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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/VISÕES DA CRISE
Para Roberto Busato, presidente sabia de esquema de corrupção e demonstrou "desqualificação absurda para enfrentar a crise"
Lula tentou abafar investigações, diz presidente da OAB
Alan Marques - 07.nov.05/Folha Imagem
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Roberto Busato, presidente da OAB, diz que a entidade não descarta possibilidade de impeachment |
LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL
Para o presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil),
Roberto Antonio Busato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai
passar para a história como o governante que mais tentou abafar
investigações de corrupção.
"Para mim, é prova inconteste
de que Lula sabia exatamente de
todo esquema e estava de acordo
com a sua existência", disse Busato, para quem Lula demonstrou
uma "desqualificação absurda
para enfrentar a crise".
Aos 51 anos, o presidente da
OAB é hoje um dos maiores críticos do governo Lula. Fala com naturalidade da possibilidade de impeachment. Diz apenas que irá esperar a conclusão da CPI dos Correios, que investiga a existência do
esquema do "mensalão".
"As investigações avolumaram-se de forma tão extraordinária pelo total descalabro ocorrido dentro do governo em termos de corrupção. É uma corrupção enraizada, sistematizada em toda a administração pública", disse.
Leia a seguir trechos da entrevista à Folha, por telefone:
Folha - Em 2005 o Brasil assistiu a
uma propagação de CPIs. O que
aconteceu: aumentou a corrupção
ou o país investigou mais?
Roberto Antonio Busato - Não se
investigou mais, ao contrário, o
presidente tenta confundir a opinião pública dizendo que o governo dele foi o que mais investigou
na história do país. Na verdade,
foi o que mais tentou impedir a
investigação. Desde o primeiro
escândalo, o do Waldomiro Diniz
[ex-assessor do ex-ministro José
Dirceu flagrado negociando propina com um empresário de jogos], sempre houve a tentativa de
esconder a corrupção embaixo do
tapete. Naquele momento, o governo não tomou nenhuma posição, nem demitiu o funcionário.
As investigações avolumaram-se
de forma tão extraordinária pelo
total descalabro ocorrido dentro
do governo em termos de corrupção. É uma corrupção enraizada,
sistematizada em toda a administração pública.
Folha - Alguns petistas dizem que
a CPI dos Correios não conseguiu
provar a existência do "mensalão".
O sr. concorda?
Busato - A CPI está em andamento, mas nós tivemos uma prévia do relatório que, para mim, foi
absolutamente esclarecedor. Tudo o que já foi dito demonstra a
completa culpabilidade da administração do governo Lula e, o que
é pior, atingiu mortalmente o
maior amigo do presidente.
Folha - José Dirceu?
Busato - José Dirceu nunca foi
amigo de Lula. Dirceu era um interesse político-partidário. Mas o
ex-ministro Luiz Gushiken, que
hoje é assessor especial, este sim é
o confidente do presidente, uma
pessoa muito próxima, tão próxima que deixou de ser ministro e se
tornou assessor especial. A revelação de repasses de verba de publicidade da Visanet, ligada ao Banco do Brasil, a agências de Marcos
Valério, e de distribuição a parlamentares sempre em épocas
apropriadas ao governo, atingiu
mortalmente o coração de Gushiken. E, ao atingir Gushiken, atinge
Lula, na medida que o presidente
não tomou nenhuma atitude para
afastá-lo do governo. É prova inconteste de que Lula sabia exatamente de todo esquema e estava
de acordo com a sua existência.
Folha - Em que reside a sua certeza?
Busato - A participação de Lula é
absolutamente baseada pela proximidade de quem sempre foi
confidente e grande amigo de
Gushiken. O ex-ministro realmente comandava toda a área de
comunicação do governo federal,
onde havia um desvio de dinheiro
público para atividades partidárias e delituosas no sentido de
corromper o Congresso Nacional.
Folha - Qual a avaliação do sr. sobre a condução da crise pelo presidente Lula?
Busato - Acho que o presidente
perdeu uma grande chance ao
não acolher uma sugestão da
OAB de convocar o Conselho Nacional da República para ajudá-lo
a governar. Hoje ele estaria cercado por pessoas de confiança, estaria melhor estruturado para enfrentar a crise. Quando nomeou
alguns membros desse conselho,
Lula havia dito que iria convocá-los várias vezes, mas deixou de
cumprir mais uma promessa. O
presidente demonstrou total despreparo, uma desqualificação absurda na condução da crise. E ele
se viu cada vez mais envolvido
por ela, chegando ao ponto de ser
lembrado esse instituto amargo
que é o impeachment.
Folha - Vamos para o último ano
do governo Lula. O sr. acha que é
possível falar em impeachment?
Busato - A OAB continua pensando nessa hipótese, mas nós
não seremos os incendiários nem
covardes dentro da nossa missão
com o povo brasileiro. Vamos
aguardar a conclusão da CPI, como aguardamos no governo Fernando Collor de Mello.
Folha - Em meio às denúncias, o
Legislativo e o Judiciário cumpriram o dever de casa em relação ao
combate à corrupção?
Busato - O Legislativo está devendo muito ainda. A absolvição
do deputado federal Romeu
Queiroz [PTB-MG, que confirmou ter recebido dinheiro ilegal]
realmente mostrou uma absoluta
falta de consciência do Congresso
no sentido de cortar de sua própria carne aquele que não merece
estar lá. A eleição de Severino Cavalcanti [PP] para a presidência
da Câmara, por exemplo, foi uma
situação irresponsável. Severino
não tinha preparo pessoal e ético
na condução dos destinos da Casa. E, apesar de tudo o que aconteceu, Severino ainda transita no
Congresso e é tratado como um
elemento de alta dignidade, o que
desacredita o Congresso. Severino acaba freqüentando também
as reuniões presidenciais na
Granja do Torto, o que demonstra que realmente há um desvio
de conduta ética inimaginável.
Folha - E o Judiciário?
Busato - O Judiciário ficou mais
preservado. Participou no final da
crise, mas não por intromissão do
órgão. Foi o ex-ministro José Dirceu quem recorreu ao Judiciário e
usou todos os artifícios jurídicos
no sentido de protelar a via-crúcis
dele. Mas não acredito que o Poder Judiciário tenha ficado a dever. A Justiça é o caminho natural
daqueles que se julgam com uma
diminuição de seus direitos.
Folha - O limite de atuação dos
Poderes não foi rompido nas reiteradas decisões do Judiciário que alteraram o andamento do processo
de cassação aberto contra Dirceu?
Busato - Entendo que não. O Supremo não entrou no mérito da
questão que estava sendo examinada pelo Congresso, não disse
que Dirceu tinha ou não tinha culpa. O STF apenas examinou as regras regimentais da Casa.
Folha - E como o sr. vê o fato de o
presidente do órgão máximo do Judiciário ser pré-candidato?
Busato - Ele não declara esta
condição.
Folha - Mas também não nega.
Busato - É. Nelson Jobim é uma
figura ímpar na história brasileira,
é uma pessoa eminentemente política. Exerceu cargos nos Três Poderes da mais alta relevância: foi
deputado de envergadura no
Congresso, foi ministro da Justiça
e presidente do STF. Tudo o que
ele faz tem esse jeito político que é
de sua própria natureza. Evidentemente que isso não é do figurino do magistrado. Acredito que o
ministro Jobim deverá se afastar
do Supremo no começo do ano,
tendo em vista essa imagem que
está custando muito caro à sua
biografia. É um sentimento que
tenho. Acho que essas críticas não
estão caindo bem dentro daquilo
que conheço do ministro.
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