das acusações de que participou, em 1998, quando tentava a
reeleição ao governo de Minas, de
esquema semelhante ao que envolve o PT e causou a atual crise
política.
Em 1998, Azeredo obteve auxílio financeiro de Marcos Valério
(veja quadro). Seu então tesoureiro, Cláudio Mourão, reconheceu
recentemente o uso de caixa dois
na campanha. Azeredo afirma
que não tinha conhecimento do
fato. No final de semana, a revista
"IstoÉ" revelou que o tucano teve
uma dívida com seu ex-tesoureiro
paga por meio de um cheque de
Valério, no valor de R$ 700 mil.
Para o tucano, sua renúncia desarma seus detratores do "único
argumento" de que dispunham.
"Pois o fato de não saber de tudo,
que de mim é agora implacavelmente cobrado pelos petistas, é a
única e cínica desculpa dos defensores do governo."
José Serra substituirá Azeredo
porque é o presidente de fato, mas
estava licenciado desde que assumiu a prefeitura, em janeiro deste
ano. Serra não estava disposto a
presidir a legenda porque teme
receber estilhaços da guerra entre
PSDB e PFL, de um lado, e Palácio
do Planalto e PT, do outro.
"Ele vai ter de assumir", dizia o
líder do PSDB no Senado, Arthur
Virgílio (AM), à tarde. "Não se
trata de querer, mas de dever."
Serra aceitou assumir a presidência sob condições: atuará burocraticamente, desde que Tasso
Jereissati (CE) e o atual secretário-geral, deputado Bismarck Maia
(CE), toquem o dia a dia de fato.
Tasso será eleito presidente em
reunião do Diretório Nacional do
partido no dia 18 de novembro,
No discurso de desligamento,
Azeredo disse que Serra "havia
manifestado o desejo de, pessoalmente, transmitir ao seu sucessor
a presidência do partido".
Desvio
Azeredo é conhecido pelo temperamento ameno, mas sofreu intensa pressão ao longo do dia para
não amenizar seu discurso. A intenção dos tucanos, com ajuda direta do PFL, é radicalizar contra o
governo e o PT. "Não achem que
eu sou uma pessoa mole", observou, no discurso. "Sei reagir, e esta é a hora de reagir."
Para o senador tucano, são dois
os propósitos das acusações que
vem recebendo: jogar a opinião
pública contra ele e seu partido e
desviar a atenção da sociedade em
relação às denúncias contra o PT e
o governo.
Reafirmando que não tinha conhecimento da existência de caixa
dois em sua campanha, "como
vem sendo maldosamente difundida pelos adversários", Azeredo
criticou ontem os petistas. "Alguém tem qualquer dúvida de
que a quase totalidade das campanhas eleitorais de nossos adversários custaram muito mais do que
declararam à Justiça Eleitoral?"
Durante seu discurso, o senador
foi interrompido por membros
da oposição ao governo, que lhe
declararam apoio. "Quem apedrejou Eduardo Azeredo deveria
estar pedindo neste momento o
impeachment de Lula", sugeriu
Tasso Jereissati (CE). O líder do
PFL, José Agripino (RN), procurou relacionar o caixa dois do PT
com corrupção, fazendo contraponto a Azeredo. "Cadê seu Land
Rover?", questionou, em alusão
ao ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira, que ganhou um veículo de presente de uma empresa
que trabalha para o governo.
Pressão
A renúncia de Azeredo foi decidida numa reunião de mais de
três horas com Jereissati, Virgílio
e Sérgio Guerra (PE). Durante a
reunião, o ministro Jaques Wagner (Relações Institucionais) ligou para Azeredo, tentando amenizar o clima de guerra entre tucanos e petistas. Virgílio, porém, pediu o telefone e radicalizou.
Na versão dele, Jaques começou
a conversa falando que os dois
partidos eram como "irmãos". E
ele rechaçou: "Só se for como árabes e judeus, que estão em guerra
há dois mil anos". A tentativa de
Wagner foi a de tirar o Planalto da
linha de fogo, ao dizer que não tinha nada a ver com investigações
sobre o envolvimento de Azeredo
no esquema Marcos Valério.
O argumento não foi aceito por
Virgílio, que discutiu com os demais tucanos centrar fogo nas
campanhas do PT até 2002, para
comprovar o uso de caixa dois.
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