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Ex-soldado diz que presenciou tortura contra Genoino
O hoje caminhoneiro Jairo Pereira é o primeiro integrante das Forças Armadas a relatar maus-tratos contra o ex-guerilheiro
Pereira foi o motorista do comboio que levou petista ao Araguaia, local onde foi torturado para identificar esconderijo de guerrilheiros
DO ENVIADO A IPAMERI (GO)
Soldado do Exército que em
1972 participou da repressão à
guerrilha do Araguaia, o caminhoneiro Jairo Pereira, 58,
contou à Folha ter presenciado
torturas praticadas contra o
guerrilheiro Geraldo, o hoje deputado federal José Genoino
(PT-SP), por militares em
Xambioá (TO).
Primeiro guerrilheiro preso
no Araguaia, em abril de 1972,
Genoino relatou várias vezes
ter sido torturado nos meses
seguintes à captura. Sua versão
já foi contestada por alguns
chefes militares da ação antiguerrilha, que o apontam como
colaborador. Pereira é o primeiro profissional das Forças
Armadas a tornar público ter
visto os maus-tratos contra o
então prisioneiro.
Aos 22 anos, Pereira trabalhava no quartel do Exército
em Ipameri (GO) quando, com
30 colegas, em maio de 1972,
foi transferido para o Araguaia.
Motorista, ficou responsável
por conduzir por cinco dias, até
Xambioá, o caminhão que liderava um comboio. Atrás do caminhão, ia uma picape. Dentro
dela, algemado e acorrentado,
viajava Genoino.
Depois de capturado na mata, o prisioneiro foi enviado a
Brasília, para interrogatórios.
Acabou identificado como opositor ao regime militar, no período em que liderou o movimento estudantil na Universidade Federal do Ceará. Até então, Genoino negava envolvimento com a guerrilha.
Os militares decidiram, em
maio, levá-lo de volta ao Araguaia, a fim de forçá-lo a indicar esconderijos dos companheiros de PC do B.
"Genoino era muito tranqüilo na viagem, sempre vestido
de calção e camiseta. Ele dormia algemado na carroceria do
caminhão, com um guarda vigiando", lembrou Pereira.
A situação do prisioneiro
mudou quando da chegada do
comboio a Xambioá, uma das
bases militares de combate à
guerrilha do Araguaia.
"Vi ele apanhando muitas vezes, levando choques elétricos.
Pegavam ele algemado, com capuz na cabeça, levavam até o
fim da pista [de pouso] e batiam nele", disse o ex-militar,
que entrou no Exército em
1969 e saiu cinco anos depois.
Apanhava para falar
Pereira não identifica os
agressores. Só diz que eram os
"graduados" -oficiais da base e
do PIC (Pelotão de Investigações Criminais) de Brasília, enviados para o Araguaia. Afirma
que nunca soube os nomes,
pois os encarregados da tortura
não vestiam farda.
"Genoino conversava normalmente com a gente [os soldados], não mostrava resistência. Apanhava para falar. Metiam o pau no cara", contou o
caminhoneiro.
Na base, o preso passou a
dormir, acorrentado e algemado, dentro de um buraco cavado na terra. De vez em quando,
relembra o ex-soldado, o prisioneiro era levado para sobrevôos de helicóptero e avião. Na
volta, ocorriam novas sessões
de torturas, com choques elétricos aplicados por uma maquineta que os militares chamavam de "magnésio".
"Genoino pulava, gritava,
chorava muito. A gente sentia
que ele estava machucado. Eu
saía de perto. Depois, ele ficava
triste, calado."
Pereira disse ter vontade de
reencontrar Genoino. Acha que
o deputado o reconheceria. "Tivemos muito contato. Ele era
muito inteligente, falava da faculdade. Ele pedia revistas para
passar o tempo, era muito pacífico, parecia arrependido de tudo, não era agressivo. Eu tinha
muita dó dele."
O ex-militar lembra, ainda,
que o prisioneiro costumava
ser levado para a floresta. "Ele
ia no mato, voltava, estava todo
chupado de mosquito. Genoino
passou maus momentos."
(SERGIO TORRES)
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