São Paulo, domingo, 27 de fevereiro de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

""O juiz tem as contas a pagar como qualquer outro cidadão"

da Sucursal de Brasília

Leia abaixo trechos da entrevista com Gustavo Tadeu Alkmim, presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho:

Folha - O Poder Judiciário tem legitimidade de propor greve por aumento salarial quando alguns membros, no caso da Justiça dos Estados, ganham mais do que R$ 12.720, o valor do provável teto salarial do funcionalismo?
Gustavo Tadeu Alkmim
- Nenhum juiz trabalhista ou federal ganha acima do teto. O meu salário bruto é R$ 6.473, sendo R$ 5.832 de vencimento básico e o restante de adicionais por 11 anos de serviço. Essa é a situação da grande maioria.
Estamos certos que, quando pedimos o cumprimento da Constituição, a fixação do teto, previsto na reforma administrativa, estamos pregando uma medida moralizadora: que nenhum servidor ganhe acima do teto.

Folha - Mas os juízes não estão se mobilizando pela moralização dos gastos com pessoal e sim pelo aumento em cascata na Justiça. O sr. não acha que o teto deveria ser redutor e não referência para aumentos salariais?
Alkmim
- Defendemos que, fixado o teto, todos fiquem sujeitos a esse limite, sem exceção.
Quanto à carreira de juiz, ela é longa. O escalonamento é uma forma de preservar a carreira e garantir ao juiz que tenha os vencimentos vinculados (à instância superior) para que não haja redução. Muitas vezes, o funcionário subordinado ao juiz em uma vara ganha mais do que ele.

Folha - No caso da Justiça do Trabalho, a greve ainda não é mais delicada por causa do escândalo do Fórum Trabalhista de São Paulo, investigado pela CPI do Judiciário. Como juízes que desviam verba de uma obra pública podem fazer greve por aumento salarial?
Alkmim
- Essa paralisação é importante para discutirmos não só a questão salarial da magistratura, mas todo o papel do Judiciário. Por conta de uma dúzia de suspeitos dentro de um universo de quase 15 mil magistrados, houve a CPI do Judiciário, que colocou no limbo toda a magistratura.
Esse quadro criou um ambiente de muita revolta na magistratura. Talvez por causa disso tenhamos chegado onde chegamos.
Queremos aproveitar a oportunidade da greve para perguntar à sociedade que futuro deseja para a magistratura?
Queremos que a sociedade reflita se é correto que o presidente do Senado, por exemplo, um alto cargo de um dos Poderes da República, continue a tratar com tanto menosprezo a magistratura.

Folha - Há grande risco de desgaste político?
Alkmim
- Estamos conscientes de que a greve é a nossa última alternativa. Sabemos muito bem das consequências e de nossa responsabilidade, mas é preciso acabar com o mito da neutralidade, não o da imparcialidade.
O juiz não é um ser que paira acima da sociedade. Ele está sujeito a todos os conflitos sociais, tem contas a pagar como qualquer outro cidadão, tem dificuldades no dia-a-dia.

Folha - Como os juízes trabalhistas vão julgar depois greves de outras categorias depois de fazer uma paralisação considerada ilegal?
Alkmim
- Com muita tranquilidade. As coisas não se confundem. O nosso movimento tem um objetivo. Isso não pode se confundir com casos que o juiz venha a julgar depois.

Folha - Como os juízes podem fazer uma greve se o STF não reconhece esse direito a nenhum servidor público, particularmente aos juízes?
Alkmim
- Ela acontecerá porque chegamos a uma situação extrema.

Folha - O TST (Tribunal Superior do Trabalho) enviou um projeto de lei ao Congresso que, se aprovado, garantirá abono a todos os juízes trabalhistas, correspondente ao aumento que teriam com a fixação do teto em R$ 12.720.
Alkmim
- A iniciativa representa uma luz no fim do túnel. É um gesto importante, que por si só não é capaz de evitar a paralisação, mas pode abrir um canal de negociação. Dependerá da vontade política do Congresso.









Texto Anterior: "Devemos servir de exemplo para toda classe trabalhadora"
Próximo Texto: Elio Gaspari: A escola pública vira sucata. A privada ganha BNDES
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.