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São Paulo, quinta-feira, 27 de fevereiro de 2003

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JANIO DE FREITAS

Os fornecedores

Entre os tantos destaques possíveis, na investida de bandidos que parou o Rio segunda-feira, o preferido de toda a mídia foi o pequeno objeto jogado no jardim de um prédio na praia de Ipanema. Chamado de granada, como se os repórteres nunca tivessem visto um filme em que soldados arremessam granadas, era uma bomba de gás, das usadas, inclusive, contra repórteres e fotógrafos. Mas, agora que sua identidade justificaria o destaque, dá-se o oposto. A bomba era da Marinha.
Não se tem notícia de condenações, ou outras punições, de responsáveis por depósitos de armamentos das Forças Armadas. Há anos, no entanto, é comum a identificação de armas de propriedade das Forças Armadas, muitas delas ainda com o emblema da República, entre as apreendidas com bandidos.
Aí temos, pois, pelo menos três mistérios: como são guardados os armamentos nas bases e quartéis das Forças Armadas? como saem daí indevidamente, com tantas sentinelas e corpos-de-guarda que visíveis, mesmo de fora, em toda dependência militar? e não há represália, ou há e o silêncio resulta em proteção privilegiada para os ladrões e maus guardiães do patrimônio público que se volta contra a sociedade?
A possível pertinência das indagações não é dada pela bombinha que se tornou estrela por estar na rica avenida Vieira Souto, e não, como é frequente, em rua de subúrbio ou entrada de favela. São outras as armas dos mistérios. São cerca de 10 mil identificadas como de propriedade oficial das Forças Armadas e das polícias, no exame a que foram submetidas 35 mil armas apreendidas no Rio com marginais, segundo relatório há pouco divulgado pelo "Globo".
O abastecimento de armas para a criminalidade urbana é o aspecto mais desprezado pelas polícias em geral e, sobretudo, pela Polícia Federal, incumbida da repressão ao contrabando. As causas da criminalidade são outras, mas o seu poder de fogo, que tantas vezes afugenta a ação das PMs, é proporcionado pela estranha ineficiência da repressão ao abastecimento. Mas não só isso: já se vê que é proporcionado, também, pelas armas que a sociedade paga para sua proteção.
A bandidagem não está só nas favelas.


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