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Rio de Janeiro
PAES
Ex-tucano se une aos petistas e rejeita influência de Cesar Maia
RAPHAEL GOMIDE
DA SUCURSAL DO RIO
O ex-líder estudantil Vladimir Palmeira se recusa a subir
em um banquinho para discursar, como fez 40 anos atrás na
Passeata dos 100 mil. Desta vez,
na noite de quarta-feira passada, são pouco mais de uma centena os companheiros de partidos da base de apoio do presidente Lula que enchem o restaurante Lamas, na zona sul carioca. Os discursos de Palmeira
e dos que antecedem o orador
principal arrancam aplausos de
esquerdistas antigos e de jovens lideranças estudantis com
bandeiras vermelhas.
Timidamente, o ex-tucano
Eduardo Paes (PMDB), 38, protagonista, até então ouvindo
em silêncio elogios a ele e críticas ao PSDB, aceita subir no
banquinho. Como centenas de
vezes na campanha, promete
"retirar o Rio do isolamento
político criado pelo prefeito"
Cesar Maia (DEM). Diz que
suas prioridades "são voltadas
para as classes mais baixas",
que vai "devolver a dignidade às
pessoas na hora da doença" e se
"comprometer com educação
pública de qualidade".
Não está inspirado. A voz parece cansada, talvez pela gripe
da reta final da campanha, arrastando o ritmo da fala. No
ambiente pouco familiar, os
aplausos são escassos.
A presidente da UNE, Lúcia
Stumpf, não espera sair para
retirar o adesivo "O que é isso,
companheiro?" -alusão ao livro do rival de Paes-, em que
Fernando Gabeira (PV) aparece com Maia, o governador de
São Paulo, José Serra (PSDB), e
o ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso.
"Lúcia, empolgada com a
campanha?", pergunta o repórter. "É... Tem que estar, né?"
Paes se formou político na
Juventude Cesar Maia e na
subsecretaria de Jacarepaguá e
da Barra da Tijuca (zona oeste);
foi secretário de Meio Ambiente até 2002 do ex-guru, com
quem brigou no ano seguinte,
indo para o PSDB. No novo partido, foi liderado por Serra e
FHC, os outros dois rostos do
adesivo.
Paes não é grande orador e
reconhece não ser um político
tão "carismático", que apela para a emoção do eleitor, como
analisa o senador evangélico
Marcelo Crivella (PRB), que o
apoiou no segundo turno.
Como Santo Agostinho -que
dá nome ao tradicional colégio
no Leblon onde estudou-,
Paes prefere a razão à emoção.
"Busco ser mais racional. Mas
toda pessoa que teve muito voto deve ter algum carisma aí,
mas eu sempre vou mais pela
minha razão."
Figurante de novela
O candidato de rosto jovial e
simpático, nascido e criado no
Jardim Botânico e na praia de
São Conrado (zona sul), iniciou
a carreira política cedo, depois
de fazer figuração em novelas
da Globo e se formar bacharel
em direito -sem nunca exercer
a profissão. Aos 23 anos, virou
subprefeito. Em 96, aos 27, foi o
vereador mais votado do Rio,
com 82.418 votos. Elegeu-se
deputado federal em 98 e se
reelegeu em 2002. Mas não se
considera predestinado. "Sou
muito dedicado, gosto de transformar a vida das pessoas. Não
acho predestinação, transpirei
tanto para conquistar as coisas
que, se fosse predestinação,
não precisava sofrer tanto."
Ele renega, hoje, seu "pai político", embora conserve de Cesar trejeitos e a forma pausada
de falar à TV. Mas se incomoda
em falar de semelhanças.
"Deve ter (levemente irritado)... Deve ter contribuído com
alguma coisa. Procuro tirar das
pessoas coisas positivas. Ele deve ter coisas positivas. É um cara -pelo menos na fase que
convivi com ele- muito trabalhador, dedicado às coisas da cidade, disciplinado. Agora, te
confesso que eu me esforço
muito para... Talvez eu tenha
aprendido com os erros dele:
esse isolamento, incapacidade
de ouvir os outros, dialogar
francamente, uma visão dura
do mundo."
Como Cesar, é pragmático.
Trocou de partido cinco vezes
em 16 anos. "Tenho duas mudanças: uma do grupo do Cesar
Maia para o PSDB e uma para o
PMDB. As anteriores foram na
linha do Cesar Maia. Essa conta
é por eu o estar acompanhando
na instabilidade partidária e
emocional dele. Quem se preocupa com isso é a elite."
Em 2006, após ter 5,3% dos
votos para governador pelo
PSDB, contrariou o partido e se
aliou a Sérgio Cabral. Trocou a
secretaria geral nacional do
PSDB em 2007 pela Secretaria
de Esportes e Turismo do Estado e a perspectiva de ser candidato com chances à prefeitura
pelo PMDB.
Dissera que "sanguessugas,
mensaleiros e garotinhos"
apoiavam Cabral, "síntese da
entrega da máquina pública para amealhar espaços de poder".
Hoje, o considera "uma personalidade das mais adoráveis"
que conheceu e o tem como o
principal parceiro nesta campanha.
Lula e falta de rancor
Com Lula, as pazes e o apoio
após ter chamado o presidente
de "psicopata" já são grande
avanço, essencial para tornar
factível o bordão de que uniria
o Rio. "Sou a pessoa mais compreensiva do mundo com a circunstância alheia. Não tenho
um rancor, uma mágoa no meu
coração. Minha mulher às vezes quer me bater por isso."
Apesar de nunca ter sido desportista, teve sucesso na pasta
dos Esportes, com dinheiro federal no ano do Pan. Aumentou
de R$ 6 milhões para R$ 15 milhões a arrecadação. Má gestão
anterior? "Enfim... Prefiro dizer que é boa gestão nossa." O
antecessor, Chiquinho da Mangueira, suspeito de associação
com o tráfico, fez carreatas de
braços dados com ele.
Na última semana, recebeu o
reforço do maior opositor à sua
entrada no PMDB e à candidatura a prefeito, o presidente da
Assembléia Legislativa, Jorge
Picciani. O deputado assumiu a
coordenação-geral da campanha e pôs a tropa de choque nas
zonas oeste e norte, com participação de políticos suspeitos,
por exemplo, de envolvimento
com milícias e máfia dos combustíveis.
Paes se esquiva de dizer se
tem orgulho das novas companhias, mas não se diz constrangido. "São atores políticos da cidade, que me dão apoio nesta
eleição. Não cedo meus princípios -isso não cedi nem vou ceder nunca. Bobo é quem acha
que cedi. Se achou está perdendo tempo."
Com campanha de muitos
recursos -teto de R$ 12 milhões declarado-, segurou a
"onda Gabeira", após desempenho surpreendente do rival no
primeiro turno. Aproveitou erros do verde para mostrá-lo como candidato da elite contra
ele, o representante dos mais
pobres.
Cara de bom menino, criado
em família de classe média alta,
virou o candidato do subúrbio,
que diz conhecer "como ninguém". Mesmo lamentando ter
sido abandonado pelos eleitores da zona sul -culpa dos jornais, diz-, é impulsionado pelo
eleitorado mais pobre que o pai
de Bernardo, 4, e Isabela, 2, e
marido de "Cris" pode ser eleito hoje o prefeito mais jovem
desde a redemocratização.
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